Portugal
ocupa a 29.ª posição no Índice Global de Desigualdade de Género (IGDG) à escala
mundial. Entre nós, tal como em Espanha, as mulheres detêm cada vez maior
representatividade, constituindo, dentro das empresas, metade da força de
trabalho (50% de mulheres contra 50% de homens), mas só representam 31% dos
lugares nos conselhos de administração e 6% dos Chief Executive Officer (CEO),segundo o estudo “Women Matter Iberia”, da
consultora McKinsey. E, em 45 empresas portuguesas e espanholas, que empregam
mais de 300 mil pessoas, elas pedem mais flexibilidade e reconhecimento, o que
é mais importante do que o salário, como dizem.
O relatório,
elaborado no segundo semestre de 2022, contou com a participação de 300 mil funcionários de 45 empresas,
um terço das quais são portuguesas. Trata-se da atualização de um estudo que
tinha sido levado a cabo em 2017, como declarou ao Público Joana Magalhães Silva, sócia associada da McKinsey.
Homens e
mulheres responderam sobre as expectativas para o trabalho e sobre a
desigualdade que se continua a verificar entre géneros. Permanece a disparidade salarial de 10,1% entre os
dois sexos. E, apesar de haver uma quota de 33,3% de mulheres em conselhos de
administração, são mais 30% dos homens a alcançar os cargos de liderança,
contra 9% das mulheres (segundo o Banco Mundial, apenas 6%). Ou seja, nos conselhos de
administração, as mulheres ocupam cargos mais relacionados com tarefas do que os
relacionados com decisões: 41% das
mulheres desempenham funções de staff (administração, finanças,
recursos humanos) e só 28% dos homens fazem as mesmas tarefas. “Não se trata de
não ter mulheres na força de trabalho, mas que, de facto, elas tenham uma
presença significativa nos cargos de topo”, destaca Joana Magalhães Silva.
Todavia,
quando entram numa nova empresa, 85% das mulheres (versus 88% dos
homens) acreditam ter igual oportunidade de progressão. Com o tempo, após mais
de cinco anos na empresa, a perceção vai mudando e desce para os 59%. A sócia
associada da McKinsey esclarece: “As razões podem ser múltiplas, mas o que
percebemos é que poderá ter que ver com o peso que as mulheres têm nas funções
de suporte e menos nas funções de negócio.”
No atinente
à vida familiar, também são elas as mais
penalizadas, devido ao trabalho, apesar de 80% dos locais de
trabalho terem medidas para apoiar os colaboradores com crianças. Quase metade
(49%) diz ser responsável pela maioria ou pela totalidade das tarefas
domésticas, enquanto só 15% dos homens dizem fazer o mesmo. Pode ser este um
dos motivos por que também elas revelam níveis mais elevados de burnout: 45%
sentem-se quase sempre em esgotamento, ao passo que isso acontece em 33% dos
homens que trabalham. Por conseguinte, são igualmente as mulheres a pedir mais
flexibilidade na função, sobretudo depois da pandemia. “Quando perguntamos às
mulheres o que falta para ser melhor: a flexibilidade adicional”, aponta Joana
Magalhães Silva, pedem que se flexibilize
o trabalho remoto, o preferido. E, nos últimos anos, 95% das empresas
já oferecem opções de teletrabalho.
Mais do que
o salário, 56% das mulheres consideram que serem reconhecidas e recompensadas pelo trabalho é o fator mais
importante para decidirem entrar ou permanecer numa empresa, ao passo que, para
os homens, o salário é o primeiro fator. Estes resultados são uma forma de as
“empresas endereçarem melhor as preocupações”.
Em segundo
lugar, na lista do que faz a diferença para as mulheres, com 42%, surge então a
remuneração elevada. Ter uma mentoria é importante para 31% das trabalhadoras,
tal como testemunhar modelos de comportamento. Ou seja, elas (53%) querem
chegar aos lugares de topo, mas apenas se sentirem que o estilo de vida é
sustentável e que o seu bem-estar será mantido.
Podem ser
menos no topo as mulheres, mas serão melhores. Nas empresas com liderança
feminina, a quota de satisfação dos funcionários é mais elevada – 79% dizem-se satisfeitos com as chefias.
Quando há uma menor presença de mulheres na liderança, a satisfação desce para
os 65%. O que o estudo mostra é que as gestoras mulheres têm, tipicamente,
maior preocupação com o crescimento profissional das suas equipas. À semelhança
do que querem para si, quando estão a chefiar, as mulheres preocupam-se com o
bem-estar das suas equipas e dão-lhes mais flexibilidade. E, ao receberem novos
funcionários, preocupam-se com a sua integração, através de mentorias.
“Permite-nos quantificar a importância de ter líderes também mulheres para a
satisfação dos colaboradores e isso é uma ferramenta de retenção de talento nas
empresas”, comenta a referida sócia associada da McKinsey.
Desde 2007
que a consultora McKinsey & Company vem realizando globalmente
estes estudos focados na representatividade das mulheres na força de trabalho.
O objetivo é gerar mudanças nas empresas, explorando a importância da
diversidade de género para o sucesso dos negócios.
***
Apesar de
“Portugal liderar em termos de paridade da força de trabalho na União Europeia”
(50 % mulheres e 50% homens), as portuguesas são travadas, quando estão quase no topo, visto que se
mantém o registo de enorme diferença na progressão profissional, só ocupando 6%
dos cargos executivos em comparação com 31% dos homens. Fonte da empresa
autora do estudo esclarece que, nos conselhos de administração, com a imposição
de quotas, a percentagem de mulheres tem vindo a crescer, estando em paridade
com os homens.
Apesar de a
fonte oficial do estudo considerar que estar no topo a nível da União Europeia (UE)
em termos de paridade da força de trabalho é um bom indicativo e uma resposta
positiva do tecido empresarial nacional face às recentes medidas implementadas
para combater as desigualdades de género, reconhece que este dado deve ser
acompanhado por mais e melhores condições, quer em termos de progressão de
carreira, quer em termos de flexibilidade de trabalho para as mulheres.
Para a
responsável do estudo, os travões
estão entre a sala de reuniões da empresa e a sala de estar lá de casa.
Sobre o primeiro, apesar de esforços significativos, o crescimento da presença
de mulheres nas carreiras da STEM (Science, Technology, Engineering
and Math) continua a ser pouco significativo,
não atingindo o nível dos homens. Aliado a este facto vem o de as dinâmicas
atuais ainda não estarem configuradas para o sucesso das mulheres nas empresas.
As mulheres sentem que têm menos oportunidades de desenvolvimento do que os
homens (64% versus 76%). Sustentando esta análise, o estudo revela que cerca de
41 % das mulheres têm funções de staff
contra 28% dos homens.
Num segundo
patamar, a investigação revela que as
mulheres participam mais em programas de flexibilidade, mas, em contrapartida,
registam menor presença em programas de mobilidade (2% versus 9% nos
homens), que é “muitas vezes necessária
para a ascensão à posição de CEO”.
Verifica-se
que 85% das mulheres acreditam ser promovidas, de igual forma, no início da
carreira versus 88% dos homens, contudo 59% sente-se menos
confiante em ser promovida após os 5 anos de experiência, em comparação com 73%
dos homens. Esta insegurança pode
ser justificada com o maior peso das responsabilidades familiares ou a menor
participação em programas de mobilidade geográfica.
No que toca
à execução de tarefas domésticas, os dados evidenciam serem as mulheres as mais
dedicadas. “O maior peso das responsabilidades familiares e tarefas domésticas
– 49% versus 15% nos homens – é outra
das barreiras no caminho das mulheres para a liderança.
Verifica-se
também diferença na ambição em alcançar posições de topo (36% das mulheres
contra 43% dos homens), que se deverá “à perceção de que não têm as mesmas
oportunidades de subir a escada organizacional face os seus homólogos
masculinos”. Para as mulheres ascenderem a cargos de topo, as empresas não
precisam de lançar muitas iniciativas, mas concentrar-se no que funciona: oferecer oportunidades de desenvolvimento que
exijam resultados, proporcionando flexibilidade num sentido amplo e apoio nos
momentos chave da carreira, sobretudo no primeiro salto para
responsabilidades de gestão que, muitas vezes, coincide com a maternidade.
***
Também na
violência em geral e na violência sexual (que atingem ambos os sexos e em todas
as idades), segundo vários estudos, as meninas e mulheres são mais vítimas que
os indivíduos do sexo masculino. E, mesmo no atinente a abuso sexual de
menores, como refere o psiquiatra Daniel Sampaio, com base numa análise
internacional, evocada a 13 de fevereiro, 18% das meninas e 8% dos rapazes são vítimas de abuso sexual antes dos 18
anos.
***
Outro
flagelo social desumano que atinge as mulheres é a mutilação genital feminina
(MGF) ou circuncisão
feminina (esta expressão é rejeitada pela comunidade médica). Consiste na
remoção ritualista de parte ou de todos os órgãos sexuais externos
femininos, por circuncidador/a tradicional ou por profissionais de saúde, usando
lâmina de corte (há vários instrumentos cortantes), com ou sem anestesia.
Concentra-se em 29 países africanos, na Indonésia, no Iémen e no Curdistão
iraquiano, mas também é praticada em outros locais da Ásia e do Médio
Oriente, bem como em comunidades expatriadas. Mais de 50% dos casos registados
pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) reportam-se a três
países (Indonésia, Egito e Etiópia).
A prática radica na desigualdade de género, em tentativas de controlo da
sexualidade da mulher e em ideias de pureza, de modéstia e de estética. É
iniciada e executada por mulheres, que a veem como motivo de honra e receiam
que a não a sua realização exponha à exclusão social as filhas e as netas. Mais
de 130 milhões de mulheres e jovens foram alvo de MGF nos 29 países onde é mais
frequente. Entre estas, mais de oito milhões foram infibuladas, prática que, na
sua maioria, ocorre no Djibuto, na Eritreia, na Somália e no Sudão.
A idade de realização varia entre alguns dias após o nascimento e a puberdade.
Geralmente, os procedimentos incluem a remoção do clítoris e do
prepúcio clitoriano e, na forma mais grave, a remoção dos grandes e
pequenos lábios e encerramento da vulva. Neste último procedimento –
infibulação ou excisão faraónica – fica um orifício para a passagem da urina
e para o sangue da menstruação, e a vagina é aberta
para relações sexuais e para o parto. As sequelas na saúde dependem do
procedimento, mas incluem recorrentes infeções, dor crónica, dificuldade de urinar ou de escoar o fluxo menstrual, cistos,
impossibilidade de engravidar, complicações no parto e hemorragias fatais,
bem como propensão para a transmissão da hepatite B e do vírus da
imunodeficiência humana (VIH). E não
há benefícios médicos.
Em Portugal, diz a Associação para o Planeamento da Família (APF), há mais
de 8 000 mulheres, raparigas e meninas que foram vítimas ou que estão em risco
de o serem. Os registos oficiais – baseados geralmente em casos que chegam aos
hospitais – apontam para cerca de 6 500 mulheres mutiladas, oriundas de
comunidades muçulmanas de África, nomeadamente da Guiné-Bissau, da
Guiné-Conacri, do Senegal e do Egito. Os casos são detetados por médicos na
sequência das complicações psicológicas, sexuais, obstétricas, urológicas ou
ginecológicas.
O médico Pierre Foldès, com o urologista Jean-Antoine Robein, iniciou em
2002 cirurgias reparadoras do clitóris, superando, em 2012, os 3.000 casos,
mostrando a reversibilidade da MGF.
***
É longo o caminho por andar para a igualdade de género e para evitar o
sofrimento das mulheres.
2023.02.15 – Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário