Os dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), a 30 de janeiro,
mostram que a economia portuguesa cresceu 2,3%, em 2023, abrandando face ao
crescimento homólogo de 6,8% registado em 2022. Todavia, este valor percentual
em relação ao produto interno bruto (PIB) é maior do que o estimado pelo
governo, que era de 2,2% – em todo o caso, mais de quatro vezes superior ao da Zona Euro
e ao da União Europeia (UE).
É oportuno anotar que o crescimento registado em 2022 foi o mais elevado
desde 1987 e que a desaceleração explicada é, em parte, pela desaceleração do
comércio internacional (quer das exportações, quer das importações) e da
procura interna.
Se, no total do ano houve, um abrandamento, o mesmo não aconteceu no último
trimestre, onde a primeira estimativa do INE aponta para um crescimento homólogo
do PIB de 2,2%, uma aceleração face aos 1,9% do terceiro trimestre.
Efetivamente, no quarto trimestre, “o contributo da procura interna para a
variação homóloga do PIB manteve-se elevado”, tendo sido registada “uma
aceleração do consumo privado e uma desaceleração do investimento”.
“O contributo da procura externa líquida para a variação homóloga do PIB
passou a positivo, tendo as exportações de bens e serviços em volume
apresentado um crescimento mais intenso que as importações”, indica ainda o
INE.
Após um recuo de 0,2%, no terceiro trimestre, em cadeia (isto é, em
comparação com o trimestre anterior), o PIB voltou a crescer no final do ano,
mais precisamente 0,8%. Desta forma, Portugal evitou a recessão técnica, que se
verifica, se a economia cai por dois trimestres consecutivos.
Na variação em cadeia, o contributo da procura interna aumentou, a reboque
do consumo privado, “enquanto o contributo da procura externa líquida foi menos
negativo”.
No entanto, o governo, na proposta do Orçamento do Estado para 2024, previa
um crescimento de 2,2% do PIB, em 2023, quando o Banco de Portugal (BdP), ainda
mais pessimista, previa um aumento de 2,1%.
No âmbito do comércio internacional, a estimativa rápida do INE aponta para
uma queda de 1,9%, nas exportações, e de 5,4%, nas importações, nos últimos
três meses do ano. “O decréscimo nas transações de bens ocorre pelo terceiro
trimestre consecutivo, mas sendo menos acentuado do que no trimestre anterior,
em que se registaram variações homólogas de -8,7%, nas exportações, e -12,4%,
nas importações”, refere o nosso gabinete estatístico.
Paralelamente, os dados do Gabinete
de Estatísticas da União Europeia (Eurostat) revelam que as economias da
Zona Euro e da UE tiveram, em 2023, um crescimento homólogo de 0,5% cada. Entre
os 12 Estados-membros para os quais há dados disponíveis, a economia portuguesa
foi a que apresentou o maior avanço homólogo (2,2%), no quarto trimestre, e
também em cadeia (0,8%).
Entre
outubro e dezembro, o PIB, nos países da área do euro, avançou 0,1%, quando
comparado com o mesmo período de 2022, e o do conjunto dos 27 Estados-membros
cresceu 0,2%.
Em
ambas as zonas, de acordo com o serviço estatístico europeu, o PIB manteve-se
estável na variação em cadeia.
***
Por
sua vez, a World Economic Outlook (WEO),
Perspetivas Económicas Mundiais, do Fundo
Mundial Internacional (FMI) revê em
baixa previsões de crescimento da Zona Euro para 0,9%, em 2024, em virtude dos
impactos da guerra na Ucrânia, mas prevê uma recuperação impulsionada
pelo consumo das famílias. E o PIB mundial deve voltar a crescer 3,1%.
Na WEO para 2024, pode ler-se que “a
moderação e o crescimento constante abrem caminho para uma aterragem suave”.
E o
parâmetro “descrição” refere: “Prevê-se que o crescimento global se mantenha
nos 3,1%, em 2024, e aumente para 3,2%, em 2025. As taxas elevadas do banco
central, para combater a inflação, e a retirada do apoio fiscal, num contexto
de dívida elevada, pesam sobre a atividade económica. A inflação está a
cair mais rapidamente do que o esperado, na maioria das regiões, num contexto
de resolução de questões do lado da oferta e de uma política monetária
restritiva. A inflação global deverá cair para 5,8%, em 2024, e 4,4%, em
2025, tendo a previsão para 2025 sido revista em baixa.
O FMI está, pois, mais pessimista, quanto à evolução económica da
Zona Euro, revendo em baixa as previsões de crescimento para
0,9%, em 2024, e 1,7%, em 2025. O crescimento será comedido em algumas das
principais economias europeias, devendo que a Alemanha crescer apenas 0,5%.
Já a
economia mundial deverá crescer 3,1% este ano, o mesmo ritmo de 2023, num
contexto em que a inflação está a cair mais rápido do que o esperado.
A
revisão em baixa para a Zona Euro deveu-se “em grande parte” ao “resultado
mais fraco do que o esperado para 2023”, que dá menos impulso à atividade
económica, lê-se na atualização ao WEO. O FMI estima agora que o crescimento “deverá recuperar da
baixa taxa de cerca de 0,5%, em 2023, que refletiu uma exposição relativamente
elevada à guerra na Ucrânia, para 0,9% em 2024, e 1,7%, em 2025”. “O consumo mais forte das famílias, à medida que os efeitos do choque energético nos preços
diminuem e a inflação cai, apoiando o crescimento do rendimento real, deverá
impulsionar a recuperação“, explica a instituição.
Olhando
para os países da Zona Euro para os quais há previsões, destaca-se a Alemanha.
Conhecida como o “motor” da economia europeia, está ainda a recuperar dos impactos
da guerra na Ucrânia e da subida dos preços na energia, pelo que as estimativas
do FMI foram revistas em baixa para um crescimento de 0,5%, em 2024, após uma
contração de 0,3%, em 2023.
Já
França deverá crescer 0,7%, tanto em 2023 como em 2024, enquanto a economia
espanhola vai abrandar de 2,4% para 1,5%, neste ano.
Num
contexto geral, a instituição prevê que a economia mundial cresça
3,1%, tanto em 2023 como em 2024. Em comparação
com as previsões de outubro de 2023, “a previsão para 2024 é cerca de 0,2
pontos percentuais mais alta, refletindo atualizações para a China, Para os
Estados Unidos da América (EUA), para os grandes mercados emergentes e para as economias
em desenvolvimento”. Já o crescimento das economias
desenvolvidas deve abrandar de 1,6%, em 2023,
para 1,5%, neste ano.
O FMI
prevê que, de forma global, a inflação caia de forma estável para se aproximar
da meta dos 2%. A taxa global abranda de 6,8% para 5,8%, neste ano, devendo as economias desenvolvidas ver
desinflação mais rápida: a taxa cai dois pontos percentuais, em 2024, para 2,6%. Mesmo
assim, cerca de 80% das economias do Mundo vão registar uma inflação mais baixa,
neste ano.
Diferem
consoante o país os fatores que impulsionam a descida da inflação, mas,
geralmente, refletem uma mais baixa inflação
subjacente (que mede a evolução de um cabaz de bens e serviços com
mudanças menos frequentes – excluindo bens energéticos e produtos alimentares
não transformados – e com oscilações menos pronunciadas de preço), em resultado de políticas
monetárias ainda restritivas, de um abrandamento
relacionado nos mercados laborais e de efeitos de repercussão de quedas
anteriores e em curso nos preços relativos da energia.
Existe,
apesar de tudo, alguma incerteza, em relação à evolução dos preços, que
apresenta riscos tanto negativos como positivos. Por um lado, uma desinflação
mais rápida poderia levar a uma flexibilização das condições financeiras, podendo
“uma política orçamental mais solta do que o necessário e do que o assumido nas
projeções” implicar “um crescimento
temporariamente mais elevado, mas sob o risco de um ajuste mais oneroso
posteriormente”. Por outro lado, “novos picos nos preços das
matérias-primas devido a choques geopolíticos – incluindo a continuação de
ataques no Mar Vermelho – e interrupções no fornecimento ou uma inflação
subjacente mais persistente podem prolongar o aperto das condições monetárias”.
***
No atinente ao défice e ao excedente, é de
notar que, segundo os dados do Eurostat, divulgados a 22 de janeiro, Portugal registou o segundo maior
excedente orçamental, no terceiro trimestre de 2023, de 2,5% do PIB, depois da
Dinamarca (2,7%) e seguido pela Croácia (2,2%), no quadro do recuo, para 2,8%,
dos défices da Zona Euro e da UE.
Nos
20 países da área do euro, o défice de 2,8% do PIB recuou, quer face ao de 4,0%,
do trimestre homólogo, quer comparando com o de 3,0%, registado entre abril e
junho de 2023.
No
conjunto dos 27 Estados-membros, a comparação é com um défice de 3,5% no
terceiro trimestre de 2022 e com o de 3,0% na comparação trimestral.
Segundo
os dados do serviço estatístico da UE, Portugal registou o segundo maior
excedente orçamental no terceiro trimestre de 2023, de 2,5% do PIB, depois da
Dinamarca (2,7%) e seguido pela Croácia (2,2%). E os défices mais elevados, por
seu lado, observaram-se na Eslováquia (-7,0%), seguida da Bulgária (-6,6%) e
Hungria (-5,7%).
***
O crescimento da economia e a estratégia de gestão
poderão levar o rácio da dívida pública a rondar os 100% do PIB, em 2023, a
rondar os 100,2% registados em 2010 e abaixo da meta prevista no Orçamento do Estado
para 2024 (OE2024), que apontava para um rácio de 103%.
Os números significam a consolidação da trajetória de
redução do peso da dívida registada nos últimos anos e a aproximação antecipada
da meta de 98,9%, projetada para 2024. Já, em 2022, o rácio da dívida pública
caiu para 112,4% do PIB.
“É claramente possível [tocar em 2023 a meta de 100%]”,
considera o coordenador do NECEP – Católica-Lisbon Forecasting Lab, João Borges
de Assunção, apontando o efeito positivo combinado de um crescimento nominal da
economia acima do normal, devido à inflação e ao bom desempenho real da
economia em 2023. A este cenário junta os resultados das elevadas receitas
fiscais que beneficiaram de efeitos nominais significativos.
Pedro Braz Teixeira, diretor do gabinete de estudos do
Fórum para a Competitividade, considera que, dado que, com a execução melhor do
que a estimada no relatório do OE2024, “é muito provável que seja possível
ficar abaixo dos 103% do PIB, embora seja menos seguro que se consiga ficar
abaixo da marca simbólica dos 100% do PIB”. “Aliás, os dados do PIB do quarto
trimestre, muito acima do esperado, reforçam a ideia de ser possível um bom
resultado para as contas públicas, quer no défice quer na dívida”, observa.
No final de 2023, o ministro das Finanças montou uma
operação especial, que incluiu a recompra de títulos de dívida pública a privados,
a seguradoras e a bancos e o pagamento antecipado de dívida das empresas
públicas, para fechar o ano com o rácio abaixo dos 100%. Porém, os economistas
dizem que a recompra tem um efeito pontual. Na verdade, tem a vantagem de
conseguir fazer descer o rácio, sem ser necessário cortar na despesa ou
aumentar impostos, mas é uma medida de gestão de tesouraria, que não altera a
dívida líquida. No entanto, se a taxa de aplicação que o Estado deixa de
receber pelo depósito que tem parqueado for mais baixa do que a taxa marginal
de endividamento, até pode trazer algum ganho financeiro.
***
Pelos vistos, embora a taxa de desemprego se mantenha
nos 6,6% e a inflação esteja em 2,3%, será descabido o discurso miserabilista que
por aí se ouve. Todavia, embandeirar em arco é imprudência e manifestação de arrogância,
o que é, por vezes, tentador.
2024.01.31 – Louro de Carvalho
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