O ano de 2023 marca o 50.º aniversário do Dia
Mundial do Meio Ambiente. O anfitrião é a República de Côte d’Ivoire, em parceria
com os Países Baixos. Nos últimos 50 anos, a efeméride tornou-se uma das
maiores plataformas globais para a sensibilização ambiental, com milhões de
pessoas a participar, com governos, empresas, cidades e organizações
comunitárias. Desta vez, destaca-se a poluição plástica e as soluções para a
prevenir e para a combater.
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A Fossa das Marianas, o ponto
mais profundo do oceano, o Monte
Evereste, o mais alto do Mundo, situados nos ambientes mais remotos e
inacessíveis do planeta, contêm ambos pequenos
pedaços de plástico de atividades humanas, à distância de quilómetros.
É a fração maior, mais prejudicial e mais persistente do lixo marinho, e representa,
pelo menos, 85% dos resíduos
marinhos. Encontra-se, em volumes
crescentes, ao longo das costas, nos estuários, em enormes
correntes oceânicas, em ilhas remotas, no gelo marinho, etc. Pelo fundo do mar,
das regiões polares até às trincheiras mais escuras, lesa a vida marinha e danifica
habitats.
Nos últimos
70 anos, este material, muito maleável, versátil e durável, infiltrou-se no
mercado e permeou todos os cantos da Terra. Oferece benefícios
importantes, desde dispositivos médicos, que salvam vidas, até ao armazenamento
seguro de alimentos. Porém, os plásticos desnecessários e evitáveis poluem
o planeta, em taxas alarmantes. Décadas de crescimento económico e a
crescente dependência do plástico descartável geraram uma torrente de
resíduos para lagos, para rios, para ambientes costeiros e para os mares,
criando inúmeros problemas. É crescente a ameaça aos ecossistemas, desde a
fonte até ao mar. E, além do know-how,
precisamos de vontade política e de ação urgente dos governos para enfrentar a
crise crescente.
A
Organização da Nações Unidas (ONU) adverte que, sem uma ação urgente, os 11
milhões de toneladas métricas de plástico que entram, anualmente, no oceano, triplicarão
nos próximos 20 anos. A omnipresença do lixo marinho e os impactos adversos da
poluição plástica – da degradação ambiental às perdas económicas para
comunidades e indústrias, aos riscos para a saúde humana – mostram que é a hora
de darmos as mãos para mudar o rumo do lixo marinho e da poluição plástica,
implementando as muitas (grandes e pequenas) soluções disponíveis, com
urgência, inovação, compromisso e responsabilidade.
Os plásticos
não são biodegradáveis. Decompõem-se, ao longo do tempo, em pedaços cada
vez menores – microplásticos e nanoplásticos – que têm impactos adversos na vida
marinha, que variam de danos físicos e químicos aos animais individuais, a
efeitos mais amplos na biodiversidade e no funcionamento do ecossistema. Pedaços
de plástico foram encontrados no sistema digestivo de muitos organismos
aquáticos, incluindo todas as tartarugas marinhas e quase metade das espécies
de aves de mamíferos marinhos. Tartarugas marinhas confundem sacolas plásticas
flutuantes com águas-vivas e morrem de fome, enquanto os estômagos se lhes enchem
de lixo indigerível. As aves bicam os plásticos, porque cheiram a comida e
se parecem com ela. Mamíferos marinhos, tartarugas marinhas e outros animais afogam-se,
presos em plásticos perdidos ou descartados, incluindo embalagens ou
equipamentos de pesca.
Uma das
principais causas de morte das baleias francas do Atlântico Norte, uma das
mais ameaçadas do Mundo, está a ser capturada em equipamentos de pesca
fantasma.
As toxinas encontradas
nos plásticos afetam a cadeia alimentar oceânica e os pedaços de plástico
absorvem poluentes que fluem da terra para o mar, como resíduos farmacêuticos e
industriais. A toxicidade é transferível pela cadeia alimentar, à medida
que as espécies marinhas comem e são comidas. Há crescente preocupação com
espécies não nativas à boleia, através do oceano, em lixo flutuante por mares e
por solos estrangeiros, como algas, moluscos e cracas, que invadem e degradam
ambientes e espécies aquáticas distantes. O problema agrava-se com a
acumulação do lixo plástico no fundo do oceano, sufocando os recifes de coral e
a vida marinha.
Também as
pessoas correm risco, devido ao lixo marinho e à poluição plástica. Pelo ar inalam
microplásticos, consumindo-os por meio de alimentos e de água e absorvendo-os
pela pele. Foram encontrados microplásticos em pulmões humanos, bem como no fígado, no baço e nos rins e
até nas placentas de
recém-nascidos.
Desconhece-se
a extensão do impacto na saúde humana, pois a pesquisa é incipiente. Porém,
há evidências de que produtos químicos associados a plásticos, como o metil
mercúrio, os plastificantes e os retardadores de chama, entrando no corpo,
prejudicam a saúde, sobretudo em mulheres. E os cientistas acreditam que produtos
químicos encontrados em plásticos, como o bisfenol A, os ftalatos e bifenilos
policlorados (PCBs), penetram no corpo e são associáveis à desregulação
endócrina, a distúrbios do desenvolvimento, a anormalidades reprodutivas e ao
cancro, o que é motivo bastante para a adoção da abordagem de precaução.
Os impactos
da poluição plástica não são sentidos igualmente no Mundo. Os países mais
ricos produzem mais resíduos plásticos, que fluem para os países menos
desenvolvidos, onde a gestão de resíduos é menos sofisticada. A reciclagem
reduz a produção e o desperdício de plástico, mas o problema é a baixa taxa de
reciclagem de plásticos – inferior a 10%.
Comunidades
de países em desenvolvimento são as menos capazes de gerir a carga ambiental,
de saúde, social e cultural da poluição plástica, pela falta de apoio ou de
fundos do governo. E mulheres, crianças, trabalhadores do lixo,
comunidades costeiras, povos indígenas e pessoas que dependem do oceano sofrem
os impactos mais intensamente, quando movimentam ou queimam resíduos mal
administrados. E essas economias sofrem, estranguladas pelos plásticos.
Os plásticos
marinhos dificultam a capacidade de uma miríade de ecossistemas de fornecerem
os benefícios básicos que os humanos desfrutam e têm por garantidos: da água
limpa à aquicultura e à pesca produtivas, ou ao controlo de pragas e doenças, à
regulação do clima, ao património e à recreação. A poluição plástica
reduz o serviço do ecossistema marinho em, pelo menos, US$ 500 biliões a US$
2.500 biliões em cada ano, sem incluir outras perdas sociais e económicas, como
o turismo e a navegação. As perdas económicas diretas para as indústrias
costeiras e marítimas, como a pesca e a navegação, são significativas. Na
região do Mediterrâneo, as perdas são estimadas em cerca de US$ 138 milhões por
ano. Na região de Cooperação Económica da Ásia-Pacífico, as perdas
totalizam US$ 10,8 biliões, um aumento de quase dez vezes em relação a 2009.
Contudo, essas perdas não são exatas, e os verdadeiros custos do lixo marinho e
da poluição do plástico para a saúde humana, ambiental e saúde social ainda
estão em descoberta.
O plástico é
produzido sobretudo a partir de petróleo e do gás – combustíveis
fósseis. Quanto mais plásticos se fabricarem, mais combustível fóssil será
necessário e mais intensa ficará a crise climática. Além disso, estes
produtos criam emissões de gases de efeito estufa em todo o seu ciclo de vida. Se
não forem desencadeadas ações, as emissões de gases de efeito estufa da
produção, a reciclagem e a incineração de plásticos, em 2040, representarão 19%
das emissões permitidas pelo Acordo de Paris, para limitar o aquecimento a
1,5 graus Celsius (1,5ºC).
Embora a
quantidade de plásticos marinhos a combater seja tão grande, a ciência diz-nos que
a maioria das soluções já existe. Numerosas atividades regionais,
nacionais e locais ajudam a reduzir o fluxo de plásticos para o oceano, como as
Convenções Regionais dos Mares, as proibições nacionais de produtos plásticos
descartáveis, os compromissos empresariais e governamentais para reduzir,
redesenhar e reutilizar produtos plásticos, aumentar o conteúdo de
plástico reciclado em novos produtos. “Breaking the Plastic Wave”, uma análise
global de como mudar a trajetória dos resíduos plásticos, revela que podemos
reduzir a quantidade de plástico que entra no oceano em cerca de 80%, nas
próximas duas décadas, se utilizarmos as tecnologias e soluções existentes. E a
avaliação “Pollution to Solution” refere que a escala do problema requer compromissos
e ações urgentes a nível global, em todo o ciclo de vida dos plásticos e da
fonte ao mar, para lograr a necessária redução de resíduos, a longo prazo.
Para tanto,
urge melhorar os sistemas de gestão de resíduos, para a infraestrutura certa
estar disponível para receber resíduos plásticos e garantir que uma alta
proporção possa ser reutilizada ou reciclada; melhorar a circularidade, pelas
práticas de consumo e de produção sustentáveis, em toda a cadeia de valor do
plástico; envolver os consumidores na abordagem da poluição plástica para
influenciar o mercado e inspirar mudanças comportamentais; eliminar,
gradualmente, os itens de plástico, evitáveis e mais problemáticos,
substituindo-os por outros materiais, produtos e serviços; fazer monitorização
eficaz, para identificar fontes, quantidades e destino dos plásticos; melhorar
e fortalecer a governança a todos os níveis; aprimorar o conhecimento e avaliar
a eficácia, usando ciência sólida; e melhorar o financiamento com assistência
técnica e capacitação.
Vários acordos
e convenções internacionais já fornecem apoio para reduzir a poluição marinha,
combater as mudanças climáticas e usar os oceanos de forma sustentável. A
Parceria Global sobre Lixo Marinho, a Convenção das Nações Unidas sobre o
Direito do Mar e a Convenção sobre Diversidade Biológica estão conexas com a
saúde do oceano, com os ecossistemas e com a vida marinha. As convenções
de Basileia, de Estocolmo e de Roterdão referem-se à movimentação e eliminação
de resíduos perigosos e produtos químicos.
Como em
muitos ataques ambientais intergeracionais, requer-se pensamento sistémico,
inovação e transformação. Porém, o objetivo é reduzir o uso de plásticos
desnecessários, evitáveis e problemáticos e interromper o seu fluxo para
lagos, rios, pântanos, costas e mares.
A Assembleia
das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEA) é o órgão de tomada de decisão de
mais alto nível sobre o ambiente, com a adesão dos 193 Estados-membros.
O relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) “Fechando
a torneira: como o Mundo pode acabar com a poluição plástica e criar uma economia
circular”, divulgado, a 16 de maio, em Nairóbi – antes da segunda ronda de
negociações em Paris sobre o acordo global, para combater o plástico, e na
sequência da Assembleia de maio de 2022 – descreve a magnitude das mudanças para,
acabando com esta poluição, criar economia circular. Foca-se em soluções e
analisa práticas concretas, mudanças de mercado e políticas públicas, para
informar decisões governamentais e ação empresarial. E sugere a eliminação de
plásticos desnecessários, com mudanças no mercado: reutilizar, reciclar e
reorientar e diversificar. Ou seja, há que passar da economia do descarte para
a economia circular.
O PNUMA é a principal voz global do meio ambiente. Fornece liderança e
incentiva parcerias para o cuidado com o meio ambiente, inspirando, informando
e capacitando nações e povos a melhorarem a qualidade de vida, sem comprometerem
as gerações futuras.
Tanto numa economia de descarte como numa economia circular, os custos mais
altos são os operacionais. Com a regulamentação para garantir que os plásticos
sejam projetados para serem circulares, esquemas baseados na Responsabilidade Estendida
do Produtor (REP) cobrem os custos operacionais para garantir a circularidade
do sistema, exigindo que os produtores financiem a coleta, a reciclagem e o
descarte responsável de plásticos no fim da vida útil.
Políticas públicas acordadas ajudam a superar os limites do planeamento
nacional e da ação empresarial, a sustentar a pujante economia global circular
de plásticos, a criar oportunidades de negócio e de emprego. Podem incluir
critérios para produtos plásticos, que podem ser banidos, uma linha de base de
conhecimento transfronteiriço, regras sobre padrões operacionais mínimos
necessários dos esquemas de REP e outros padrões.
O relatório recomenda que se inclua uma estrutura fiscal global nas
políticas internacionais para viabilizar a concorrência dos materiais
reciclados com os materiais virgens, criando economia de escala para soluções,
sistemas de monitorização e mecanismos de financiamento.
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Cá estamos empenhados nesta “cruzada” pela Nossa Casa!
2023.06.05 – Louro de Carvalho
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