Como antecipavam os mercados financeiros e de acordo com o respetivo
comunicado, o Conselho do Banco Central Europeu (BCE) decidiu, a 15 de junho,
voltar a subir os juros, mas manteve o ritmo mais moderado, com um aumento de
apenas 25 pontos-base. Com esta decisão, a taxa diretora do BCE subiu para 4% (o
valor mais alto desde 2008), a taxa de remuneração dos depósitos subiu para
3,5% e a taxa de juro aplicável à facilidade permanente de cedência
de liquidez subiu para 4,25%.
Frankfurt não seguiu o exemplo da Reserva Federal dos Estados Unidos (FED),
que, no dia anterior, optou por fazer uma pausa na subida dos juros, a
primeira, desde março de 2022, mantendo a taxa no intervalo entre 5% e 5,25%. Contudo,
o BCE mantém a opção de maior contenção nos aumentos, adotada na última reunião
do Conselho, no início de maio.
Esta é a oitava subida a instituição liderada por Christine Lagarde, que acumula
um aumento de 400 pontos-base, no ciclo de aumento da taxa diretora iniciado em
julho de 2022, oito meses depois do Banco de Inglaterra e meio ano após a
norte-americana FED, o que foi visto por muitos analistas como um erro de
política monetária. E os aumentos podem não ficar por aqui. No comunicado
publicado a 15 de junho, o BCE refere que “a inflação tem vindo a descer, mas
as projeções indicam que permanecerá demasiado elevada durante demasiado
tempo”.
Aliás, o BCE divulgou novas projeções económicas, com a revisão em alta dos
números esperados para a inflação subjacente, indicador que exclui os produtos
energéticos e alimentares – com preços mais voláteis – e que é uma das
principais referências para a política monetária dos bancos centrais. Estas
projeções, cuja maior revisão em alta incide sobre 2023 e 2024, indicam que a
inflação subjacente se situará, em média, em 5,1%, em 2023, nos 3%, em 2024, e
nos 2,3%, em 2025 – valores acima da fasquia dos 2%, a referência do BCE para a
estabilidade dos preços.
Embora haja sinais preliminares de abrandamento, os indicadores das
pressões subjacentes sobre os preços permanecem fortes. E o BCE explica que a
revisão em alta se deve “a anteriores surpresas em sentido ascendente e às
implicações da robustez do mercado de trabalho para o ritmo de desinflação”.
Já, quanto à inflação total, as previsões são de descida para 5,4%, neste ano,
recuando para 3%, em 2024, e para 2,2%, em 2025.
Por sua vez, os especialistas do Eurossistema reduziram as suas projeções
para o crescimento económico da Zona Euro, em 2023 e em 2024, apontando para
0,9%, em 2023, para 1,5%, em 2024, e para 1,6%, em 2025.
O BCE reconhece que os anteriores aumentos das taxas de juro “estão a
repercutir‑se, de forma vigorosa, nas condições de financiamento e estão
gradualmente a ter impacto no conjunto da economia”. Sinal disso é a subida acentuada
dos custos do endividamento e a atenuação do crescimento dos empréstimos – evolução
que ajudará a inflação a descer ainda mais. E, quanto às suas próximas
decisões, o BCE assegura que as taxas de juro diretoras serão fixadas em níveis
suficientemente restritivos, para lograr um retorno atempado da inflação ao
objetivo de médio prazo de 2%, e que serão mantidas nesses níveis, “enquanto
for necessário”.
Para tanto, “o Conselho do BCE continuará a abordagem dependente dos dados
na determinação do nível e [da] duração adequados da restritividade. Mais
especificamente, as decisões sobre as taxas de juro continuarão a basear‑se na
sua avaliação das perspetivas de inflação, à luz dos dados económicos e
financeiros que forem sendo disponibilizados, da dinâmica da inflação
subjacente e da força da transmissão da política monetária”, lê-se no referido comunicado.
Por outro lado, o BCE confirma que “descontinuará os reinvestimentos ao
abrigo do programa de compra de ativos (asset purchase programme – APP), a
partir de julho de 2023”.
***
Estas decisões, no âmbito da política monetária um impacto
direto nas taxas Euribor (que indica a taxa de juros média dos empréstimos interbancários
sem garantia da Zona Euro): se a taxa
diretora dos juros sobe, aumentam as taxas Euribor a 3, 6 ou 12 meses. Assim, a
nova subida terá impacto direto na carteira de quem tem crédito à habitação; e,
por conseguinte, deveria induzir, proporcionalmente, um aumento do pagamento dos
juros aos clientes pelos depósitos a prazo, o que não acontece em Portugal.
Quem pediu ao banco dinheiro
emprestado continuará a ver a prestação da casa a subir, pois o BCE só deverá
começar a baixar as taxas no final de 2024.
Como se referiu, esta é a oitava subida desde
julho de 2022, tendo o BCE aprovado
anteriormente vários aumentos de 50 e de 75 pontos base – no quadro da estratégia
de combate à inflação.
No início de maio, o BCE aumentou
as taxas em 25 pontos base, para 3,75%, abrandamento apoiado pela
maioria dos membros do Conselho. Antes disso, o BCE tinha subido as taxas de
juro em 50 pontos base. Agora, a taxa de juro das principais
operações de refinanciamento subiu para 3,75%; a taxa de facilidade de depósito
dos bancos no BCE passou para 3,25%; e taxa de juro aplicável à facilidade
permanente de cedência de liquidez subiu para 4%, o nível mais alto desde
outubro de 2008.
Todavia, segundo a ata da última
reunião, alguns
membros do Conselho do BCE defenderam nova subida em 50 pontos base, para
controlar os riscos inflacionistas, decisão que
“demonstraria mais claramente a determinação […] em alcançar a estabilidade dos
preços face a uma inflação elevada e mais persistente”.
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Já a 31 de maio, Mário Centeno, governador do Banco de
Portugal (BdP), avisava que os juros iriam aumentar depois do verão, o que
representaria um peso maior para as famílias, e que os governos deveriam
diminuir os apoios.
Por sua, vez, a 1 de junho, Christine Lagarde disse que
a instituição deveria aumentar ainda mais as taxas de juros, porque a inflação
na Zona Euro ainda está muito alta. “A inflação
é demasiado alta hoje e continuará a sê-lo durante muito tempo”, afirmou em
discurso proferido em Hannover (Norte), na 27.ª Conferência de Caixas Económicas
Alemãs 2023, intitulada “Porque
é mais do que dinheiro”. Foi por isso que, segundo Lagarde, o BCE
começou, em julho de 2022, a aumentar as taxas de juro, ao ritmo mais
rápido, até à data, deixando claro que ainda há um longo caminho a percorrer
para colocar as taxas de juro em níveis suficientemente restritivos.
“Estes aumentos já estão a repercutir-se fortemente
nas condições de crédito bancário, incluindo aqui na Alemanha” e “ainda é
necessário um aperto considerável”, observou Lagarde, que, além da subida dos
juros, preconiza a descida dos apoios às famílias.
No entanto, é incerta a intensidade com que a política
monetária do BCE será transmitida à economia real, referiu Lagarde,
explicitando: “Por isso, precisamos de
continuar o nosso ciclo ascendente, até estarmos confiantes de que a inflação
está no bom caminho, para regressar ao nosso objetivo, a tempo.” E a
oradora afirmou que o limite máximo até ao qual o BCE aumentará as taxas de
juro dependerá da avaliação dos dados económicos, que são as perspetivas de
inflação, a tendência da inflação subjacente e a força com que a política
monetária é transmitida.
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A
primeira quinzena de junho ficou marcada por reuniões de bancos centrais que
decidiram subir os juros, com outras a deixar tudo na mesma e com um banco
central a decidir cortar a taxa diretora. As duas mais importantes decisões de
aumento dos juros foram tomadas pelo Banco da Reserva da Austrália e pelo Banco
do Canadá, dois dos bancos centrais das maiores economias do mundo, que optaram
pela subida, moderada, de apenas 25 pontos-base, tal como o BCE.
As
reuniões da FED, do BCE (esta já explicitada) e do Banco do Japão (BoJ), três
dos quatro maiores bancos centrais do mundo (incluindo o Banco Popular da China).
Frankfurt subiu os juros em 25 pontos-base como o BCE, mas não houve mexida em
Washington e em Tóquio.
Mais
subidas foram decididas pelo Banco da Reserva do Zimbabué, pelo Banco Central
da República Argentina e pelo Banco Nacional da Sérvia. O Zimbabué lidera com a
taxa mais alta do Mundo, que subiu 1000 pontos-base, de 140% para 150%. A
segunda taxa mais elevada é a da Argentina, com 91%. A Sérvia subiu os juros em
25 pontos-base, ficando a taxa, agora, em 6,25%, abaixo dos juros em outras
economias emergentes do Leste, como as da Arménia, da Geórgia, da Moldávia, da Polónia
e da Roménia.
Mais quatro
bancos centrais decidiram não mexer nos juros: o da Índia, o do Peru, o da Polónia
e o da Rússia.
O
Banco da Reserva da Índia (RBI) optou por não mexer nos juros, estando já há
duas reuniões em pausa no ciclo de aumento dos juros. A taxa diretora está em
6,5% desde fevereiro, o nível mais elevado em quatro anos. Os economistas
indianos esperam que a pausa se mantenha até o RBI iniciar um processo de corte
dos juros, no primeiro trimestre do próximo ano.
Na
Rússia, com economia de guerra alimentada pela invasão da Ucrânia, há quatro
trimestres em recessão, o banco central decidiu manter os juros em 7,5%, nível
em que estão desde setembro de 2022. No entanto, na última reunião, os
governadores decidiram sinalizar a possibilidade de um regresso ao aumento dos
juros, face aos “riscos pró-inflacionistas” e “aos fortes impactos das tensões
geopolíticas”. Um dos impactos é o comportamento dos parceiros comerciais da
Rússia, que manifestam cada vez maior preocupação com sanções secundárias e com
os constrangimentos ao comércio com Moscovo. A comunicação do banco central não
refere, uma única vez, a guerra de invasão em curso, nem mesmo a expressão do
Kremlin “operação militar especial”.
No atinente
à Zona Euro e ao seu banco central, Christine Lagarde, que tem vincado a
relutância do BCE a antecipar qualquer pausa, foca-se no argumento de que não
há sinal claro de que a inflação subjacente (sem as componentes mais voláteis,
da energia e da alimentação) já tenha atingido o pico. Reiterou o argumento na
audição perante a Comissão de Assuntos Económicos e Monetários do Parlamento
Europeu (PE). A inflação subjacente desceu de 5,7%, em março, para 5,6%, em
abril, e para 5,3%, em maio. Mas a maioria dos membros do Conselho do BCE não
está convicta de que março tenha marcado o pico do ciclo inflacionista, nas
componentes não voláteis do índice de preços.
Com um
rol de níveis de inflação tão díspar na Zona Euro – que vai de 2,7%, na Bélgica,
a 12,3%, na Eslováquia, passando por 5,4%, em Portugal, segundo o Índice
Harmonizado de Preços no Consumidor, que é distinto do Índice de Preços no Consumidor (IPC), do Instituto Nacional de Estatística (INE) –, o BCE tem
de se revelar extramente cauteloso na monitorização da inflação.
O foco
no controlo da inflação ainda elevada (6,1%, em maio) tem levado a maioria do Conselho
do BCE a pensar que o que se passa, a nível da dinâmica de recuperação
económica, não é uma condicionante do aperto monetário, que se manterá, até
ficar em “terreno significativamente restritivo”. Com efeito, a revelação oficial
do Eurostat Resta revela que a economia da Zona Euro entrou em recessão
técnica, em termos globais e que a Alemanha, a maior economia, e a própria
Irlanda, o ‘tigre’ da região, com supercrescimentos até ao final do ano
passado, registam, também, dois trimestres consecutivos com queda do produto
interno bruto (PIB).
***
Segue, de vento em popa, a política monetária, mas as
economias enfraquecem e as famílias e as empresas veem as dificuldades a aumentar,
numa Europa dita dos cidadãos e das instituições!
2023.06.19 – Louro de Carvalho
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