Os eleitores da República Popular de Angola foram chamados às urnas, a
24 de agosto, a eleições
gerais, ou seja, para elegerem o Presidente da República e
os deputados à Assembleia Nacional, sendo o presidente em exercício João
Lourenço elegível para mais um mandato.
A Assembleia
Nacional é constituída por 220 deputados eleitos por dois métodos: a maior
parte, ou seja, 130 deputados são eleitos por representação proporcional em
lista fechada numa única circunscrição nacional, com assentos distribuídos
proporcionalmente; e 90 são eleitos em 18 círculos eleitorais de cinco lugares,
segundo o método de Hondt.
São eleitores
os cidadãos com, pelo menos, 18 anos de idade, não podendo votar quem tenha condenação
por falência, condenação criminal e dupla cidadania ou quem tenha sido
declarado portador de perturbações mentais. E os candidatos devem ter no mínimo
35 anos. Pela primeira vez, os angolanos residentes no estrangeiro puderam
exercer o direito de voto.
O Presidente,
nos termos da Constituição de 2010, é eleito por votação dupla simultânea, ou
seja, o eleitor, além do partido, escolhe o presidente e os deputados com um único
boletim de voto, em que figuram o partido e, claramente identificado no topo da
lista, o candidato à Presidência da República, sendo eleito presidente o principal
candidato do partido mais votado, o qual pode cumprir dois mandatos no máximo. De
acordo com a Constituição, o sistema político angolano é presidencialista:
o Presidente da República é chefe
do Governo, tem alguns poderes legislativos e nomeia os membros
do Supremo Tribunal, ficando a tripartição de poderes mitigada.
A jurisdição
constitucional em Angola nasceu com a Lei Constitucional de 1992, que
consagrou, nos artigos 134.º e 135.º, o Tribunal Constitucional (TC) como
instituição judicial à qual competia, em geral, administrar a justiça em
matérias de natureza jurídico-constitucional.
Enquanto não
foi institucionalizado o TC, as competências que a Lei Constitucional lhe
reservava foram exercidas, de 1992 a 2008, pelo Supremo Tribunal, conforme
disposto no artigo 5.º da sua Lei Preambular. Com a aprovação da Lei n.º 2/08,
de 17 de junho – Lei Orgânica do Tribunal Constitucional e da Lei n.º 3/08, de
17 de junho – Lei Orgânica do Processo Constitucional, ficaram reunidos os
pressupostos legais para a criação do TC. Assim, a 25 de junho de 2008, foi
institucionalizado o TC, tendo os seus Juízes Conselheiros tomado
posse perante o Presidente da República.
Eram sete Juízes Conselheiros, quatro homens e três mulheres.
***
Nas eleições de 2017, venceu de forma esmagadora o Movimento
Popular de Libertação de Angola (MPLA), tendo obtido 61% dos votos, embora o
partido tenha perdido 25 assentos. Não obstante, manteve a maioria na
Assembleia Nacional, garantindo 150 assentos. O maior partido da oposição, a União
Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), ganhou 51 lugares, acrescentando
19 novos assentos com um total de 26% dos votos. A Convergência Ampla de Salvação
de Angola – Coligação Eleitoral (CASA-CE) 16 assentos, o Partido de
Renovação Social (PRS) dois e a Frente Nacional de Libertação de
Angola (FNLA) um.
No dia 5 de
outubro de 2021, os partidos de oposição UNITA, Bloco Democrático e PRA JÁ
Servir Angola anunciaram, em conferência de imprensa do porta-voz do grupo
Amândio Capoco, a formação da coligação denominada Frente Patriótica Unida (FPU)
e anunciaram Adalberto Costa Júnior da UNITA como candidato da FPU para
desafiar João Lourenço. Capoco descreveu a FPU como “aliança de angolanos
ansiosos por mudanças”. Costa Júnior disponibilizou-se para desafiar João
Lourenço, declarando que “a nossa pátria clama por mudanças” e descrevendo o
país como “assolado pelo desespero e pelo empobrecimento”.
Contudo, em
março de 2022, a FPU não pôde inscrever-se como coligação por não cumprimento
de requisitos eleitorais, embora continuasse como plataforma oposicionista para
a campanha eleitoral. Os membros dos partidos Bloco Democrático e PRA
JA-Servir Angola optaram por se inscrever na lista da UNITA, ficando fora da
eleição.
Assim,
concorreram às eleições o MPLA, tendo como candidato principal o Presidente João
Lourenço; a UNITA, encabeçada por Adalberto Costa Júnior; CASA-CE, encabeçada por Manuel
Fernandes; a FRS, encabeçada por Benedito Daniel; a FNLA, encabeçada por NimiA
Simbi; a Aliança Patriótica Nacional (APN), encabeçada por Quintino Moreira; o Partido
Nacionalista para a Justiça em Angola (P-NJANGO), encabeçado por Dinho Chingunji; e o Partido Humanista de Angola
(PHA), encabeçado por Florbela Malaquias.
A campanha
foi ofuscada pela morte do ex-presidente José Eduardo dos Santos no dia
8 de julho, sendo que alguns acusavam o MPLA de querer utilizar este óbito, que
merece funeral de Estado, de aproveitamento político-partidário. E a situação
arrastou-se, devido ao desentendimento entre os membros da família Dos Santos e
a viúva e o governo acerca do sepultamento.
Apesar do
clima de crispação, a campanha ficou marcada pela participação dos líderes dos
três principais partidos (MPLA, UNITA e CASA-CE) num culto ecuménico, no
domingo anterior às eleições, pela primeira vez. E o MPLA indicou, pela
primeira vez, uma mulher, Esperança da Costa, como vice-cabeça de lista
nacional.
As
eleições de 24 de agosto decorreram com normalidade, sem incidentes especiais,
tendo a Comissão
Nacional Eleitoral (CNE) salientado o civismo e a maturidade do povo angolano e
os observadores sublinhado a regularidade dos procedimentos, negando qualquer irregularidade
e desvalorizando pequenos factos, como atraso na abertura de algumas secções de
voto e filas, o que é usual em qualquer país. Não houve irregularidades nos processos de voto e de
contagem.
Não
havia resultados definitivos, nem provisórios totais, no dia 25, pois a contagem
dos votos prosseguia. Não obstante, a CNE atualizava os resultados: o MPLA, que governa o país desde a independência em 1975, mantinha vantagem com 52,08% das votações, seguido da UNITA com 42,98%,
estando escrutinados 86,41% dos votos. Por outro lado, a UNITA vencia em Luanda. Estes dados mostram a
bipolarização do país e a grande diferença entre as zonas rurais e as áreas
urbanas. Com efeito, segundo os primeiros dados revelados, durante a noite de 24 para 25, por
Lucas Quilundo, porta-voz da CNE, o MPLA
tinha 60,65%, seguindo-se a UNITA com 33,85%. Entretanto os resultados foram atualizados: com o MPLA a descer,
mas a manter vantagem com 52,08% das votações, seguido da UNITA, que subia para
42,98%, quando estavam escrutinados 86,41% dos votos das eleições gerais.
O MPLA, através do seu vice-presidente do grupo parlamentar, João Pinto, em declarações à agência Lusa, remetia qualquer
diferendo eleitoral para os tribunais e, num recado à oposição,
sustentava que “não basta querer
alternância, é preciso transmitir confiança”. Apelando a que se
esperasse serenamente pelos resultados definitivos da CNE, “como já
tem sido tradição em Angola”, afirmava que a litigância ou o litígio se faz nos
tribunais. Vincava que, “num Estado de Direito democrático, as instituições que
divulgam os resultados eleitorais são as instituições constitucionalmente
competentes”. E, observando que, para lá do desejo de alternância, é preciso
transmitir confiança, disse que esse é o problema da oposição, sobretudo da
UNITA, que “não tem a cultura de aceitar em primeira mão os resultados, ainda
que provisórios, e felicitar quem venceu”, usando a narrativa de vitimização,
com excessivo entusiasmo, sem ter em conta que os resultados não dependem só da
vontade dos candidatos.
A UNITA, através de Abel Chivukuvuku, número dois da sua lista, alegava estar
na dianteira quanto ao apuramento dos votos, realçando a sua vitória em Luanda e,
provavelmente, na esmagadora maioria dos círculos eleitorais na diáspora.
O porta-voz do partido do galo negro frisava que
os seus centros de escrutínio davam
claros indicadores da tendência de vitória da UNITA em todo o país. Um dos
factos mais preponderantes era que na cidade de Luanda e na Província de
Luanda, só no município de Quiçama o MPLA tinha vantagem, enquanto em todos os
outros municípios a UNITA tinha clara vantagem eleitoral. Outro indicador era
de que na diáspora, em todos os países onde foi executado o voto dos angolanos
residentes no estrangeiro, só em Berlim (Alemanha) e Joanesburgo (África do Sul)
era onde o partido no poder tinha vantagem. E finalizava dizendo que “somos
todos angolanos, somos todos atores da história de Angola, temos todos
interesse que tudo corra bem”.
De notar
que, segundo a CNE, com 77,12% dos
votos apurados na Província de Luanda, a UNITA liderava com 62,93% dos
votos e o MPLA seguia em segunda posição com 33,06%.
Na Huíla, segunda província mais populosa, o MPLA dominava com 67,51% dos
votos, enquanto a UNITA não ultrapassa
30%, com mais de 88% dos resultados apurados. Ora, com 97% dos votos contabilizados,
MPLA vence com 51,7% (124 deputados), conseguindo maioria absoluta, e UNITA
fica com 44,05% (94 deputados). Os outos seis deputados são distribuídos por três
partidos (dois para cada um), que são por ordem decrescente de votos: a FRS, a FNLA
e o PHA.
A UNITA admitia impugnar o resultado das eleições, a
confirmar-se a vitória do MPLA.
Por sua vez, o MPLA lamenta a perda de Luanda, mas sente folga na maioria absoluta
para governar. Não há alternância no poder, mas a situação na Província de
Luanda complica a ação do MPLA. Não se preveem tumultos, mas espera-se luta
contra a pobreza e pelo desenvolvimento sustentável.
2022.08.25 – Louro de
Carvalho
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