Centenas
de cientistas assinaram uma declaração urgente que apela aos líderes mundiais e
aos decisores políticos a que “ajam já e depressa”, face às alterações
climáticas, porque esperar pode levar a fazer-se tarde, na ação contra as
alterações climáticas.
Assim, a Declaração de Dartington sustenta que a Humanidade será empurrada para a “zona de perigo”, se as emissões de gases com efeito de estufa (GEE) não forem reduzidas para metade, até 2030, face aos níveis de 2010, e se não atingirem emissões líquidas zero, até 2050. Por conseguinte, apela a cortes ‘sem precedentes’, nas emissões para evitar que a temperatura média global ultrapasse o limite de 1,5 ºC (graus centigrados ou graus Celsius).
Assim, a Declaração de Dartington sustenta que a Humanidade será empurrada para a “zona de perigo”, se as emissões de gases com efeito de estufa (GEE) não forem reduzidas para metade, até 2030, face aos níveis de 2010, e se não atingirem emissões líquidas zero, até 2050. Por conseguinte, apela a cortes ‘sem precedentes’, nas emissões para evitar que a temperatura média global ultrapasse o limite de 1,5 ºC (graus centigrados ou graus Celsius).
A
declaração, coordenada pela Universidade de Exeter e pela WWF UK – a WWF-UK é a
organização britânica do Fundo Mundial para a Natureza (WWF), organização internacional,
ambiental e filantrópica, fundada em 1961, que visa conservar a Natureza e combater
a desflorestação e as alterações climáticas, focando-se em restaurar a Natureza,
em proteger habitats e espécies e em inspirar ações do público e de empresas
para um futuro mais sustentável – surgiu na sequência do Global Tipping Points
Report 2025, que advertiu, recentemente, que a Terra atingiu o seu primeiro
ponto de rutura climático catastrófico, devido ao “declínio sem precedentes”
dos recifes de coral.
O
documento – que pode ler-se em https://global-tipping-points.org/the-dartington-declaration/
– surgiu de reuniões científicas realizadas em Dartington Hall, na Inglaterra,
e, posteriormente, de uma declaração acordada na Conferência Global sobre
Pontos de Viragem, de 30 de junho a 3 de julho de 2025. Foi revisto para
incorporar as principais conclusões do Relatório Global sobre Pontos de Viragem
de 2025. Até agora, conta com o apoio de 583 cientistas e de 579 outros
subscritores, todos com doutoramento ou qualificações superiores.
A
publicação do relatório, escrito por 160 autores de 87 instituições, gerou
ampla cobertura dos media, mas era essencial que a sua mensagem fosse
acolhida por formuladores de políticas e por líderes, em todo o Mundo, antes da
COP30, a 30.ª Cimeira das Nações Unidas para o Clima, que decorreu em Belém do
Pará, no Brasil, bem como depois da COP30.
***
Eis
o texto integral da Declaração de Dartington:
“Inclinando o Futuro
“O
Mundo entrou numa nova realidade. O aquecimento global, em breve, ultrapassará
1,5°C. Isso coloca a Humanidade em zona de perigo, onde múltiplos pontos de
inflexão climática representam riscos devastadores para biliões de pessoas.
Recifes de coral de águas quentes já estão a ultrapassar o seu ponto de
inflexão térmica e a sofrer mortalidade, sem precedentes, ameaçando o sustento
de centenas de milhões de pessoas que dependem deles. As calotas polares estão a
aproximar-se de pontos de inflexão, condenando o Mundo a metros de elevação do
nível do mar, a longo prazo, o que afetará centenas de milhões de
pessoas.
“Cada fração de grau de aquecimento adicional aumenta o risco de desencadear novos pontos de inflexão prejudiciais. Entre eles, o colapso da Circulação Meridional de Revolvimento do Atlântico, que comprometeria, radicalmente, a segurança alimentar e hídrica global e mergulharia o Noroeste da Europa em invernos rigorosos e prolongados. Juntos, mudanças climáticas e desmatamento colocam a floresta amazónica em risco de morte generalizada com o aquecimento global abaixo de 2°C, ameaçando causar danos incalculáveis à biodiversidade, perturbando os padrões de chuva e impactando milhões de pessoas na região e em todo o Mundo.
“Cada fração de grau de aquecimento adicional aumenta o risco de desencadear novos pontos de inflexão prejudiciais. Entre eles, o colapso da Circulação Meridional de Revolvimento do Atlântico, que comprometeria, radicalmente, a segurança alimentar e hídrica global e mergulharia o Noroeste da Europa em invernos rigorosos e prolongados. Juntos, mudanças climáticas e desmatamento colocam a floresta amazónica em risco de morte generalizada com o aquecimento global abaixo de 2°C, ameaçando causar danos incalculáveis à biodiversidade, perturbando os padrões de chuva e impactando milhões de pessoas na região e em todo o Mundo.
“Esses
riscos de ponto de inflexão climática estão interligados, e a maioria das
interações entre eles é desestabilizadora, o que significa que o desequilíbrio num
sistema aumenta a probabilidade de desequilíbrio noutro. Os impactos
resultantes propagar-se-iam pelos sistemas ecológicos e sociais, de que
dependemos, causando danos crescentes. Se isso ocorresse, seria um resultado
catastrófico para a Humanidade, e o risco aumenta cada vez mais, à medida que
continuamos na nossa trajetória atual.
“Esses
riscos exigem que mudemos a nossa perspetiva sobre as mudanças climáticas e a
perda da Natureza, passando de um processo gradual para outro, em que mudanças
irreversíveis e devastadoras são possíveis. Uma vez que essas mudanças se
instalam, ao levar grandes sistemas, como a camada de gelo da Gronelândia ou a
floresta amazónica, a ultrapassarem os seus pontos de inflexão, torna-se muito
difícil retornar ao Mundo que conhecemos hoje.
“A
intensidade e a duração do aquecimento global são cruciais, para evitar pontos
de inflexão climáticos. A magnitude e a duração do aumento da temperatura
global acima de 1,5 °C precisam de ser minimizadas – e, em última análise, o
aquecimento global precisa de ser reduzido para cerca de 1 °C. As emissões
globais antropogénicas de gases de efeito estufa devem ser reduzidas pela
metade, até 2030 (em comparação com os níveis de 2010) e, em seguida, atingir
emissões líquidas zero, até 2050. Isso exige aceleração, sem precedentes, na
eliminação gradual dos combustíveis fósseis, rápida mitigação das emissões de
metano e de outros poluentes climáticos de curta duração, e rápida expansão da
remoção sustentável de carbono da atmosfera, especialmente, por meio da
proteção e da restauração de florestas e de outros sumidouros naturais de
carbono.
“Se
esperarmos para ultrapassar os pontos de inflexão, antes de agirmos, será tarde
demais. A única estratégia credível de gestão de riscos é agir antecipadamente.
Mas a janela para evitar pontos de inflexão prejudiciais está a fechar-se,
rapidamente. As atuais Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC) e as
metas vinculativas de longo prazo ou de emissões líquidas zero não são
suficientes. Ainda comprometem o Mundo com o aquecimento global contínuo, que,
provavelmente, ultrapassará os 2°C, antes de 1100. Isso exige ação imediata e
sem precedentes por parte dos formuladores de políticas na COP30 e dos líderes
mundiais.
“Para
alcançar uma aceleração tão radical das ações, são necessárias transformações
que desencadeiem pontos de inflexão sociais, gerando mudanças
autoamplificadoras em tecnologias e comportamentos de baixo carbono, rumo a
emissões zero. Um exemplo disso pode ser visto na queda acentuada dos preços e
na rápida implementação da energia solar e do armazenamento em baterias.
Políticas direcionadas, especialmente, mandatos que proporcionem segurança na
transição, podem ajudar a desencadear e acelerar esse tipo de mudança positiva
em cascata.
“Como
especialistas em sistemas terrestres, clima, ciências naturais e sociais, o nosso
apelo aos líderes, aos formuladores de políticas e a todas as pessoas ao redor
do Mundo é que ajam agora e rápido. Se esperarmos, será tarde demais. A
sociedade civil e os políticos devem unir forças para evitar novos pontos de
inflexão prejudiciais e para aproveitar as oportunidades que surgirem em pontos
de inflexão positivos. Este é momento de extrema importância. O futuro do
planeta está em jogo. Para que lado ele penderá dependerá das nossas ações,
agora e nos próximos anos.”
***
O
texto é claro, ao alertar que está em jogo o futuro do planeta. E todos sabemos
que não há planeta B. “Se esperarmos, será demasiado tarde”, avisa a declaração,
considerando que a política e a civil “devem unir esforços, para evitar
mais pontos de rutura prejudiciais e [para] aproveitar as oportunidades
dos pontos de rutura positivos”. Ora, porque “o futuro do planeta está em jogo”
e porque “para que lado penderá depende das nossas ações, agora e nos próximos
anos”, a declaração pede uma “redução sem precedentes” das emissões de GEE globais,
“algo impossível, sem uma transição rápida de abandono dos combustíveis fósseis”.
Todavia, a COP30, aliás como as demais cimeiras climáticas da organização das Nações Unidas (ONU), preferiu ouvir as vozes negacionistas e sujeitar-se às pressões do lóbi do petróleo, embora tenha feito transitar para 2026 um tímido documento final de compromisso com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), definidos pela ONU.
Todavia, a COP30, aliás como as demais cimeiras climáticas da organização das Nações Unidas (ONU), preferiu ouvir as vozes negacionistas e sujeitar-se às pressões do lóbi do petróleo, embora tenha feito transitar para 2026 um tímido documento final de compromisso com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), definidos pela ONU.
Segundo
a ONU, os combustíveis fósseis são de longe o maior fator das alterações
climáticas globais, respondendo por cerca de 68% das emissões mundiais de GEE e
por cerca de 90% de todas as emissões de dióxido de carbono (CO2).
As
hipóteses de futuro livre de combustíveis fósseis foram adiadas na COP30,
de 10 a 21/22 de novembro, quando o acordo final omitiu a discussão de um
roteiro da sua eliminação. Porém, países mais ambiciosos parecem estar a
impulsionar a busca de um roteiro para a eliminação dos combustíveis fósseis
fora do processo da COP.
A
Declaração de Dartington pede a rápida expansão da remoção sustentável de carbono
da atmosfera, protegendo e restaurando sumidouros naturais de carbono, como as
florestas.
Os
sumidouros naturais de carbono são ecossistemas que absorvem e armazenam CO2
da atmosfera, como as florestas, os oceanos e o solo. Estes sistemas
desempenham papel crucial na regulação do clima, ajudando a mitigar o
aquecimento global ao removerem o excesso de CO2 da atmosfera,
através de processos, como a fotossíntese e a acumulação de matéria orgânica.
Os
principais sumidouros naturais de carbono
são, desde logo, as florestas, que, pela fotossíntese,
capturam o CO2 e armazenam o carbono na sua biomassa (troncos,
folhas, raízes) e no solo. E as florestas tropicais, como a Amazónia, são
particularmente importantes neste processo.
Também
os oceanos absorvem grandes quantidades de CO2, através do fitoplâncton (que
realiza a fotossíntese) e de outros organismos marinhos. O carbono é, então,
armazenado nas profundezas do oceano, quando a matéria orgânica afunda.
Por
seu turno, os solos acumulam carbono nas suas camadas, especialmente, os solos
com elevada quantidade de matéria orgânica. As turfeiras, por exemplo, são um
tipo de zona húmida que retém grandes quantidades de carbono no solo.
Também
as zonas húmidas costeiras incluem mangais e pântanos, que são capazes de
capturar grandes volumes de carbono.
Ao
absorverem CO2, os sumidouros naturais limitam a concentração deste
gás na atmosfera, o que, ajudando a combater as alterações climáticas,
evidencia a sua relevância na ação climática, sobretudo, ao nível regulador. Porém,
estes ecossistemas são vulneráveis a ações humanas, como o desmatamento, a
expansão agrícola, a poluição e a sobre-exploração. Assim, quando danificados, transferem
para a atmosfera o carbono armazenado.
Quanto
ao impacto destes ecossistemas, é de referir que, por exemplo, o aquecimento
dos oceanos diminui a sua capacidade de absorver CO2 e os incêndios florestais enviam
o carbono previamente armazenado.
Efetivamente,
a degradação da floresta e a desflorestação em massa já ocorreram em partes extensas
da floresta amazónica, apelidada de pulmões da Terra, bem como em muitas
florestas da África e do Sudeste Asiático – enviando o carbono armazenado de
volta para a atmosfera.
O
solo, enquanto sumidouro de carbono, atualmente, armazena mais de 2800
gigatoneladas de carbono, no primeiro metro. Contudo, às taxas de degradação
atuais, corre-se o risco de grandes reservas de carbono nos solos serem
libertadas para a atmosfera, na ordem de 4,81 mil milhões de toneladas de CO₂, por
ano, aproximadamente, o mesmo número que as emissões anuais dos Estados Unidos
da América (EUA).
Não
é, pois, sem razão que a Declaração de Dartington insta os líderes
mundiais a concentrarem-se em desencadear “pontos de rutura positivos” que
acelerem a transição para tecnologias e comportamentos de baixo carbono,
evitando que seja ultrapassado o limite de 1,5 °C do Acordo de Paris. “Um
exemplo é a forte queda dos preços e a rápida expansão da energia solar e do
armazenamento em baterias”, frisa a declaração.
E
os responsáveis pela declaração solicitam a outros especialistas em sistemas
terrestres, em clima e em ciências naturais e sociais que assinem a declaração.
***
A
União Europeia (UE) e o Brasil apelaram a outras nações para que reconheçam a
precificação do carbono como uma forma pragmática de reduzir as emissões e
financiar a transição verde. O objetivo é formar uma coligação de países que
arrecadem fundos provenientes da poluição de carbono e os invistam em
tecnologias limpas para ajudar a reduzir as emissões de GEE.
A receita ajudaria os países a implementar seus planos climáticos nacionais e a continuar a trabalhar para cumprir o Acordo de Paris, adotado, há 10 anos, na COP21.
A receita ajudaria os países a implementar seus planos climáticos nacionais e a continuar a trabalhar para cumprir o Acordo de Paris, adotado, há 10 anos, na COP21.
O
sistema de precificação de carbono do bloco reduziu as emissões de GEE, em 50%,
em relação a 2005, e gerou mais de 250 mil milhões de euros em receitas.
Os
defensores desse mecanismo aduzem que a existência de um mercado de carbono
confiável dará aos investidores segurança para se desbloquear o financiamento
de projetos que reduzem ou capturam emissões de GEE, como o reflorestamento, a energia
renovável ou as indústrias de baixo carbono. Em contraponto, os críticos
argumentam que dar destaque à precificação do carbono desviará a atenção de
medidas reais de redução de emissões, como investir na restauração de
sumidouros naturais de carbono, como as florestas e os oceanos.
Cerca
de 55 países implementam iniciativas de precificação de carbono – impostos
sobre carbono ou sistemas de comércio de emissões – que representam cerca de
28% das emissões globais de GEE. Estes números representam metade das emissões
globais dos setores da energia e da indústria. O mecanismo em causa é elogiado
como “ferramenta poderosa” que ajuda os países a reduzir as emissões, a aumentar
a receita interna em ambientes fiscais restritivos e a impulsionar o
crescimento verde e a criação de empregos. E os mercados de créditos de carbono
podem ajudar a mobilizar capital privado e direcionar fundos para prioridades
de desenvolvimento.
Porém,
os grupos ambientalistas mantêm ceticismo, quanto à tributação do carbono, pelo
que se manifestaram contra, na preparação da COP30. De acordo com Anderson
Amaro, membro do Movimento dos Pequenos Agricultores do Brasil e da Coordenação
Latino-Americana de Organizações Rurais, “os mercados de carbono são uma nova
forma de bilionários e corporações extraírem mais riqueza dos nossos
territórios”, pois “ganham duas vezes, com a permissão para expandir as
atividades relacionadas com os combustíveis fósseis e com os lucros dos
mercados de compensação de carbono, de água e de biodiversidade”.
***
É
mesmo necessário combater as alterações climáticas e aperfeiçoar o Acordo de Paris.
Todavia, a precificação de carbono não passa de um paliativo. Só adia a
solução. De facto, quem tem dinheiro pode pagar impostos adicionais, mas o planeta
não deixa de caminhar para o abismo.
2025.12.01
– Louro de Carvalho
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