Não mudou a
natureza nem o nome, pois mantém-se a designação de “Sínodo dos Bispos”, mas
fica enriquecida a composição dos participantes na Assembleia Geral do próximo mês
de outubro, no Vaticano, sobre o tema da sinodalidade: 70 não bispos (incluindo
sacerdotes, religiosos e religiosas, leigos e leigas) participarão como membros
votantes, identificados pelas Conferências Episcopais e pelos Conselhos das
Igrejas Orientais, e, depois, nomeados pelo Papa. Pede-se que as mulheres estejam
em 50% e que a presença dos jovens seja valorizada.
Todos os participantes
terão direito a voto, chegando a um número de membros votantes na Sala Nova do
Sínodo de cerca de 370, para um total de mais de 400 participantes. Até agora,
havia um pequeno número de membros votantes não bispos e eram alguns membros de
institutos religiosos clericais (portanto, só masculinos).
Os cardeais Mário
Grech, atual secretário-geral do Sínodo dos Bispos, e Jean-Claude Hollerich, relator geral, rejeitam que se trate de revolução. Antes falam de “enriquecimento para a
Igreja”. Assim o explicitaram num encontro na Sala de Imprensa da Santa Sé, a
26 de abril.
Essas são as
principais mudanças e novidades introduzidas pelo Papa para o Sínodo que selará,
no outono (e depois continuará em 2024), o caminho sinodal que ele lançou em
2021 e que envolveu as dioceses dos cinco continentes.
As novas
disposições, que foram comunicadas, em carta, aos responsáveis das assembleias
continentais celebradas na África, na Ásia, no Médio Oriente e na Oceânia, não
revogam os regulamentos atuais, designadamente a Constituição Apostólica Episcopalis
Communio de 2018, que já previa a presença de não bispos. Com as
novidades de agora – justificadas no contexto do processo sinodal que Francisco
queria que se começasse “de baixo para cima” – o número exato são 70, entre
sacerdotes, religiosos e leigos, provenientes das Igrejas locais que
representam o Povo de Deus. Portanto, não haverá mais “auditores”.
“Esta
decisão”, como explica a Secretaria-Geral do Sínodo, “reforça a solidez do
processo como um todo, incorporando na assembleia a memória viva da fase
preparatória, através da presença de alguns dos que foram seus protagonistas.
Deste modo, a especificidade episcopal da Assembleia Sinodal não é afetada, mas
confirmada”. Trata-se de 21% da assembleia que continua a ser Assembleia de
bispos, com uma certa participação de não bispos, cuja presença garante o
diálogo entre a profecia do povo de Deus e o discernimento dos pastores, a
circularidade colocada em prática durante todo o processo sinodal.
Mais pormenorizadamente,
os membros “não bispos” são nomeados pelo Papa a partir de uma lista de 140
pessoas identificadas pelas Conferências Episcopais e pela Assembleia de
Patriarcas das Igrejas Católicas Orientais (20 cada). Ou seja, cada assembleia
continental proporá uma lista de 20 nomes e o Papa escolherá 10 de entre eles. Metade
desses nomes devem de mulheres e os jovens devem ser também escolhidos: “porque
o nosso mundo é assim”, vincam os cardeais.
Na escolha,
leva-se em conta a cultura geral, a prudência, o conhecimento e a participação
no processo sinodal. Como membros, têm o direito de votar. Um aspeto
importante, embora o cardeal Grech espere “que um dia se possa dispensar o voto”,
já que o sínodo é discernimento, oração, que não se apoia nos votos. O cardeal
maltês também explicou que haverá uma única votação e não duas diferentes, uma
para os bispos e outra para os não bispos.
As cinco
religiosas e os cinco religiosos eleitos pelas respetivas organizações de
Superioras Gerais e de Superiores Gerais (UISG, para o feminino; e USG, para o
masculino) também terão direito a voto. Eles – outra novidade substancial –
substituem os 10 clérigos dos Institutos de Vida Consagrada previstos no
passado. As eleições – realizadas em plenário e por voto secreto pelos respetivos
Sínodos, Conselhos e Conferências Episcopais – devem ser ratificadas pelo Papa.
E, até que o Papa não confirme a eleição, os nomes dos eleitos não serão
conhecidos pelo público.
Outra
novidade é que a Assembleia também contará com a participação – mas sem direito
a voto – de especialistas, pessoas competentes em vários aspetos, sobre o
assunto em questão. E haverá delegados fraternos, membros de outras Igrejas e
comunidades eclesiásticas. Pela primeira vez, as figuras dos facilitadores,
também especialistas, facilitarão o trabalho nos vários momentos. É uma escolha
que nasceu da experiência dos grupos de estudo e que mostrou como esses
especialistas podem criar uma dinâmica que pode dar frutos. Há bispos que nunca
participaram no Sínodo, pelo que é preciso facilitar a dimensão espiritual,
explicou o cardeal Hollerich, enfatizando que, pela primeira vez, também haverá
bispos de países que não têm uma Conferência Episcopal na Assembleia, como o
Luxemburgo, a Estónia e a Moldávia. Dessa forma, “a Igreja será mais completa e
será uma alegria tê-la toda reunida em Roma”.
***
O cardeal Jean-Claude Hollerich, arcebispo de Luxemburgo, relator geral, explica em
entrevista à media vaticana, a nova composição da assembleia de outubro e
sublinha como a Igreja é chamada a ser missionária, com a sua diversidade,
colocando Cristo no centro.
Não se trata
de novidade absoluta, pois, já no passado, houve membros com direito a voto que
não eram bispos. Não houve mulheres com direito a voto, mas membros não bispos,
sim. Pode-se dizer que esse grupo está a tornar-se maior e inclui mulheres. O
Sínodo continua a ser dos bispos, porque o bispo é sempre o pastor da sua
Igreja, não se podendo ver a sua função separada do povo, das pessoas. Uma
pequena parte dessas pessoas estará presente no Sínodo juntamente com os pastores.
Terão uma missão especial, pois já tiveram a grande experiência de sinodalidade
nas dioceses, depois, no âmbito de conferências episcopais e, por fim, no
âmbito continental. Nem todos os bispos que participarão tiveram esta
experiência. Portanto, a tarefa desses novos membros é ser testemunhas do que
eles viveram para comunicá-lo.
Os bispos
são a maioria. Cabe-lhes fazer um discernimento, que também já foi feito em
vários níveis e que, no final, chegará ao Santo Padre. Esta é a etapa dos
bispos, mas há uma questão de discernimento que foi oferecida pelo povo de
Deus. Os novos membros do Sínodo representam, por assim dizer, a parcela não
episcopal do povo de Deus.
É de não
esquecer que os bispos pertencem ao povo de Deus. Mas é preciso entender os padres
e os/as leigos/as mais como testemunhas e como memória do processo sinodal já
realizado.
Sobre o tema do próximo Sínodo, o purpurado sustenta que, juntos, “podemos ser uma Igreja missionária, hoje e amanhã”.
Para sermos uma Igreja sinodal e missionária, temos de experienciar viver “a
Igreja como Deus quer no nosso tempo, para anunciar o Evangelho ao Mundo, aos
nossos contemporâneos. A Igreja sempre foi sinodal, a ponto de São João
Crisóstomo dizer que Sínodo e Igreja são sinónimos. O caminho que estamos
fazendo, o envolvimento de todo o povo de Deus, mostra que o Espírito Santo nos
conduz de maneira a colocar em prática o que o Concílio Vaticano II e, em
particular, a Constituição “Lumen gentium” afirmaram.
No centro da próxima assembleia geral está este modo de ser Igreja, e não
temas individuais, o que é também resposta
à doença do nosso tempo, pós-moderno ou digital, mas eivado de crescente individualismo.
E, como o individualismo impede a humanidade de subsistir, temos de apostar em elementos
comunitários. Depois, há o crescente fenómeno da polarização, na sociedade e na
mídia, mesmo nos que se referem ao catolicismo. O povo de Deus a caminhar junto
é resposta a essas tendências. Porém, não fomos nós a inventar a sinodalidade:
foi o Espírito Santo que despertou, agora, o desejo de sinodalidade experimentado
pelas primeiras comunidades cristãs.
O Papa tem vincado a importância da escuta num tempo em que todos falam e
todos fazem polémica, mas poucos escutam. E o cardeal revela que, às vezes, quando
escuta, muda de ideias, o que lhe faz bem. Há evidências que não o são para todos no povo de Deus, pelo que é bom ter
essa abertura, saber escutar. E é bom que as pessoas escutem os bispos, porque
os bispos têm não só o papel de escutar, mas também de dar respostas e de serem
pastores do povo. Não temos um parlamentarismo sinodal, onde a maioria decide e
todos seguem, o sínodo não é um parlamento. Queremos discernir a vontade de
Deus, deixar que o Espírito Santo nos guie.
É um
processo espiritual, pelo que temos a conversa no Espírito: um modo de escutar
e de dialogar, não com atitude de oposição, para conclusão comum. Há sempre
necessidade de conversão neste processo: devem converter-se bispos, padres e
leigos.
Devemos praticar
a sinodalidade católica. Temos os ministérios ordenados, a colegialidade dos
bispos, a responsabilidade da Igreja, o primado de Pedro. Tudo isso se mantém
com a sinodalidade, que é o horizonte no qual se exerce a colegialidade dos
bispos e o primado do Papa, para buscarem juntos a vontade de Deus.
Quando caminhamos,
Cristo é o centro. Há gente à direita, à esquerda, na frente, mais trás: é
normal, quando fazemos estrada, juntos. Certas tensões na Igreja são normais,
significando que a Igreja está próxima das pessoas, que não pensam todas da
mesma forma. Por isso, é importante escutar com respeito as diferentes
culturas, buscando a vontade de Deus, para decidirmos, juntos, o rumo da viagem,
pois todos fazemos parte da comunidade. Se Cristo é o centro e o Espírito Santo
é o instrumento e a garantia de que o Senhor morto e ressuscitado está no
centro, somos todos discípulos missionários e sinodais.
A Igreja não
pode estar sempre ocupada a falar das próprias estruturas e da sua organização.
A nossa fé vive servindo, na Igreja e fora da Igreja. Vive-se ao serviço de
Deus e das pessoas.
No que as
conferências episcopais propuseram a nível dos diversos continentes, também se
viram as diferenças: por exemplo, na maioria das etapas continentais, gostou-se
da imagem da tenda. Porém, na África, não, porque lá a tenda é dos refugiados, da
miséria, da pobreza, pelo que se prefere a imagem da família de Deus. Se
tentarmos ampliar a tenda, rasga. Mas a família pode ser aumentada. Por isso, não
podemos apresentar uma única imagem, mas múltiplas imagens que falam às
diferentes culturas religiosas dos nossos povos.
Sobre os oito documentos finais, Hollerich refere que o sínodo digital foi uma experiência maravilhosa. E diz que, de
todos os documentos, emerge a experiência vivida, a alegria do povo, devendo
nós olhar para o que é importante – a comunhão, a participação, a missão – e
apresentá-lo ao Sínodo dos Bispos, em outubro.
Quanto ao Instrumentum laboris,
diz que estará pronto no fim de maio e que será um texto breve, que ajudará na partilha, na participação, para que os
membros do Sínodo possam expressar-se com liberdade, para compreendermos o
chamamento de Deus à sua Igreja no Mundo de hoje. Será enviado e apresentado
aos participantes. Não se deve dar por certo que as decisões dos relatores, do
secretário-geral, do secretário especial sejam seguidas, pois tudo será
submetido ao Conselho do Sínodo e ao Papa. Não há sinodalidade sem os bispos,
nem contra os bispos, e não há sinodalidade sem Pedro ou contra Pedro. E o
cardeal aponta duas tentações: a de assimilar tudo aos velhos padrões; e a de
se querer que todas as questões consideradas importantes na Igreja sejam
discutidas no Sínodo. O Sínodo tem um título, que é a tarefa para nós:
sinodalidade, comunhão, participação, missão. O Sínodo concentrar-se-á nisso,
não noutros temas.
Em relação ao modo como o Sínodo pode interpelar uma pessoa que não está
diretamente envolvida, o cardeal pede-lhe oração. Com efeito, o trabalho
sinodal precisa do apoio orante de toda a Igreja, que deve viver o Sínodo no coração,
na sua comunidade de trabalho
ou eclesial.
E, citando o
cardeal Mario Grech, exortou a que “procuremos ter o estilo de Jesus”, pois, quando
se vê a Igreja, deve-se reconhecer Jesus. E, para isso, precisamos de
conversão. E esta conversão serve a todos, à direita, à esquerda e ao centro. Precisamos
de nos unir à volta de Cristo.
2023.04.28 – Louro de Carvalho
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