De acordo com aquilo que noticiou o Financial Times, de 2 de dezembro, e com as declarações do
embaixador polaco na União Europeia (EU), Andrzej Sados, citado pela Reuters, os países da UE acordaram em
implementar, para entrar em vigor antes do dia 5 de dezembro, o teto máximo de
60 dólares (57 euros ao câmbio atual) por barril no crude russo, transportado
por via marítima, negociado a nível global. E, no dizer de Sados, este
mecanismo tem capacidade para manter o teto de preços pelo menos 5% abaixo do
valor de mercado.
A par desta medida, a 5 de fevereiro de 2023, ficarão
proibidas as importações de produtos refinados da Rússia.
Tudo isto se adiciona ao embargo parcial ao petróleo russo decertado
em junho pela UE, no quadro do sexto pacote de sanções.
O objetivo é limitar as receitas provenientes da venda de combustíveis
fósseis pela Rússia, retirando-lhe rendimento e prejudicando, também por esta
via, a sua capacidade de manter a guerra na Ucrânia.
A hipótese da tomada desta medida tinha sido avançada pelos
países Grupo dos Sete (G7), na
cimeira do passado mês de setembro, com o objetivo de reduzir os lucros obtidos pela Rússia, mas sem
correr o risco de haver um aumento generalizado dos preços do petróleo depois
da entrada em vigor do embargo europeu ao crude russo.
O G7 é o grupo dos países mais
industrializados do mundo – Alemanha, Canadá, Estados Unidos da América
(EUA), França, Itália, Japão e Reino Unido, mas em que
a UE está representada –, os quais constituem as sete economias mais
avançadas do mundo, segundo os critérios do Fundo Monetário Internacional
(FMI), pois representam mais de 64% da riqueza líquida global.
Em relação à medida agora acordada, havia no seio da UE, divergências
de fundo, que acabaram por ser ultrapassadas. Enquanto, inicialmente, a proposta
do teto máximo a estabelecer era 70 dólares, um grupo de países europeus exigia
um teto máximo de 30 dólares. E a Polónia, que se contava entre os países que
impediram que o acordo se realizasse mais cedo, pois o governo de Varsóvia também
exigia um preço muito mais baixo do que os 70 dólares, logrou a descida para os
60 dólares e, conseguiu, para lá desta medida, o compromisso por parte da
Comissão Europeia de começar a trabalhar num novo pacote de sanções à Rússia.
O teto ora acordado tem sido encarado como uma forma de
manter petróleo a circular nos mercados internacionais, sem provocar escassez
repentina, para não pôr
em causa o mercado energético internacional, e serve de referência para a Índia
e a China conseguirem negociar preços ainda mais baixos com a Rússia nas importações
de crude que fizerem com aquele país.
Os países
fora da UE poderão continuar a importar petróleo russo transportado por via
marítima, mas o acordo impõe uma série de proibições ao seu transporte e
comercialização, a não ser que seja vendido a um preço abaixo do teto fixado. E, apesar de compradores como a
Índia e a China não se terem comprometido a cumprir o limite aventado no G7,
este terá efeito nos importadores globais, na sua maioria garantidos por
instituições e segurados por seguradoras ocidentais.
Por sua vez, Moscovo declarou que não irá vender crude a
nenhum país que implemente este teto e que recorrerá a petroleiros que não
operam com seguros ocidentais.
***
Dizem os analistas que a medida ora tomada, na sequência da proposta do G7,
não constitui um limite, de facto, ao preço a que a Rússia pode vender o crude,
visto que pode continuar a colocá-lo no mercado internacional ao preço que
entender. É, porém, um limite aplicável às seguradoras e outras empresas
europeias que atuam no comércio global de petróleo e estão proibidas, a partir
de 5 de dezembro, de firmar novas transações que envolvam petróleo russo a mais
de 60 dólares por barril. Este preço-limite atuará em simultâneo com outra
medida anunciada há meses: o embargo europeu ao petróleo russo. O objetivo é pressionar
a Rússia, já que grande parte da compra e venda do seu crude tem como
compradores clientes europeus ou de outros mercados, mas sendo os negócios
segurados, muitas vezes, por empresas europeias.
Assim, desde 5 de dezembro, os Estados-membros da UE estão proibidos de
receber petróleo russo por via marítima. Todavia, vários países continuam a
receber crude russo por oleoduto, por não terem alternativa de abastecimento
por via marítima. E, a partir de 5 de fevereiro de 2023, a UE não receberá
produtos refinados russos, medida que pode ter implicações mais relevantes
(para a Europa e para a Rússia) do que o preço máximo ora acordado, pois este
embargo cobrirá 90% das exportações russas de petróleo e de produtos
petrolíferos para a Europa.
No respeitante ao limite de preço, que pretende baixar as receitas russas,
os 60 dólares por barril terão impacto reduzido, pois grande parte das
exportações russas de crude faz-se com um forte desconto face a produtos como o
Brent (referência na Europa) e o West
Texas Intermediate (referência nos EUA). Recentemente, a cotação do crude
dos Urais deslizou para menos de 60 dólares por barril, embora ainda muito
acima do custo de produção do petróleo russo. E Moscovo diz não aceitar verter
nas cláusulas dos novos contratos as limitações deste teto.
O investigador Simone Tagliapietra, do instituto Bruegel, citado pela Associated
Press (AP), admite que uma limitação de preço de 50 dólares já poderia ter
um impacto relevante nas contas russas, que precisam de vendas do crude na casa
dos 60 a 70 dólares por barril.
No que toca ao embargo à importação de crude por via marítima, a partir de
5 de dezembro, e de produtos petrolíferos refinados, a partir de 5 de fevereiro
de 2023, há também muita incerteza sobre o que sucederá. Com efeito, desde o
início da guerra, a Rússia mantém exportações para grandes consumidores como a
Índia e a China, mais confortáveis com a importação do crude russo a desconto
do que a Europa e os EUA. E Moscovo sinalizou a disposição de suspender as
exportações para alguns mercados, compensando a perda de volume exportado com
um aumento no preço de venda, devido ao facto de o mercado petrolífero global
ficar mais apertado.
Como nas demais sanções, o efeito destas é residual no destinatário-alvo, a
Rússia, que lá vai encontrando as suas vias de sustentação do seu comércio
externo, mas é desastroso para a UE, que vai somando à carestia dos géneros,
excessiva para o padrão de salários que se praticam nos países periféricos, a
dolorosa crise energética, pois ainda não encontrou vias de mercado mais
vantajosas em termos de fluência, de abundância e de preços. Além disso,
corre-se o risco de, também nestes capítulos, a UE prosseguir a várias
velocidades.
Este é um dos principais riscos do embargo petrolífero à Rússia. A Rússia é
o segundo maior produtor mundial de petróleo, com produção diária em cerca de
10 milhões de barris e com exportação de metade. A UE é cliente de referência
da Rússia, em especial no concernente ao gasóleo. O desenvolvimento do parque
automóvel, mais centrado nos motores a gasóleo, tornou a Europa mais dependente
do diesel, mas a capacidade de
refinação na Europa não basta para cobrir a procura deste combustível,
obrigando os seus países a importar crude e gasóleo russos. Com menos petróleo
e refinados da Rússia em circulação, as cotações dessas referências russas e
das dos restantes produtos (como o Brent) acabarão por subir. O banco de
investimento Goldman Sachs admite que o Brent, agora a cerca de 85 dólares por
barril, atinja 110 dólares por barril em 2023 (em março de 2022, após o início
da guerra, aproximou-se dos 130 dólares).
A Rússia exportará por navio para outros mercados parte da sua produção
petrolífera, substituindo outros fornecedores e libertando esses volumes para
os países que embargarem a produção russa.
Segundo a Comissão Europeia, em 2021, a UE importou 48 mil milhões de euros
em crude russo e 23 mil milhões de euros em produtos refinados. Mas, em 2022, os
produtos energéticos encareceram e as receitas russas aumentaram. Em outubro, o
CREA – Centre for Research on Energy and
Clean Air estimava que a Europa importava diariamente da Rússia 260 milhões
de euros em petróleo bruto, produtos petrolíferos, gás natural liquefeito e gás
por gasoduto. Assim, a Rússia terá faturado 243 mil milhões de euros (até 2 de
dezembro), dos quais mais de 122 mil milhões em compras de países da UE (54% em
produtos petrolíferos, 44% em gás e 2% em carvão). Por outro lado, o CREA
estima que a Europa esteja agora a pagar cerca de 300 milhões de euros por dia
pelos combustíveis importados à Rússia. Por países, a China é o maior comprador
de produtos petrolíferos russos, seguida da Holanda, da Índia, da Alemanha e da
Turquia. E a Itália e a Polónia são compradores de produtos petrolíferos russos
com alguma expressão. O petróleo e o gás representam cerca de 20% do Produto
Interno Bruto (PIB) da Rússia, tendo contribuído, em 2021, em 36% para as
receitas do Estado russo.
Segundo a Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), em 2020 e em 2021,
Portugal não importou petróleo bruto da Rússia, e a última vez que o fez foi em
2019, quando importou de lá 1,2 milhões de toneladas de crude (mais de 10% das
importações de petróleo desse ano, apenas atrás das de Angola e da Arábia
Saudita). Porém, a DGEG reporta para o ano 2021 a importação de 800 mil
toneladas de produtos petrolíferos intermédios oriundos da Rússia (num total de
importações de 1,35 milhões de toneladas), ficando a Rússia fora nas
importações portuguesas de gasóleo (1,5 milhões de toneladas em 2021), de
gasolina (202 mil toneladas) e de gás de petróleo liquefeito (652 mil
toneladas). E a GALP, que estava entre os clientes da Rússia em Portugal,
anunciou, após o início da guerra, que acabaria com as importações de produtos
petrolíferos da Rússia, mas ainda não há dados da DGEG para 2022 relativos às
origens do petróleo e refinados.
***
Afinal, o argumento europeu, a reboque dos EUA, para embargar os produtos
energéticos russos é o de privar Moscovo de relevante fonte de receitas. Mas a
sua eficácia é quase nula para Rússia. No entanto, é extramente gravosa para a UE,
a menos que pretenda ser um protetorado dos EUA, em nome dos valores do
Ocidente, que matam, geram a pobreza e albergam os agentes da exploração,
enquanto esquecem os genuínos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. É
o negócio das armas de guerra e do petróleo! É o dinheiro!
2022.12.02 – Louro de Carvalho
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