Está a chegar o inverno e as temperaturas oscilam, normalmente, entre os
-3 e -8 graus celsius no leste da Ucrânia (a área mais afetada pela guerra), o
que torna cada vez mais difícil a situação no país. Juntam-se, para o
sofrimento da população, aos males diretos da guerra o medo, a fome, as doenças
e o frio. Os ataques contínuos às infraestruturas civis deixam a população sem
água, sem eletricidade e sem aquecimento.
Segundo o jornal italiano La Republica, de 15 de dezembro, a Ação contra
a Fome, rede fundada na França por
Jacques Attali e Bernard-Henry Lévy, sustenta que uma Ucrânia onde
se estima que vivem hoje 35 milhões de pessoas, em comparação com os 44 milhões
do censo de 2021, tem 9,3 milhões que precisam de assistência alimentar (uma
em cada cinco pessoas), em particular no leste libertado após pesados bombardeios
(Kharkiv, Izyum e Donbass).
No décimo mês de bombardeios – nos edifícios, nas fábricas de alimentos, nas
lojas, nos centros de produção de energia – a situação tornou-se terrivelmente
instável e milhões de pessoas vivem abaixo da linha da pobreza, efeito
secundário e intencional da agressão de Vladimir Putin, que,
tendo ditado a exaustão da Ucrânia pelo inverno, rejeitou liminarmente qualquer
hipótese de tréguas na quadra natalícia. Além disto, outro fator agrava a situação alimentar,
a inflação, que atingiu 24,6% e que limita
severamente a capacidade de acesso aos alimentos.
“Com o inverno apenas a começar e com
os ataques contínuos às infraestruturas civis que deixam a população sem água,
eletricidade e aquecimento, as necessidades continuarão a aumentar e será
necessário sustentar, a longo prazo, as capacidades das organizações
humanitárias, não apenas na Ucrânia, mas também nos países
fronteiriços”, afirmou Simone Garroni, diretora da Ação Contra a Fome na Itália, que apelou a
todas as partes para que a fome não seja usada como arma de guerra,
questão prevista na resolução 2417 do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Desde o início do conflito, a Ação Contra a Fome presta assistência humanitária
a pessoas que ficaram na Ucrânia e a refugiados acolhidos
na Polónia, na
Roménia e na
Moldávia,
onde o contexto é particularmente crítico, devido ao peso que o acolhimento tem
na situação
interna. A organização atingiu mais de 350.000 pessoas. Nas
zonas diretamente atingidas pelos combates, a organização intervém sustentando
os comerciantes locais para reforço do acesso a bens essenciais,
distribuindo refeições quentes e itens de primeira necessidade e
sustentando o abastecimento de água potável e os serviços higiénicos com
a distribuição de kits e materiais
para sistemas de tratamento e de distribuição da água.
Através do seu sítio online, a Ação
Contra a Fome atualiza regularmente as informações relativas à situação no
terreno e à ação humanitária que vai desenvolvendo. É possível, não só
acompanhar o que está a acontecer, mas também fazer donativos para apoiar essa
ação.
Por seu turno, o Fundo das Nações Unidas para a
Infância (Unicef) recorda
que os contínuos
ataques às infraestruturas básicas de energia deixaram
quase todas as crianças – sete milhões, de oeste a leste – sem acesso constante
a eletricidade, aquecimento e água,
“expondo os menores a riscos cada vez maiores, à medida que as temperaturas
continuam a cair e o inverno encrudesce”. E explicita: “Sem eletricidade, as crianças não só enfrentarão
o frio
extremo quando no pleno do inverno cai abaixo de -20
graus, mas já hoje não podem realizar atividades de aprendizagem on-line, que para muitos representam o único acesso à educação, com tantas escolas danificadas ou destruídas. Além disso, as estruturas sanitárias poderão não conseguir fornecer
serviços básicos e o mau funcionamento dos sistemas de distribuição de água aumenta o risco de pneumonia, de gripe sazonal e doenças relacionadas com a água e com a covid-19.”
A diretora executiva, Catherine
Russuell relata: “Milhões de crianças estão a enfrentar um inverno triste,
encolhidas no frio e no escuro, sem nenhuma ideia de como ou quando algum
alívio poderá vir. Os menores estão impedidos da possibilidade de aprender ou de
ficar em contacto com amigos e familiares, expondo a um terrível risco a
sua saúde
física e mental.”
Nas áreas anteriormente atingidas por duros combates e que
voltaram a ser acessíveis – as províncias de Kharkiv, Kherson e Donetsk –, a Unicef começou
a distribuir kits de roupas de inverno, aquecedores de água e geradores,
comprou suprimentos para o inverno num valor superior a 20 milhões de dólares e
forneceu acesso e assistência de saúde a 4,9 milhões de crianças e mulheres.
A Unicef lançou, na semana de 4 a 10 de
dezembro, Apelo Anual de Ação Humanitária para as Crianças 2023, uma vez que precisa de 1,1 milhar de
milhão de dólares para atender às necessidades, imediatas e de longo prazo, de
9,4 milhões de pessoas, incluindo 4 milhões de crianças, que continuam a ser
profundamente afetadas pela guerra na Ucrânia.
Apesar de as regras da guerra serem claras, “as crianças e as
infraestruturas civis essenciais de que elas dependem para sobreviver devem ser
protegidas”. E, como defende a responsável da Unicef, em comunicado divulgado
a 14 de dezembro, é também essencial que a Unicef e os seus parceiros
humanitários tenham acesso rápido e sem entraves às crianças e às famílias que
necessitam de assistência humanitária, independentemente do local onde se
encontrem”.
O cenário, que já é muito negativo, ainda vai piorar, preveem as ONG e
também o Vaticano, que propõem algumas formas de ajuda.
Segundo o Departamento das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos
Humanitários (OCHA), o sistema energético ucraniano, em
28 de novembro passado, teve condições de atender apenas 70% do pico de demanda.
Ou seja, apesar dos esforços de reparações,
até ao fim de novembro o sistema energético ucraniano só respondeu a 70% das
necessidades energéticas.
De acordo com o OCHA, os ataques desencadeados em outubro “destruíram 40
por cento da capacidade de produção de energia da Ucrânia, expondo ainda mais as
famílias às duras condições atmosféricas, afetando os meios de subsistência e
aumentando a probabilidade de grandes movimentos populacionais adicionais”.
Também o Vaticano, através da Esmolaria Apostólica, procura ajudar a
população ucraniana, tendo lançado uma campanha de recolha de camisolas
térmicas e, simultaneamente, de angariação de fundos para aquisição de roupas e
geradores, que serão levados pelo próprio esmoleiro do Papa, o cardeal Konrad
Krajewski, até às regiões a atravessar maiores dificuldades.
“Nas minhas quatro viagens anteriores – diz o cardeal polaco num vídeo
divulgado pelo Vatican News – vi
o sofrimento das pessoas. Agora está frio, não há aquecimento, não há gás, não
há eletricidade, os ucranianos pediram-me camisolas térmicas”, uma boa forma de
enfrentar as baixas temperaturas. “Vamos dar este presente de Natal”, apela.
Para tanto, basta aceder à plataforma Eppela
(https://www.eppela.com/projects/9302) e definir o valor do contributo.
Este é o seu
convite para que o caminhão, com o material solicitado, chegue às cidades mais
em dificuldade como Kjiv, Zaporizhzhia, Odessa. Esta pode ser também uma forma
de responder ao apelo do Papa na audiência geral de 14 de dezembro, de passar “um Natal,
sim; em paz com o Senhor, sim, mas com os ucranianos nos nossos corações”.
Francisco desafiou todos a viver “um Natal mais humilde, com presentes mais
humildes” e a enviar o que for economizado para o povo ucraniano. “Façamos
algum gesto concreto por eles”, exortou.
Natal
verdadeiramente cristão, como diz Konrad Krajewski, é aquele que acolhe a
necessidade do outro, abraça o sofrimento e dá, mesmo que seja pouco, para o
aliviar. É com o espírito que o braço da caridade do Papa lança uma angariação
de fundos, através da plataforma Eppela,
para a compra de roupas térmicas a destinadas à população ucraniana. Nos últimos
dias, houve um convite para enviar ou levar ao Vaticano roupas para homens,
mulheres e crianças.
O cardeal Konrad
Krajewski, enviado várias vezes por Francisco à Ucrânia, fala de “uma resposta
muito generosa”, em especial do povo italiano, ao pedido de ajuda lançado.
Konrad Krajewski
garantiu que ele próprio levará o material recolhido ao país. Juntamente com as
camisetas térmicas, serão entregues alguns geradores de energia adquiridos e
doados para superar a falta de energia elétrica devido à guerra. Mas a entrega
não significa interrupção da coleta, aliás é preciso estar pronto para novas
necessidades, porque o inverno é longo e frio.
Há muito que
fazer, muito que apoiar. Toda a ajuda que esteja ao serviço da vida é bem-vinda.
2022.12.17 – Louro de Carvalho
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