Neste
inverno, a China enfrenta um surto de metapneumovírus humano (HMPV), doença
respiratória que está a causar grande agitação no quadro de um aumento global
das infeções.
Ao invés do
coronavírus, que originou a pandemia de covid-19, em 2020, o HMPV é um vírus
conhecido, com riscos e contramedidas estabelecidos, mas constitui um risco
para grupos vulneráveis, como os bebés, os idosos e as pessoas com sistemas
imunitários enfraquecidos, assim como apresenta caraterísticas que podem tornar
a sua deteção mais difícil do que a de outros vírus.
A este
respeito, Peter Openshaw, médico respiratório e especialista em gripe e em vírus
sincicial respiratório (VSR), do Imperial College London, disse à Euronews Health que se trata de “agente
patogénico muito importante, bastante difícil de detetar” e que, “muitas vezes,
não aparece nem nos testes laboratoriais que são feitos no hospital”.
O HMPV é um vírus
respiratório comum, que os cientistas holandeses detetaram, pela primeira vez,
em 2001, embora fosse provável que já circulasse nas pessoas, muito antes
disso.
A maioria
das crianças é infetada pelo HMPV, pelo menos, uma vez, até aos cinco anos de
idade, ocorrendo, normalmente, o pico das infeções no final do inverno ou no
início da primavera. “Faz parte do cocktail de vírus de inverno a que estamos
expostos”, afirmou John Tregoning, imunologista de vacinas do Imperial College
London, num comunicado.
Este vírus
provoca sintomas semelhantes aos da constipação ou da gripe, como tosse,
corrimento nasal, congestão e falta de ar, de que as pessoas recuperam,
normalmente, em poucos dias. Porém, algumas infeções podem ser graves e exigir
hospitalização. Assim, as crianças e os idosos têm maior probabilidade de serem
hospitalizados com HMPV, que pode causar doenças mais graves em pessoas com
deficiências do sistema imunitário ou com doenças pulmonares crónicas.
Segundo um
estudo italiano do inverno de 2018-2019, necessitaram de cuidados intensivos 10%
a 12% dos doentes infetados com HMPV ou com RSV (um vírus semelhante).
Os casos de
HMPV têm aumentado no Norte da China, sobretudo, em crianças com menos de 14
anos. Entretanto, uma combinação de HMPV e gripe parece estar a pressionar os
sistemas de saúde, em regiões densamente povoadas, de acordo com Vasso
Apostolopoulos, professor de imunologia na Universidade RMIT, na Austrália.
Embora as
autoridades chinesas estejam a monitorizar o surto, atualmente, não parece
existir um risco global do vírus. Porém, os casos de HMPV estão a aumentar em
países como a Inglaterra, que registou uma taxa de positividade dos testes
de 4,53%, no final de dezembro, contra 2,29%, em novembro, o que
indica que o vírus se está a propagar.
Os casos de
gripe, de covid-19, de VSR e de norovírus (o vírus dos vómitos de inverno),
também têm vindo a aumentar na Europa, no que os especialistas chamaram de
“quadridemia”. E Peter Openshaw sustenta que “uma combinação destes vírus já
conhecidos [parece] estar a causar um aumento global”. Todavia, segundo Apostolopoulos,
o HMPV que circula na China não parece ter sofrido mutação para uma estirpe
mais perigosa, mas a monitorização da doença e os esforços de controlo da
infeção serão importantes para minimizar os riscos para a saúde pública. “Nesta
fase, a probabilidade é que a China esteja a passar por uma má época de HMPV,
da mesma forma que, em alguns anos, temos uma época de gripe avassaladora”,
afirmou, em comunicado, Sanjaya Senanayake, especialista em doenças infeciosas
da Universidade Nacional Australiana.
Ainda não há
vacinas para o HMPV, mas Andrew Pollard, diretor do Oxford Vaccine Group da
Universidade de Oxford, refere que estão a ser desenvolvidas várias, incluindo
algumas que podem proteger tanto contra o HMPV como contra o RSV.
Tal como
outros vírus, o HMPV propaga-se através da tosse e dos espirros, pelo que a
ventilação da casa e a lavagem regular das mãos ajudam a evitar que as pessoas
fiquem doentes. Além disso, cobrir a boca, quando se tosse, e ficar em casa,
quando se estiver doente, também ajudará a evitar a propagação do vírus e a
reduzir a carga sobre os sistemas de saúde. “Estamos todos muito preocupados”,
disse Openshaw, “o aumento das infeções, no inverno, está realmente a fazer com
que muitos dos nossos sistemas de saúde quase atinjam o ponto de rutura”.
É
isto o que se sabe do HMPV, do
surto na China e do que significa para a Europa.
***
Entretanto, de acordo
com as diversas agências de saúde, os
países europeus têm assistido à cocirculação de vírus de inverno, desde a pandemia
da covid-19, com os sistemas de saúde a enfrentarem potencial “tripla ameaça”
de doenças. “O impacto sanitário, social e económico dos vírus de inverno é
enorme”, disse à Euronews Health Antoine
Flahault, diretor do Instituto de Saúde Global da Universidade de Genebra, vincando:
“As formas graves destas infeções, mesmo pouco frequentes, tendo em conta a
dimensão destas epidemias sazonais, contribuem significativamente para a
saturação dos hospitais, durante os picos epidémicos.”
De acordo
com o European Respiratory Virus Surveillance Summary (ERVISS), o número de
pessoas que consultam os médicos por doenças respiratórias “mantém-se nos
níveis esperados para esta época”, na União Europeia (UE) e no Espaço Económico
Europeu (EEE), com aumentos da atividade viral, em alguns países. Neste
contexto, levanta-se a questão se, neste ano, poderá haver várias epidemias em
simultâneo. E Rick Malley, médico da Divisão de Doenças Infeciosas do Hospital
Pediátrico de Boston, nos Estados Unidos da América (EUA), afirmou que é cedo
para saber como vai ser este ano, mas que a pandemia de covid-19 perturbou os
padrões habituais das doenças respiratórias, como a gripe e o vírus sincicial
respiratório (VSR). E, embora não ache que haverá epidemia tripla, “é muito
possível que haja VSR e, depois, gripe; e que, no meio destas duas, haja uma
linha de base de covid que possa surgir em algum momento”.
A gripe é uma
doença respiratória contagiosa causada por um vírus que provoca sintomas, como
febre ou tosse e que, nalguns casos graves, pode levar à morte. E está aí, em
força!
De acordo
com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a gripe provoca epidemias sazonais,
sobretudo, no inverno, em climas temperados, enquanto, nas zonas tropicais,
pode provocar surtos mais irregulares. De acordo com o ERVISS, no final de
novembro, a gripe circulava, em níveis baixos, nos países da UE e do EEE, mas o
vírus estava também a aumentar, em alguns países.
Outra doença
de inverno que se está a propagar na Europa é o vírus sincicial respiratório (VSR), um vírus comum que dá sintomas
semelhantes aos da constipação, mas que pode ser perigoso em bebés ou adultos
mais velhos. E, em alguns países, parece ter começado uma epidemia de VSR,
segundo as autoridades sanitárias, com aumento do número de testes positivos.
O Centro
Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças (ECDC) advertiu, no último relatório
sobre a ameaça da doença, que “todos os países devem estar preparados para um
aumento contínuo da atividade do VSR, durante as próximas semanas”. As crianças
pequenas são as mais afetadas pelo VSR, embora os indivíduos mais velhos também
estejam em risco, afirma o ECDC.
Por outro
lado, os casos de covid-19 diminuíram,
no outono, após um pico, em julho, na UE. De acordo com o ECDC, os níveis de
covid-19 foram inferiores ou semelhantes aos registados nesta época do ano, em
2023. A covid é menos afetada pelas estações do ano do que outros vírus
respiratórios, porque circula, durante todo o ano, em vagas sucessivas, pelo
que é grande a probabilidade de uma delas coincidir com a epidemia sazonal de
gripe ou de bronquiolite.
Malley
adverte que circulam outros vírus respiratórios, como o parainfluenza B, o HMPV
ou o adenovírus, mas que a covid-19, a gripe e o VSR são alvo de atenção,
porque “podem muitas vezes ser mais graves do que os outros vírus” e porque
dispomos de uma combinação de vacinas, de tratamentos e de anticorpos contra
eles.
O norovírus, que
provoca vómitos e diarreia, é outro vírus que pode ser muito frequente no
inverno e na primavera. Flahault afirma que o modo de transmissão destes vírus,
em ambientes fechados, com muita gente e pouco ventilados, explicará o facto de
circularem mais no inverno. Uma melhor qualidade microbiológica do ar interior
e o uso de máscaras FFP2 em locais onde a qualidade do ar é má ajudam a
prevenir “a circulação de todos os agentes microbianos respiratórios”, como a
covid-19, a gripe, o VSR, a varicela, o sarampo, a tosse convulsa e a
tuberculose, pormenorizou Flahault. E Piotr Kramarz, cientista-chefe do ECDC,
numa declaração enviada por e-mail à Euronews Health, frisou que “vacinação é
uma das formas mais eficazes de proteger os mais vulneráveis da nossa sociedade
contra doenças graves, hospitalização e morte”. “Uma vez que muitos países
ainda estão longe de conseguir uma proteção adequada para os grupos-alvo, é
crucial aumentar as taxas de vacinação contra a gripe sazonal e a covid-19, uma
vez que a época de inverno já começou”, acrescentou.
O ECDC
recomenda que as pessoas fiquem em casa, se tiverem sintomas de doenças
respiratórias, que lavem frequentemente as mãos e que ventilem os espaços
interiores. “A triste verdade é que a covid nos recordou a importância de
medidas simples que podem realmente reduzir o risco de transmissão a pessoas suscetíveis
ou vulneráveis”, disse Malley, insistindo em que “uma boa higiene das mãos é
muito importante”, bem como dar prioridade às atividades ao ar livre, quando se
está doente, e evitar ver pessoas vulneráveis.
A OMS
Europa, por sua vez recomenda o uso de uma máscara em determinadas situações,
por exemplo, se a pessoa estiver em risco de contrair covid-19 grave, para
proteger outras pessoas em espaços mal ventilados ou se suspeitar que tem
covid-19.
***
Os casos de gripe estão a aumentar na Europa,
atingindo mais as crianças com menos de 15 anos e os adultos com mais de 60
anos. Os hospitais na França e na Espanha registam um aumento dos
internamentos, com predominância da gripe B. Aliás, os hospitais de toda a Europa enfrentam
um período difícil, pois os casos de gripe aumentam, acentuadamente,
na sequência
da época festiva.
A fim de obviar ao número crescente
de doentes, muitos hospitais criaram unidades temporárias para aliviar a
pressão sobre os serviços de urgência. Os doentes idosos correm um maior risco
de sofrer complicações respiratórias graves. E Jean-Luc Leymarie, médico de
clínica geral da França, exprimiu a sua preocupação: “Há muito tempo que não
via uma epidemia tão grande.”
“A maioria dos casos graves envolve
pessoas que não estão vacinadas”, afirma Olivier Lucidarme, outro médico,
sublinhando o papel fundamental das vacinas contra a gripe.
A situação é semelhante na Espanha, com regiões como a Catalunha e Valência a
sentirem a sobrecarga com o afluxo de casos de gripe. Os hospitais estão a
preparar-se para um pico previsto para a próxima semana, sendo a estirpe
dominante, nesta época, a gripe B. Embora
as instalações de saúde não estejam tão congestionadas como em anos anteriores,
os profissionais de saúde estão a apelar à preparação.
A Hungria regista um aumento dos casos de
gripe, o que levou à implementação de medidas sanitárias mais rigorosas. Em
Budapeste, algumas clínicas tornaram obrigatório o uso de máscaras e implementaram
proibições de visitas, para controlo da propagação do vírus. Os hospitais de
Győr, Vác e Debrecen seguiram o exemplo para controlo da propagação do vírus.
A Roménia também não foi poupada. Na semana passada, foram registados mais de 4100 casos, quase o dobro da semana anterior. Quatro mortes foram associadas a complicações da gripe. Bucareste e outras regiões, incluindo Cluj e Brasov, registam os números mais elevados de casos. As autoridades sanitárias alertam para novo aumento com a reabertura das escolas e recomendam a vacinação como o método de prevenção mais eficaz. Com mais de 1,1 milhões de vacinas contra a gripe administradas na Roménia, só nesta época de gripe, os médicos sublinham que não é demasiado tarde. Para as crianças dos 2 aos 18 anos, a vacina em spray nasal é a opção sem agulha. A imunidade desenvolve-se em cerca de duas semanas.
Em Portugal, há um foco de infeção por vírus da gripe aviária numa
exploração com 55427 aves de capoeira, em São João das Lampas, no concelho de
Sintra, causando a morte a 279 aves. As autoridades de saúde, que implementam
medidas para controlar e erradicar o foco, referem que não há pessoas infetadas
com H5N1, que não se transmite através do consumo de carne.
Enfim, enquanto a Europa luta contra
esta epidemia sazonal, os especialistas apelam aos cidadãos para que tomem
precauções, incluindo a vacinação, para atenuar o impacto da gripe.
2025.01.07 – Louro de Carvalho
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