A
Rússia invadiu a Ucrânia em 2022. E, passados quase quatro anos, está na disposição
de celebrar um acordo de paz, mas exige que esse acordo seja negociado entre os
Estados Unidos da América (EUA) e a Rússia e, eventualmente, com o país
interessado, a Ucrânia.
Entretanto, a Europa e, em especial, a União Europeia (UE), quer sentar-se à mesa das negociações, o que a Rússia não aceita, por a Europa se apresentar como parte interessada, e não como neutral. E houve proposta russa de acordo, de todo inaceitável, mas que a administração da Casa Branca foi limando, de forma que não seja tão oneroso para a Ucrânia, embora mantenha, grosso modo, os objetivos principais da Rússia e dos EUA.
Entretanto, a Europa e, em especial, a União Europeia (UE), quer sentar-se à mesa das negociações, o que a Rússia não aceita, por a Europa se apresentar como parte interessada, e não como neutral. E houve proposta russa de acordo, de todo inaceitável, mas que a administração da Casa Branca foi limando, de forma que não seja tão oneroso para a Ucrânia, embora mantenha, grosso modo, os objetivos principais da Rússia e dos EUA.
Acresce
que a administração norte-americana mudou de atitude, face à guerra da Ucrânia.
Joe Biden assumiu posição forte e dura e apodou de designações diplomaticamente
inconvenientes o presidente russo. E Donald Trump pensou que levaria avante a ideia
de acabar com a guerra, com impensada brevidade. Por outro lado, embora Donald
Trump seja negacionista, no atinente às alterações climáticas e à necessidade
de eliminar os combustíveis de origem fóssil, quer um entendimento com a Rússia
para a vigilância e para o proveito dos recursos do Ártico. Sabe que os EUA não
têm fronteira tão extensa com o pequeno oceano como a Rússia, pelo que pretende
(a bem ou a mal) um entendimento com o Canadá e com a Dinamarca, via Gronelândia.
Além disso, ainda não dispõe de navios quebra-gelo.
Num
aspeto Donald Trump e Vladimir Putin estão concordes: a insignificância da Europa
e da UE. Os EUA pouco têm a ver com a Europa, pelo que é ela que tem de se
defender. No entanto, a Europa continua a decretar sanções à Rússia, que pouco
lhe afetam a economia, mas que, em ricochete, criam dificuldades à Europa e a
dividem. Por exemplo, há países do Leste que são membros da UE e querem continuar
a comprar petróleo à Rússia, como há países da Europa, incluindo da UE, que,
apesar das sanções, comprar produtos russos, via Noruega.
Também
não sei aferir da bondade da Europa em rejeitar um plano de paz que o governo ucraniano
tende a aceitar ou em a UE querer emprestar à Ucrânia, a título de reparação, uma
verba avultada de ativos russos depositados na Bélgica, sacrificando um dos estados-membros.
É
neste contexto que surge uma estranha declaração do presidente russo.
Durante
um fórum de investimento em Moscovo, organizado pelo banco VTB, a 2 de
dezembro, Vladimir Putin acusou os europeus de não terem uma “agenda
pacífica” e, referindo-se, ao apoio ocidental à Ucrânia, considerou que a
Europa está “do lado da guerra”. Assegurou que a Rússia não está a planear
lutar contra os países europeus, mas, se a Europa quiser guerra, a Rússia está “pronta,
agora”. “Se a Europa decidir entrar em guerra com a Rússia e começar, de facto,
uma guerra, poderá chegar, rapidamente, a uma situação em que Moscovo não terá
ninguém com quem negociar”, justificou o presidente russo, observando que os
governos europeus “vivem na ilusão” de impor uma derrota estratégica à Rússia.
Vladimir
Putin disse que as exigências europeias relativas ao fim da invasão total da
Ucrânia pela Rússia são inaceitáveis para Moscovo. E, mais uma vez, reiterou a
posição do Kremlin: negociar apenas com a administração dos EUA e não permitir
que os líderes europeus se sentem à mesa, alegando que estão a “atrapalhar” a
administração dos EUA e o presidente Donald Trump nos seus esforços para “um
acordo de paz, através de conversações”. Além disso, o Kremlin recusou negociar
com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskyy.
Tais
declarações de Vladimir Putin foram prestadas antes de uma reunião com o
enviado especial dos EUA, Steve Witkoff, em Moscovo, para ser recebido no
Kremlin, a fim de tratar, novamente, do acordo de paz proposto pelo governo de
Donald Trump, e após o presidente russo ter recusado as alterações propostas por
países aliados da Ucrânia ao plano de paz idealizado pela administração de
Donald Trump, considerado por muitos analistas pró-Rússia.
Mais
cedo, a Rússia alegou que tomou o bastião de Pokrovsk, na região de Donetsk (no
Leste), o que, se confirmado, seria o maior sucesso militar de Moscovo, desde
2023, algo negado por Kiev. Em comunicado, o Ministério de Defesa informou que
tomou outras duas cidades, na região de Zaporizhzhya, e que eliminou cerca de
500 soldados inimigos na frente do Donbass.
Agora,
Vladimir Putin avisou: “Não temos intenção de fazer guerra, mas, se a Europa
começar, estamos prontos, imediatamente.”
Após
o encontro, de cinco horas, de Steve Witkoff com o presidente russo, o assessor
do Kremlin, Yuri Ushakov, afirmou que não se chegara a acordo sobre um plano
para a Ucrânia. Descreveu as conversas como “construtivas”, mas disse que “ainda
não chegamos a uma versão de consenso”, pelo que “muito trabalho ainda está por
vir”.
***
Na
sequência das declarações de Vladimir Putin e de as negociações entre a Rússia
e os EUA, os ministros de Relações Exteriores dos Estados-membros da Organização
do Tratado do Atlântico Norte (NATO) reuniram-se na sede, em Bruxelas, na
Bélgica, a 3 de dezembro.
No discurso de abertura a reunião, o secretário-geral da NATO, Mark Rutte, alertou que a Rússia se prepara para um “confronto de longo prazo”, devendo a aliança enfrentar “perigos reais e duradouros”. Com efeito, segundo Mark Rutte, Moscovo está a trabalhar em estreita colaboração com a China, com a Coreia do Norte e o com Irão, “para desestabilizar as nossas sociedades e para romper com as regras globais”. Assim, o governo russo tem violado o espaço aéreo da NATO com jatos e com drones, realizando sabotagens e usando navios espiões.
No discurso de abertura a reunião, o secretário-geral da NATO, Mark Rutte, alertou que a Rússia se prepara para um “confronto de longo prazo”, devendo a aliança enfrentar “perigos reais e duradouros”. Com efeito, segundo Mark Rutte, Moscovo está a trabalhar em estreita colaboração com a China, com a Coreia do Norte e o com Irão, “para desestabilizar as nossas sociedades e para romper com as regras globais”. Assim, o governo russo tem violado o espaço aéreo da NATO com jatos e com drones, realizando sabotagens e usando navios espiões.
Segundo
o secretário-geral da NATO, os estados-membros estão a aumentar os investimentos
em defesa, pois “todos precisamos fazer a nossa parte”; e a Ucrânia “precisa do
nosso apoio mais do que nunca”, com o inverno e com os ataques russos.
Também
o presidente da Ucrânia disse que sua delegação se preparava para uma reunião
com os EUA, após o encontro em Bruxelas.
No
dia 3, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, afirmou que “não seria correto”
dizer que Putin rejeitou as propostas dos EUA, pois é um processo de trabalho
normal e a busca por um consenso.
O
plano em causa foi gizado, há cerca de duas semanas. Os EUA apresentaram
28 pontos que, supostamente, ajudariam a garantir uma paz duradoura entre a
Rússia e a Ucrânia, mas propunha, entre outras coisas, o reconhecimento da
Crimeia e das regiões de Donetsk e Luhansk como território russo, pelos EUA e por
outros países, bem como a redução do tamanho das forças armadas ucranianas. Contudo,
a proposta foi considerada amplamente favorável à Rússia e sofreu diversas
alterações, nas últimas semanas.
A
proposta foi, de novo, trabalhada a nível bilateral, a 30 de novembro, na
Florida, entre delegações presididas pelo chefe da diplomacia dos EUA, Marco
Rubio, e pelo negociador ucraniano Rustem Umerov. E Vladimir Putin denunciou
que os países europeus, referindo-se, principalmente, à França, à Alemanha e ao
Reino Unido, incluem no plano exigências inadmissíveis para Moscovo com o objetivo
de “bloquear todo o processo de paz”.
Persistem
divergências significativas entre Moscovo e Kiev, sobretudo, quanto à
possibilidade de a Ucrânia aceitar renunciar a áreas que ainda administra e
quanto ao tipo de garantias de segurança que os países europeus estariam
dispostos a fornecer. Moscovo e os parceiros europeus de Kiev também mantêm
posições muito distantes, em relação ao que dizem ser os termos adequados para
um possível acordo de paz.
***
Com
a invasão russa da Ucrânia em larga escala, tem vindo a aumentar a pressão
sobre a Alemanha, para renovar a sua obsoleta indústria de defesa. Têm sido ditas
palavras ou expressões, como “capacidade de guerra”, e vem-se fazendo a
exigência de a Bundeswehr (as forças armadas unificadas da Alemanha, a sua
administração civil e as autoridades de aprovisionamento) se tornar o exército
convencionalmente mais forte da Europa.
As exigências máximas da Rússia na guerra de agressão contra a Ucrânia e a lenta, mas efetiva, retirada americana da NATO constituem um alerta para os europeus, que são, cada vez mais, obrigados a cuidar da sua própria segurança. Ora, para se tornar capaz de se defender – e, portanto, capaz de fazer a guerra – o mais rapidamente possível, a Alemanha prevê, no seu orçamento, o aumento do investimento na defesa para quase 153 mil milhões de euros, até 2029.
As exigências máximas da Rússia na guerra de agressão contra a Ucrânia e a lenta, mas efetiva, retirada americana da NATO constituem um alerta para os europeus, que são, cada vez mais, obrigados a cuidar da sua própria segurança. Ora, para se tornar capaz de se defender – e, portanto, capaz de fazer a guerra – o mais rapidamente possível, a Alemanha prevê, no seu orçamento, o aumento do investimento na defesa para quase 153 mil milhões de euros, até 2029.
Esse
valor é, frequentemente, utilizado como referência. Até lá, as despesas com a
defesa devem aumentar para cerca de 3,5% do produto interno bruto (PIB) e a
Bundeswehr deve ficar “pronta para a guerra”, já que um possível ataque russo
ao território da NATO pode ocorrer nesse ano.
Na
série de eventos “Zeitenwende on Tour”, da Conferência de Segurança de Munique,
no final de novembro, o inspetor-geral das Forças Armadas alemãs, Carsten
Breuer, frisou que “ninguém inventou o ano”, mas que este se baseia
em “análises limpas”. Isso não quer dizer que, na ótica de Carsten Breuer, “que
a Rússia vá atacar, mas estará em posição de o fazer”.
O
aviso de que é possível um ataque russo em 2029 baseia-se numa análise da NATO,
de 2023, a “Avaliação Conjunta da Ameaça”, segundo a qual a Rússia poderia ter
condições para desencadear uma guerra, em grande escala, dentro de três a cinco
anos.
De
acordo com a investigação da WDR (Westdeutscher Rundfunk – instituição
de radiodifusão pública alemã, baseada em Colónia), a avaliação utilizou
satélites de reconhecimento para registar as atividades desenvolvidas pela
Rússia, incluindo os volumes de produção e as estratégias de recrutamento. A
avaliação, que se baseou apenas em informações dos serviços secretos, concluiu,
em 2023, que a Rússia será capaz de criar um exército de 1,5 milhões de
soldados, com o respetivo equipamento, em cinco anos – ou seja, até 2028 – e
levar a cabo um ataque deste tipo. E, em 2024, o ministro da Defesa, Boris
Pistorius, e Carsten Breuer, tornaram pública a “Avaliação Conjunta da Ameaça”,
explicando que, obviamente, não queriam assustar a população, “falando
diretamente de 2028, em 2024”.
Tanto
a Bundeswehr como o Serviço Federal de Informações (BND) se aperceberam,
rapidamente, de que fora utilizada uma análise mais antiga, mas não foi feita
qualquer correção. De acordo com a WDR, o Ministério da Defesa decidiu,
internamente, “formular a declaração, com mais cuidado”, e utilizar a expressão
mais geral: “até ao final da década”.
Os
EUA têm o maior exército do Mundo, sobretudo, por causa do seu enorme
orçamento, da tecnologia avançada e da dimensão da sua marinha e da sua força
aérea. Embora haja países com mais soldados, são superados pelos EUA com sua
influência global e com altos gastos com a defesa. Até ao presente, a Alemanha
tem-se apoiado na amizade transatlântica e na ordem mundial existentes. Numa
entrevista ao Atlantic, Christian Freuding, chefe do Estado-Maior
do Exército Alemão, afirmou que costumava contactar os responsáveis pela defesa
dos EUA, “dia e noite”, mas que o intercâmbio tinha “cessado”.
Para
compreender as posições americanas, Freuding confia na embaixada alemã em
Washington, “onde alguém está a tentar encontrar alguém no Pentágono”.
O
declínio do apoio dos EUA surge na pior altura, do ponto de vista dos
especialistas alemães em segurança da Bundeswehr: enquanto têm de seguir,
diariamente, os movimentos das tropas russas e de avaliar se Vladimir Putin se
atreveria a atacar um país da NATO, antes do final desta década. E a questão é
saber se um presidente dos EUA defenderia a Europa. Ainda recentemente, o
embaixador dos EUA na Aliança afirmou que gostaria que a Alemanha assumisse, no
futuro, a liderança dos EUA, na NATO, o que os especialistas veem como mais um
sinal de que os EUA poderão retirar-se da NATO a longo prazo.
Para
impedir um possível ataque russo ao território da NATO, a Bundeswehr tem de
estar “pronta para a guerra”, até 2029. Isto significa que as tropas devem ser
significativamente reforçadas e modernizadas, tanto em termos de pessoal como
de equipamento.
A
Bundeswehr tem cerca de 181 mil a 182 mil soldados no ativo, devendo aumentar o
número para cerca de 203 mil. Para o efeito, o governo do chanceler Friedrich
Merz (da CDU – Coligação Democrática Unitária) reintroduziu o serviço militar
voluntário. Os jovens nascidos em 2008 ou depois recebem carta da Bundeswehr a
convidá-los a participar no recrutamento, mas só os homens são obrigados a
responder. E, embora serviço militar permaneça, inicialmente, voluntário,
foram definidos objetivos claros para o aumento dos efetivos da Bundeswehr, podendo
o Bundestag (Parlamento federal), se aquele número não for atingido, decidir
tornar o serviço militar obrigatório. E o serviço será melhorado com programas
de formação atrativos, com melhores salários e com tecnologia moderna, como o
treino de drones, para atrair recrutas voluntários.
***
Há
quem pense que a Rússia “cria uma opção” para entrar em guerra contra a NATO e as
autoridades alemãs alertaram que a Rússia poderá estar pronta para atacar a
NATO, em 2029.
Na verdade, o ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Johann Wadephul, declarou que novas avaliações dos serviços secretos mostram que Moscovo está a preparar a opção de um ataque futuro contra a UE e contra a NATO. “Os nossos serviços de informação estão a emitir avisos urgentes: no mínimo, a Rússia está a considerar travar uma guerra contra a NATO, em 2029, refere um comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros, considerando: “Temos de impedir novas agressões russas, juntamente com os nossos parceiros e aliados.”
Na verdade, o ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Johann Wadephul, declarou que novas avaliações dos serviços secretos mostram que Moscovo está a preparar a opção de um ataque futuro contra a UE e contra a NATO. “Os nossos serviços de informação estão a emitir avisos urgentes: no mínimo, a Rússia está a considerar travar uma guerra contra a NATO, em 2029, refere um comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros, considerando: “Temos de impedir novas agressões russas, juntamente com os nossos parceiros e aliados.”
Os
países europeus têm vindo a registar um aumento de atividades suspeitas ligadas
à Rússia e de ataques híbridos orquestrados por Moscovo, incluindo
ciberataques, tentativas de sabotagem e até incursões de drones e mísseis no
espaço aéreo europeu da NATO. O Comissário Europeu para a Defesa, Andrius Kubilius, sustenta
que as suspeitas de provocações da Rússia – incluindo as incursões de drones e
o recente bombardeamento de uma linha ferroviária polaca – estão a mudar as
doutrinas de guerra. “Do ponto de vista técnico, não dispomos de capacidades de
deteção suficientes, não temos meios económicos para destruir drones”, acentuou
Kubilius, admitindo que a resposta da UE a esta situação continua a ser
inadequada e observando: “Isto mostra que a forma como nos estamos a preparar,
como podemos mudar a nossa compreensão das doutrinas de guerra modernas, não
está ao nível necessário.”
***
Que
a Ucrânia está exausta com a guerra, que precisa de apoio e de paz justa e
duradoura, é pura verdade. Porém, é de que questionar como a UE e o Reino Unido
se põem em bicos de pés, ditando condições de paz e prometendo apoio financeiro
e militar, como se fossem beligerantes, sobretudo com os EUA a retirarem-se da
NATO e a subestimar a UE. Virá da Alemanha a salvação da Europa? Duvido. Voltaremos
ao “Deutschland über alles” (“A Alemanha acima de tudo”)?
2025.12.03- Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário