Após
anos de perseguição política pelos próceres do Estado russo, morreu, aos 47 anos de idade, na prisão,
a 16 de fevereiro, Alexei Navalny, a principal figura da oposição silenciada. Estava preso, no país, desde que
decidiu regressar à Rússia, em
2021, a partir da Alemanha, onde estava exilado e a ser tratado de um
envenenamento de que tinha sido vítima.
A morte de Navalny, cuja causa está
por apurar, surge a menos de um mês das eleições que darão ao presidente
Vladimir Putin mais seis anos no poder.
Segundo o
comunicado do Serviço Prisional Federal, Navalny sentiu-se mal, depois de um passeio,
e perdeu a consciência. Foi chamada uma ambulância, que não o conseguiu
reanimar, tendo acabado por morrer. Isto sucedeu na colónia penal da cidade de Kharp, na região de
Yamalo-Nenets, perto do Ártico, a cerca de 1.900 quilómetros a nordeste de Moscovo.
Antes e
depois da tentativa de assassinato por envenenamento, em 2020, foi o principal
instigador de várias manifestações contra o regime de Vladimir Putin. Em 2013, já visto
como principal opositor do presidente russo, foi candidato a presidente da Câmara
de Moscovo, mas ficou segundo lugar. Em 2018, foi impedido de se candidatar às
eleições presidenciais.
Autor de
vários documentários sobre a corrupção na Rússia, liderava a Fundação Anticorrupção e o
partido Rússia do Futuro. Foi detido, várias
vezes, pelas autoridades.
Após o
regresso à Rússia, em 2021, foi condenado a 19 anos de prisão por “extremismo”
e, nesse mesmo ano, galardoado com o Prémio
Sakharov, do Parlamento Europeu (PE).
Face ao veredito de prisão, Navalny
disse que compreendia que estava “a cumprir uma pena de prisão perpétua, que é
medida pela duração da minha vida ou pela duração da vida deste regime”.
O Comité de
Investigação da Rússia abriu já um inquérito à sua morte de, mas nunca fez
inquérito sobre o seu envenenamento ou, pelo menos, nunca publicou os
resultados.
Nas palavras de um funcionário da UE,
Navalny foi “lentamente morto” na prisão.
A equipa do
opositor, alegando não ter ainda recebido uma confirmação oficial, enviou o
advogado de Navalny para a região onde alegadamente morreu.
***
Como foi referido, Navalny era visto
como o mais feroz adversário político do presidente russo, Vladimir Putin, e a
maior ameaça ao seu domínio do poder.
Foi galardoado com o Prémio Sakharov, do PE, pela liberdade
de pensamento, em 2021, pela sua luta incansável contra a corrupção e contra os
abusos dos direitos humanos na Rússia, apesar de várias tentativas do Kremlin
de o ameaçar, o torturar e o envenenar.
A sua filha Daria Navalnaya, que recebeu o prémio, enquanto o
pai cumpria pena de prisão numa colónia de trabalho forçado russo, transmitiu a
seguinte mensagem ao PE, em nome dele: “Diz-se que ninguém pode ousar desafiar
o regime de Putin. A Rússia é uma parte da Europa. Esforçamo-nos para nos tornar
parte dela. […] Mas também queremos que a Europa se esforce por si mesma, por
essas ideias incríveis, que estão no seu cerne. Nós lutamos por uma Europa de
ideias, a celebração dos direitos humanos, a democracia e a integridade.”
Em 2020, Navalny foi evacuado com
urgência de um hospital siberiano para a Alemanha, onde foi tratado depois de
ser envenenado com um agente nervoso do tipo Novichok.
Apesar da aparente tentativa de assassinato pelo regime
russo, Navalny retornou à Rússia em 2021, onde foi condenado a 19 anos de
prisão efetiva numa colónia penal sob a acusação de extremismo. Inicialmente,
cumpria a sentença numa prisão no centro da Rússia, mas foi transferido, em
2023, para a colónia penal de “regime especial” acima do Círculo Polar do
Ártico.
***
As reações
internacionais à sua morte não tardaram. Ao invés, o trágico desaparecimento
desta proeminente figura da oposição silenciada da Rússia concitou a condenação
internacional de Vladimir Putin.
A União Europeia (UE), que saúda, há muito, a luta inabalável de Navalny pela democracia russa, já havia tentado exercer pressão sobre o Kremlin pela repressão sistemática dos críticos do governo. Agora, os líderes da UE culpam da sua morte – que abalou Bruxelas e as capitais da União – “a Rússia de Putin”.
Charles Michel, presidente do Conselho Europeu, diz que a União Europeia (UE) “considera o regime russo [exclusivamente] responsável por essa morte trágica”, ou seja, aponta o Kremlin como responsável pela morte do opositor. Porém, assegura que “os lutadores morrem, mas a luta pela liberdade nunca morre”.
As palavras de Charles Michel foram replicadas por Joseph Borrel, o alto representante da UE para assuntos externos, que disse: “Vamos ser claros: esta é a única responsabilidade de Putin.” De acordo com um alto-funcionário do gabinete liderado por Borrell, “todo o bloco europeu considerou a Rússia de Putin diretamente responsável pela morte de Navalny”.
Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, mostrou-se “profundamente perturbada” com a notícia. “Uma lembrança sombria do que Putin e seu regime são capazes”, vincou.
A presidente do PE, na plataforma X, que “a Rússia tirou a liberdade e a vida [a Navalny], mas não a sua dignidade”, disse Roberta Metsola.
O presidente dos Estados Unidos da
América (EUA),
Joe Biden, considerou que Washington não sabe exatamente o que aconteceu, mas sustenta
que “não há dúvida de que a morte de Navalny foi uma consequência de algo que Putin
e os seus capangas fizeram”. Navalny “poderia ter vivido em segurança no exílio”,
mas regressou a casa, apesar de saber que poderia ser preso ou morto, “porque
acreditava profundamente no seu país, a Rússia”, vincou.
Na Alemanha,
o chanceler Olaf Scholz disse que Navalny, “provavelmente, pagou por essa
coragem com a sua vida”.
Este acontecimento mostra “que a
sentença na Rússia, agora, para a oposição, não é apenas a prisão, mas a morte”,
disse Nigel Gould-Davies, ex-embaixador britânico na Bielorrússia e membro
sénior da Rússia e Eurásia no Instituto Internacional de Estudos Estratégicos
em Londres.
***
Embora não espante o silenciamento
das oposições políticas e a morte misteriosa de opositores em regimes
totalitários, estranha-se e lamenta-se o que se passa com opositores russos de projeção
internacional. São envenenados, caem de avião, caem a caminhar e ficam
inconscientes ou há qualquer outro acidente – tudo factos que ninguém parece interessado
em explicar.
Desta feita, como não bastassem as circunstâncias
misteriosas em que a morte ocorreu, adicionam-se, alegadamente, outros factos:
a mãe de diz que a morgue recusa entregar corpo do filho; e a polícia russa
prende mais de 100 pessoas em eventos de homenagem a Navalny.
A mãe do opositor de Putin exige o corpo do filho,
depois de a morgue ter dito que não está lá.
Não
se sabe onde se encontra o corpo do líder da oposição russa Alexei Navalny,
afirmou a sua equipa, no dia 17, depois de confirmar a sua morte.
A equipa de Alexei Navalny acrescentou
que o seu líder foi “assassinado” e exige que os seus restos mortais sejam
entregues, “imediatamente”, à família.
A porta-voz de Navalny, Kira Yarmysh, publicou, na rede
social X, que a mãe de Navalny tinha
viajado para a colónia penal de “regime especial”, acima do Círculo Polar do
Ártico onde ele estava detido e recebeu uma mensagem oficial de que ele tinha
morrido em 16 de fevereiro às 14h17, hora local. Foi então informada de que o corpo
tinha sido transferido pelos investigadores para Salekhard. Porém, quando ela e
o seu advogado chegaram à morgue, esta estava fechada. “O advogado ligou para o
número de telefone que estava na porta. Disseram-lhe que era a sétima pessoa a
telefonar hoje. O corpo de Alexei não está na morgue”, escreveu Yarmysh, que acrescentou:
“Exigimos que o corpo de Alexey Navalny seja imediatamente entregue à sua família.”
Maria Pevchikh, chefe do conselho da
Fundação Anticorrupção de Navalny, disse que o líder da oposição “viverá para
sempre em milhões de corações”. “Navalny foi assassinado. Ainda não sabemos
como vamos continuar a viver, mas juntos, vamos pensar em algo”, escreveu no X.
Segundo o OVD-Info, um grupo que
monitoriza a repressão política na Rússia, mais de 100 pessoas foram detidas,
no dia 16, em várias cidades russas, quando foram depositar flores em memória
de Navalny em memoriais às vítimas das purgas da era soviética.
As homenagens
foram retiradas durante a noite, mas as pessoas continuaram a chegar com flores
no dia seguinte. Em Moscovo, um grande grupo de pessoas gritou: “Vergonha!” –
enquanto a polícia arrastava uma mulher que gritava, de acordo com um vídeo
partilhado nas redes sociais.
Mais de 10
pessoas foram detidas num memorial em São Petersburgo, incluindo um padre que
foi ali celebrar uma missa por Navalny. Noutras cidades do país, a polícia
isolou alguns dos memoriais e os agentes tiraram fotografias aos presentes e
anotaram os seus dados pessoais, numa clara tentativa de intimidação.
***
Os cidadãos dos países livres,
sobretudo os que nunca experimentaram a dor que a opressão e a repressão causam
nos espíritos e nos corpos, não apreciam a liberdade e a democracia. E este é mais
um caso a advertir-nos para o valor da liberdade, que nunca está
definitivamente assegurada. Tantos são os arautos do sebastianismo que, mal
cheguem ao poder, cavarão a desigualdade económica, social, comunicacional e cultural,
restando os mecanismos da democracia formal, onde é liberdade é reduzida ao ar
que respiramos, ao dinheiro que tenhamos e ao “clube” de que sejamos adeptos.
2024.02.17 – Louro de Carvalho
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