Durante a audiência concedida ao cardeal
Marcello Semeraro, prefeito do Dicastério para as Causas dos Santos, a 22 de
junho, o Sumo Pontífice Francisco autorizou a promulgação dos decretos respeitantes
ao reconhecimento das virtudes heroicas da serva de Deus Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado (no século:
Lúcia dos Santos), monja professa da Ordem das Carmelitas Descalças, nascida a
28 de março de 1907, em Aljustrel, Portugal, e falecida a 13 de fevereiro de
2005, em Coimbra, Portugal.
Assim, uma
dos pastorinhos da Cova da Iria, a guardiã da terceira parte do segredo de
Fátima torna-se venerável, juntamente com outros quatro servos de Deus, entre
os quais o salesiano brasileiro António de Almeida Lustosa, arcebispo de
Fortaleza, falecido em 1974. Também foi reconhecido o martírio de dez
sacerdotes e dez leigos da arquidiocese de Sevilha, mortos durante a Guerra
Civil Espanhola em 1936. Todos serão proclamados beatos.
A este respeito, Silvonei José Michele Raviart falou ao Vatican News/Radio Vaticana, vincando
que a Irmã Lúcia, um dos três pastorinhos
de Fátima, é venerável e destacando que, junto com a Irmã Lúcia, se tornou venerável
o salesiano brasileiro António de Almeida Lustosa, arcebispo de Fortaleza,
falecido em 1974, convicto, como se afirma na biografia do site do Dicastério para as Causas dos Santos, de que “a primeira
evangelização consiste em devolver a dignidade às pessoas e às famílias mais
pobres”. Dizia-o ele que também foi ensaísta, cientista e artista. Além destes,
outros três servos de Deus se tornaram veneráveis, tal como foi reconhecido o
martírio de dez sacerdotes e dez leigos da arquidiocese de Sevilha, mortos por
ódio à fé, durante a Guerra Civil Espanhola, em 1936. Todos estão, assim, mais
perto da beatificação.
Da Irmã
Lúcia é referido que teve uma série de aparições da Virgem Maria, em 2017, na
Cova da Iria, em Fátima, Portugal, junto com os seus dois primos Francisco e
Jacinta Marto. Após a morte prematura dos primos, que faleceram, alguns anos
depois, devido à gripe espanhola e foram canonizados pelo Papa Francisco, em
Fátima, em 2017, a Irmã Lúcia permaneceu como a única guardiã da mensagem que
lhe foi confiada por Nossa Senhora, que ela transcreveu, a pedido do bispo de
Leiria, D. José Alves Correia da Silva, em quatro documentos, entre 1935 e
1941. Outro escrito, datado de 1944, continha a terceira parte do segredo de
Fátima, o chamado “terceiro segredo”, que foi enviado a Roma e aberto, pela
primeira vez, em 1960, mas não revelado pelo Papa São João XXIII, nem pelo Papa
São Paulo VI. Foi o Papa São João Paulo II – particularmente devoto de Nossa
Senhora de Fátima – que tornou conhecido o segredo no ano 2000, em Fátima.
A Irmã Lúcia
viveu, com empenho, a custódia da mensagem mariana, em toda a sua longa vida,
primeiro no colégio das Irmãs Doroteias, em Vilar (Porto), depois como carmelita
em Coimbra, onde faleceu a 13 de fevereiro de 2005. A distinção entre a sua
vida e as aparições, como diz o decreto, “é difícil também, porque muitos dos
seus sofrimentos tiveram de ser atribuídos às aparições: ela sempre foi mantida
escondida, protegida, guardada. Pode-se ver, em toda a sua vida, a dificuldade
de manter juntas a excecionalidade dos eventos de que foi espectadora e a
normalidade de uma vida monástica como a do Carmelo.
A 13 de maio
de 1967 (aquando das celebrações do cinquentenário), a Irmã Lúcia foi a Fátima,
onde se encontrou com São Paulo VI. Fez o mesmo com São João Paulo II, a 13 de
maio de 1982, quando o Pontífice ofereceu a Nossa Senhora uma das balas da
tentativa de assassinato contra ele no ano anterior, e, novamente, a 13 de maio
de 1991 e a 13 de maio de 2000.
Após a morte
da Irmã Lúcia, o Papa Bento XVI visitou Fátima, em 2010, e o Papa Francisco, em
2017, por ocasião do centenário. O próprio pontífice visitará o santuário a 5
de agosto, como uma das etapas da sua viagem a Lisboa, para a Jornada Mundial
da Juventude (JMJ).
***
Em Portugal,
as reações não se fizeram esperar. A comunicação social apressou-se a relevar a
notícia e os sinos do Santuário de Fátima repicaram solenemente.
Ressalta a reportagem da Olímpia Mairos à Rádio Renascença sob o título “Papa abre
caminho à beatificação da irmã Lúcia”, logo às 11H19. Com efeito, reconhecer as “virtudes heroicas” é um
passo central no processo que leva a proclamar beato um fiel católico. É a
penúltima etapa para a declaração da santidade. Para a beatificação, exige-se o
reconhecimento de um milagre atribuído à intercessão da agora venerável Lúcia
de Jesus.
Para D. José
Ornelas, bispo de Leiria-Fátima e presidente da Conferência Episcopal
Portuguesa (CEP), o reconhecimento das virtudes da irmã Lúcia representa, para
todos, “um motivo muito feliz de alegria e para todos aqueles que amam Fátima e
se deixam inspirar pela presença de Maria para si próprios e para toda a
Igreja”.
Segundo o
prelado, os três pastorinhos não ficariam completos sem Lúcia. Por outro lado,
é completar a Mensagem de Fátima com a que foi particular testemunha e que “nos
deu as memórias de todos os acontecimentos de Fátima”. “Se os dois primeiros
pastorinhos, Francisco e Jacinta, representam a idade da infância, aqueles que
foram objeto especial do carinho materno de Maria, a Lúcia representa a idade
adulta, a idade da razão, das memórias meditadas, amadurecidas, transmitidas pela
sua própria pena”, vinca, frisando que tais memórias significam para a Mensagem
de Fátima “algo de inestimável”.
Segundo o
bispo de Leiria-Fátima, o reconhecimento “agora das suas virtudes”, não só do que
disse, mas do que foi a sua vida é o confirmar do efeito da Mensagem de Fátima
em “pessoas como os dois primeiros pastorinhos na sua inocência e Lúcia na sua
idade adulta, madura de completa dedicação ao Senhor na vida consagrada”. “É
isso que nós agradecemos agora e esperamos que, em breve, de facto, possamos
celebrar, na Igreja, os três pastorinhos: como estão juntos no céu, que estejam
juntos, também na admiração e na Mensagem que trazem juntos para a Igreja”,
concluiu.
No santuário
de Fátima, esta manhã, os sinos tocaram a repique, em sinal festivo pela
“alegria que nos responsabiliza” como referiu o reitor, padre Carlos
cabecinhas, que presidiu a uma oração espontânea na Capelinha das Aparições,
com funcionários, voluntários e peregrinos.
Em
declaração publicada pelo Santuário, o reitor, padre Carlos Cabecinhas, referia-se
ao momento como “de enorme alegria para o Santuário de Fátima, enorme alegria
antes de mais, porque é o reconhecimento de Fátima como uma escola de
Santidade, a Mensagem de Fátima como caminho de comunhão com Deus; e é isso que
nós vemos espelhado na vida da Irmã Lúcia, e que é reconhecido com esta
declaração da heroicidade das suas virtudes”. “É motivo de grande alegria e,
por outro lado, que nos responsabiliza e nos responsabiliza no sentido de dar a
conhecer a vida da Irmã Lúcia.”
Na visão do
sacerdote, se a Igreja reconhece a heroicidade das suas virtudes é então
“fundamental que procuremos dar a conhecer cada vez mais profundamente e melhor
a vida desta venerável que procurou viver de forma intensa a sua relação com
Deus”. Vincando que “a Irmã Lúcia há muito que tem fama de santidade entre o povo
cristão”, o sacerdote frisa que “esta declaração da Igreja e o reconhecimento
da sua exemplaridade e o reconhecimento da sua exemplaridade compromete-nos no
procurar dar a conhecer essa vida, essas virtudes, esse modo de vivência
cristã”.
Para o
reitor, o anúncio da heroicidade das virtudes de Lúcia compromete-nos também numa
outra vertente, a oração, para que “o Senhor leve a bom termo este processo que
procurará conduzir à beatificação e canonização da Irmã Lúcia de Jesus”, que
“foi uma figura marcante do século 20 português” e da vida da Igreja, “na sua
vida discreta, mas [também] na sua capacidade de influenciar as nossas vidas”. “Esta
declaração é o reconhecimento daquela que foi a sua maior grandeza e a sua
maior grandeza residiu precisamente na sua vivência cristã, numa forte vivência
marcada pela Mensagem de Fátima, mas também pela sua vivência como Carmelita”,
assinalou.
A
vice-postuladora da Causa de Beatificação e Canonização da Irmã Lúcia, irmã
Ângela de Fátima Coelho, expressa “muita alegria” ao ver reconhecidas as
virtudes heroicas da vidente de Fátima. “Este é um passo importante no processo
da causa de canonização da irmã Lúcia, porque significa que aquilo que do ponto
de vista humano podemos estudar e conhecer, a irmã Lúcia viveu as virtudes
principais da nossa fé em grau heroico, ou seja, pode ser modelo para todos os
cristãos que se aproximam de Cristo neste caminho do discipulado”, observou.
Para Ângela
Coelho, Lúcia reúne, em si, toda a espiritualidade da mensagem de Fátima e a
espiritualidade do Carmelo. É uma figura que ultrapassa os limites do espaço
físico de Fátima e do Carmelo, porque é uma figura universal e pode ser uma
fonte inspiradora para tantos de nós que caminhamos em busca do Senhor, que
passamos por momentos difíceis e confusos.
“Fica-nos
este rasto de Luz que a Irmã Lúcia vai deixando e os seus apelos. Ela foi eco
das palavras que Nossa Senhora quis transmitir a toda a humanidade, o seu
grande desejo da oração, da oração do rosário, dos primeiros sábados, [da] consagração,
[de] uma vivência centrada em Deus... São tudo pequeninos rastos de luz que
Lúcia vai deixando e deixa para cada um de nós, neste nosso caminho de Igreja,
neste momento, em que também precisamos de figuras luminosas, que nos levantem
o olhar e nos continuem a dar esperança”, sublinhou ainda.
“Falta um
milagre primeiro para a beatificação e, depois, outro para a canonização. Mas
não é só pelos milagres que podemos obter e que fazem falta para o processo da
causa avançar, é também pela alegria que sei que é ter esta mulher como
companheira de viagem e como amiga”, concluiu, agradecendo ao Papa e ao
Dicastério pelo decreto que reconhece as virtudes heroicas da religiosa, cujo
corpo está sepultado na Basílica de Nossa Senhora do Rosário de Fátima, tal
como o dos primos Francisco e Jacinta marto, os dois primeiros santos de
Fátima.
O cardeal D.
António Marto, bispo emérito de Leiria-Fátima, congratula-se “com reconhecimento
e a promulgação das virtudes irónicas da irmã Lúcia” e sublinha “a dimensão
histórica e universal da santidade que se manifesta através do reconhecimento
destas virtudes heroicas”. Releva a “forma discreta e humilde” como Lúcia viveu
o amor a Deus, à Virgem, à Igreja e à Humanidade, vincando que viveu, discreta
e humildemente, “toda esta dimensão e espiritualidade, procurando a verdade e
não a notoriedade, sempre escondida mas sempre presente a todos”.
D. António
Marto explica que “esta sua espiritualidade, santidade e virtudes são muito
humanas”.
“Ela não era
uma extraterrestre, não vivia fora da nossa órbita, foi humana e muito
feminina, uma mulher inteligente e perspicaz, desembaraçada e solidária, cheia
de alegria e humor contagiante como testemunham as irmãs do Carmelo”, assinalou.
O cardeal,
que pertence ao Dicastério para as Causas dos Santos, refere que, apesar de a
vocação de Lúcia ter sido vivida no mosteiro, na clausura, em dimensão
contemplativa, não estava alheia à vivência e aos problemas da Igreja quer do mundo,
que estava mergulhado “no inferno de duas guerras e uma Igreja altamente
perseguida, vítima de um ateísmo militante”. “Foi portadora de uma mensagem que
transmitiu à Igreja e ao mundo, mas que interiorizou profundamente na sua
espiritualidade. Uma mensagem de misericórdia, de esperança e de paz para o
mundo”, vincou.
O prelado
evidencia quatro aspetos da espiritualidade de Lúcia: a paixão pela beleza de
Deus e do seu amor; a sua devoção e confiança no Coração Imaculado de Maria, símbolo
do amor e da misericórdia de Deus; o amor à Igreja e à humanidade, vivido
sempre com compaixão; e a oferta da sua vida a Deus em favor da humanidade, muito
interpelador para a Igreja de hoje, quando assistimos a uma espécie de eclipse
cultural, de esquecimento e de indiferença em relação a Deus.
***
Enfim, um
rico legado, um forte apelo!
2026.06.22 – Louro de Carvalho
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