terça-feira, 14 de janeiro de 2025

UE prossegue a meta do alargamento, mantendo os critérios

 

A União Europeia (UE), se pretende ser uma potência forte e credível no Mundo, tem de se reforçar como unidade política. E esse reforço requer dimensão geográfica, pelo alargamento do território a países europeus que ainda não integram o bloco, e postula, necessariamente, estruturas políticas, sociais, económicas e financeiras que tornem a UE reconhecida e respeitada como potência no concerto das nações.

Desde logo, exige-se investimento na política agrícola comum (PAC), na reindustrialização com novo elã e com a multiplicidade de modalidades, na política de pescas, na política financeira (incluindo a harmonização fiscal), na política salarial, na política de Defesa, no reforço do mercado livre e na sanidade da administração pública (AP). Porém, o que enche a agenda europeia, pela necessidade, pelas contradições e pelos riscos, é o alargamento, preconizado pelo presidente do Conselho Europeu, pela Comissão e pelo Parlamento Europeu (PE).  

A este respeito, a 14 de janeiro, a eslovena Marta Kos, Comissária Europeia para o Alargamento, veio a terreiro garantir: “O estado de direito e os valores fundamentais continuarão a ser a pedra angular da política de alargamento da UE.”

Isto quer dizer que a expansão do bloco, seja ela qual for, será baseada no mérito, e não na geopolítica. “Não haverá qualquer desconto geopolítico. O processo de alargamento continua a basear-se no mérito. Tal como vos disse, no dia 7 de novembro, vou falar sobre os valores europeus. O Estado de Direito e os valores fundamentais continuarão a ser a pedra angular da política de alargamento da UE e os alicerces de uma União reformada e alargada no futuro”, assegurou Marta Kos.

Com o início de um novo ano, os estados-membros da UE dizem que estarão atentos aos progressos realizados nas negociações de adesão, particularmente, em países como a Ucrânia, a Geórgia e a Moldávia, aos quais foi concedido o estatuto de candidato à UE – depois de a Rússia ter invadido a Ucrânia, a 24 de fevereiro de 2022 – por decisões sucessivas de 2022 e 2023.

O estatuto de candidato implica a promoção do estado de direito, com o respeito pelos direitos fundamentais, o esforço pelo desenvolvimento económico e pela competitividade e o reforço das instituições democráticas e da administração pública.

As negociações formais de adesão com a Ucrânia e com a Moldávia tiveram início em junho de 2024 – passo histórico que assinalou um voto de confiança no futuro da Ucrânia na Europa –, mas ambos os países têm um longo caminho pela frente, com a Moldávia sob crescente influência russa e a Ucrânia a enfrentar a hostilidade de estados-membros, como a Eslováquia e a Hungria. Entretanto, a adesão da Geórgia deverá permanecer em suspenso, com a UE a fazer críticas ao partido no poder, o Sonho Georgiano, que enfrenta acusações de ser antidemocrático e pró-russo (que até já decidiu protelar as negociações para 2028, na legislatura seguinte).

No entanto, a UE deve olhar um pouco mais para si própria. Tem razão (e deve fazê-lo) em exigir, como condição, à Ucrânia a espera pelo fim da guerra, embora nada obste à cooperação económica. Contudo, exigir a um país a “pureza democrática” é inconsequente, quando o PE está dominado por forças dificilmente compatibilizadas com os valores humanos do acolhimento de migrantes, o reconhecimento prático da dignidade e da igualdade das diversas etnias, a necessidade de uma cultura ecoeconómica e ambiental. Por outro lado, a ascensão generalizada da extrema-direita na Europa, com políticas governamentais antidemocráticas (em alguns casos, só resta a democracia formal, sem respaldo político de liberdade e sem preocupações sociais relevantes) e com diversas crises políticas, não é, propriamente, boa carta de recomendação.          

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O alargamento da UE trará fatura mais levada para alguns países. Com efeito, um estudo do Bruegel (grupo de reflexão para análise económica e para recomendações políticas baseadas em fundamentos académicos), publicado a 18 de dezembro, quantificou os cortes orçamentais que alguns países da UE podem sofrer, se o bloco admitir os nove estados candidatos, com um custo líquido global de cerca de 26 mil milhões de euros, por ano, para os atuais membros. Assim, o eventual alargamento da UE a nove novos estados-membros pode provocar alterações significativas no orçamento do bloco.

O estudo analisou o que poderia acontecer aos fundos de coesão, que são o dinheiro que as regiões menos desenvolvidas da UE recebem, para se aproximarem das regiões mais ricas.

Atualmente, a maioria destas regiões menos desenvolvidas situa-se no Sul da Espanha, na Itália, em Portugal, na Grécia e em grande parte da Europa Oriental. Porém, a adesão de novas nações alteraria esta geografia. E a maioria das atuais regiões (menos desenvolvidas) seria reclassificada como “regiões de transição”, recebendo, assim, menos fundos de coesão, já que a maioria das novas “regiões menos desenvolvidas” – produto interno bruto (PIB) regional per capita inferior a 75% da média da UE – se situaria nos novos estados-membros da UE.

Nestes termos, a Itália e a Espanha sofreriam os maiores cortes no financiamento, perdendo cada uma quase nove mil milhões de euros, seguidas de Portugal (menos quatro mil milhões de euros), da Hungria e da Roménia (menos dois mil milhões de euros, cada). Ao mesmo tempo, a Polónia, apesar de algumas transferências de regiões para categorias mais elevadas, não sofreria uma redução do financiamento da coesão, pois a sua dotação já está limitada pelo limite máximo global de 2,3% do PIB para a maioria dos pagamentos da coesão.

Em termos globais, o potencial alargamento a 36 estados aumenta o orçamento total da UE de 1111 mil milhões de euros para 1356 mil milhões. Porém, a análise considera também alterações noutras partes do orçamento, como a PAC, a política de vizinhança e a AP. Assim, espera-se que a UE reveja as suas regras orçamentais, antes de um alargamento e que implemente um período de transição, antes de os novos membros poderem aceder aos fundos.

A outra face da moeda é que, se o número de membros da UE aumentar para 36, o custo líquido do alargamento, para os anteriores 27 membros, será de cerca de 26 mil milhões de euros, por ano. E o Bruegel afirma que uma UE maior impulsionaria a economia dos atuais membros, especialmente, em termos de exportações e de investimento direto estrangeiro. “Os fluxos de investimento direto estrangeiro dos países da Europa Ocidental para os países da Europa Central e Oriental que aderiram à UE, entre 2004 e 2013, revelaram-se lucrativos e esta tendência deverá manter-se com os nove novos membros”, concluiu a organização.

Por outro lado, os novos estados-membros trazem mão-de-obra adicional aos países da UE, que enfrentam escassez de mão-de-obra. E, embora os países beneficiários líquidos recebam um pouco menos do orçamento da UE, após o alargamento, a redução seria menor, comparativamente com a redução no atual Quadro Financeiro Plurianual (2021-2027), por sua vez, em comparação com 2014-2020”, o período que se seguiu à entrada de 13 novos países na UE.

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Em 2024, celebraram-se os 20 anos do “big bang” do alargamento. E a UE está, de novo, a discutir os futuros alargamentos. Obviamente, esta discussão é influenciada pela realidade geopolítica que não deixou indiferentes as sociedades dos estados-membros.

O alargamento da UE, em 2004 foi o quinto, o maior desde a sua criação. Na altura, dez países muito diferentes, em diferentes partes da Europa, juntaram-se à família europeia dos 15, num clima de ceticismo e de preocupação, em relação a este grande passo. Oito países do antigo bloco de Leste, juntamente com Malta e Chipre, aderiram à UE. O 1.º de maio de 2004 foi celebrado, duas vezes, por cidadãos de Malta à Polónia e de Chipre à Lituânia. No entanto, nem todos os cidadãos dos antigos países europeus partilharam os mesmos sentimentos de alegria e de otimismo, receando a concorrência barata do Leste, de que ainda se fala nos tempos que correm.

Houve também muitas preocupações quanto à forma como as instituições da UE tomam decisões, surgindo o argumento de que a adesão dos novos países tornaria a União “pesada e ineficaz”.

A propósito, Marilena Koppa, antiga eurodeputada e professora de Política Comparada no Departamento de Estudos Internacionais, Europeus e Regionais da Universidade Panteion, em Atenas, na Grécia, declarou à Euronews: “A primeira lição é que o aprofundamento, por si só, não é suficiente. A Europa também está a avançar com o alargamento, com o objetivo de cobrir todo o espaço europeu e não deixar buracos negros, como, por exemplo, os Balcãs Ocidentais. Em segundo lugar, o que foi considerado um projeto muito, muito difícil, porque se tratava de uma transição para a democracia, mas também de uma transição para o mercado livre, foi um grande sucesso e a convergência foi tangível e substancial. E a Europa conseguiu, realmente, chegar de Sófia, desde as fronteiras da União Soviética até ao Atlântico.”

Os países dos Balcãs Ocidentais esperam, há anos, pela adesão à UE. Na qualidade de países candidatos, a Albânia, a Bósnia e Herzegovina, o Montenegro, a Macedónia do Norte e a Sérvia estão a reformar as legislações nacionais para as alinharem com as regras, regulamentos e normas da UE. A Moldávia, a Ucrânia e, até recentemente, a Geórgia estão a fazer o mesmo.

No seminário realizado, nos gabinetes do PE, pela ELIAMEP, fundação grega para a política europeia, por ocasião do 20.º aniversário do grande alargamento, foram abordadas as preocupações para o futuro. “A realidade geopolítica mudou bastante. Em primeiro lugar, a perspetiva de adesão da Ucrânia e, em segundo lugar, a perspetiva dos Balcãs Ocidentais, que era a nossa principal prioridade. As questões do alargamento deixaram, subitamente, de ser uma prioridade. Parece que a penetração de países terceiros na região mais alargada está a mudar aquilo que nos preocupa, enquanto Europa, e está, portanto, a criar um novo contexto geopolítico nos Balcãs Ocidentais. E penso que isso é benéfico para o processo, porque, neste momento, pelo menos, numa base económica, estamos a assistir a uma série de atrasos. Assim, a realidade geopolítica acabará, provavelmente, por ajudar os Balcãs Ocidentais numa lógica de integração mais rápida”, defende Spyros Blavoukos, professor do Departamento de Estudos Económicos Internacionais e Europeus da Universidade de Economia e Gestão de Atenas, especializado em Análise das Instituições Internacionais e Europeias e investigador principal da ELIAMEP.

Uma sondagem recente revela que 53% dos inquiridos, nos estados-membros da UE, são a favor do futuro alargamento da UE, enquanto 37% são contra. As duas maiores potências económicas e políticas da UE, a França e a Alemanha, obtiveram maiorias que afirmam não ser favoráveis à aceitação de novos países como membros da União, com 55% e 49%, respetivamente, contra.

Por isso, no dizer de Nikos Tzifakis, titular da Cátedra Jean Monnet em Políticas Externas da União Europeia e dos Balcãs Ocidentais e professor de Relações Internacionais no Departamento de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade do Peloponeso, na Grécia, a UE deve avançar “rapidamente” com o alargamento, porque “é necessário preencher uma lacuna que, enquanto existirem outras potências, como a Rússia, pode ser explorada na região”, o que requer vontade política. As reformas de base necessárias para preparar a UE não requerem a revisão dos Tratados. A UE pode, por decisões unânimes do Conselho Europeu, alterar a dimensão da Comissão Europeia e do PE ou utilizar as cláusulas-ponte para recorrer mais “à votação por maioria qualificada, em vez da unanimidade”.

A atitude da UE, em relação aos Balcãs Ocidentais, tem sido hesitante, causando preocupação e insatisfação. Durante muitos anos, o debate esteve congelado. A questão está, de novo, em cima da mesa, mas tudo depende da vontade política dos estados-membros.

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Como diz a presidente da Comissão, “o alargamento é uma política vital para a UE”. Porém, requer vontade, democracia multifacetada, ponderação de riscos e ousadas reformas internas.

2025.01.14 – Louro de Carvalho

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