O Ministério
da Educação (ME) vai criar conselhos locais de diretores, que decidirão a
colocação de professores. Diretores de escolas/agrupamentos de escolas criticam
e lamentam não terem sido ouvidos. E os sindicatos dos professores discordam,
mas por motivos diferentes.
Ao falarmos de
professores neste contexto, referimo-nos a educadores de infância, a
professores do ensino básico (1.º, 2.º e terceiro ciclos) e a do ensino
secundário, ou seja, aos abrangidos pelo Estatuto
da Carreira Docente (ECD), que não os do ensino superior.
Recentemente,
o ministro da Educação reuniu com os sindicatos de professores, que estão contra
a proposta do novo modelo de contratação de docentes, pois está em causa a
passagem dos quadros de escola ou e agrupamento, providos por concurso
nacional, a listas municipais e a decisão da escolha dos professores por
conselhos locais de diretores.
Filinto
Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas
Públicas (ANDAEP), lamenta que os diretores não tenham sido ouvidos, pelo que a
ANDAEP pediu audiência ao Ministro para tratar deste e de outros assuntos que os
preocupam.
No atinente
à medida, Filinto Lima vê com bons olhos a possibilidade de as escolas escolherem
“alguns dos seus professores”, sustentando que este não deve ser tema “tabu,
como pretendem alguns sindicatos”, que não deve ser posta em causa a boa-fé dos
líderes das escolas e das suas equipas. Com efeito, pensa que a tutela criará “regras
de escolha de professores pelas escolas cujos critérios ajudem a adequar o
projeto educativo ao perfil do professor”.
Às críticas
de sindicatos que temem o recurso à “cunha”, o presidente da ANDAEP lamenta “a
forma como tratam os diretores e as equipas diretivas, que também são
professores, pois em vez de os defenderem duvidam da capacidade de liderança,
colocam em causa a idoneidade de profissionais de excelência”, alguns até sócios
de sindicatos. Todavia, entende que não se deverá atribuir a um conselho local
de diretores a tarefa que julga ser de cada escola.
Por sua vez,
Arlindo Ferreira, diretor do Agrupamento de Escolas Cego do Maio e autor do
blogue ArLindo, afirma a legitimidade dos receios de favoritismos, salientando:
“No curto tempo da nossa democracia, ainda se verifica que a cunha é um enorme
fator de compensação, porque não existem muitos mecanismos que a impeçam. E é o
próprio poder político que continua a dar o exemplo de que a cunha é algo tão
natural que é normal os docentes temerem essa possibilidade.”
Desconhecendo
como se fará a transferência para os conselhos locais de diretores, discorda da
contratação descentralizada, porque a história da Bolsa de Contratação de
Escola (BCE) revelou os erros desse tipo de contratação, fazendo com que um
professor ficasse colocado em inúmeras escolas e, como só poderia aceitar uma,
atrasava todo o processo de colocações.
O fim da
BCE, anunciado em 2016, deu lugar à Reserva de Recrutamento (RR), que se mantém
e se baseia numa lista nacional de graduação profissional para colocar os docentes.
E Arlindo Ferreira frisa que o concurso deve continuar centralizado, pelo
critério da graduação profissional, que é o mais justo e o que os professores e
as escolas aceitam com facilidade. Contudo, admite que a escola possa ter uma certa
margem, mas curta e residual, para contratar alguns professores em casos
devidamente justificados, em que o perfil do professor seja adequado ao projeto
específico a desenvolver ou em desenvolvimento.
Luís
Sottomaior Braga, professor de História e especializado em gestão e
administração, diz estar em vigor um sistema de contratação transparente, ao
passo que o proposto aumentará a litigância e os problemas de tipo corruptivo,
por ser opaco e propenso à intervenção humana de favorecimento. Refere que, nas
escolas onde foi diretor preferiu sempre o sistema de graduação, simples e
eficaz para os curtos tempos de seleção e com as virtudes da transparência e declareza.
O agora subdiretor do Agrupamento de Escolas da Abelheira, em Viana do Castelo,
mostra-se contra a proposta do ME, afirmando tratar-se de “reformismo”, que não
passa de “subversão dogmática de um instrumento de política pública que prestou
bons serviços ao país durante décadas e com o pano de fundo de visar atacar
direitos legítimos dos professores”.
Além disso, sublinha
que o novo modelo exercitará o dogma da municipalização, “que se vê falhar
todos os dias”, e que a atribuição da gestão das mobilidades de pessoal docente
a um inventado conselho local de diretores “é uma medida péssima, que só quem
conhece mal a história do sistema de ensino e de colocação de professores acha
possível”. Por outro lado, diz que o governo está a pensar num mecanismo
facilitador da desorçamentação, que é a sua linha política na gestão da educação,
em que só há dinheiro para despesa, se esta couber nos fundos comunitários.
Relembra o “falhanço”
da BCE: “As colocações em oferta de escola e a chamada BCE, no passado, quando
se afastaram os critérios de graduação, deram origem a muitos casos de
preferências ilegítimas e ilegais. Chegou a ser critério para escolher um
professor o sítio onde morava.” E não crê necessárias alterações ao modelo de seleção
de professores, mostrando-se apenas satisfeito com a redução de Quadros de Zona
Pedagógica (QZP), proposta pelo ME.
***
A FNE, em resposta
ao desafio da tutela, fez chegar ao ME um conjunto de contrapropostas, que dizem
respeito à operacionalização do novo regime de seleção e recrutamento de
docentes, que garanta a total clareza do processo e uma negociação consistente
e clara. É, pois, indispensável que, em resultado deste processo, se atinja um
regime em que os educadores e professores depositem confiança, por ser
objetivo, transparente, justo e equilibrado. Porém, a proposta do ME é genérica
e não clarifica nem densifica, de forma consistente, as designações sugeridas
para os mapas de docentes, gera confusão e pode criar a conceção de que se
trata de um novo paradigma.
Sobre estrito
o regime de concursos, a
FNE quer garantida, além de outros pontos, a correta dimensão dos quadros de
escola/agrupamento de escola, para o que é necessário identificar as reais
necessidades de cada escola, em termos das respostas de cada uma aos níveis de
educação, ensino e formação que oferece. O apuramento destas necessidades permanentes, que determinam a nova
composição dos quadros (ou mapas) dos agrupamentos de escola/escolas, é catalogado como “crítico e decisivo”,
pois neles residirá um dos pontos fulcrais da qualidade da intervenção
legislativa. Por isso, a FNE propõe o envolvimento dos órgãos da escola, como o
Conselho Geral e o Conselho Pedagógico, em tal apuramento.
Segundo a
FNE, os concursos internos de
periodicidade quinquenal não contribuirão para maior estabilidade e
bem-estar do corpo docente e podem ser fator de desmotivação e mal-estar dos
docentes que obtenham colocações, por os afastar das residências e das famílias,
por um longo período de tempo, sem possibilidade concursal de aproximação.
Ao invés da
FNE, discordo da extinção de
lugares do mapa após três anos de Destacamento por ausência de componente letiva
(DACL), por nefasta. Os docentes não podem ser obrigados a concorrer,
por extinção do lugar, para lá do concelho a que pertence o respetivo agrupamento.
A acontecer,
o dimensionamento dos Mapas
Docentes Interconcelhios (MDI) deve ter em conta o seu caráter meramente
supletivo, com o objetivo de suprir necessidades eventuais do sistema
educativo, tendo em linha de conta a previsibilidade de necessidades de caráter
transitório.
O respeito pela graduação profissional (lista
graduada) nacional, em todas as etapas concursais, continua a ser um dos
pontos de honra da FNE. Por isso, o preenchimento dos lugares dos MDI tem de
ser sempre realizado por concurso nacional e com respeito pela lista graduada
nacional.
Além disso,
a FNE exige: adequada composição
geográfica MDI, para promover a estabilidade; e não entrega do processo de afetação de docentes do MDI
para o preenchimento de necessidades transitórias a um Conselho Local de Diretores de
Agrupamentos de Escola.
***
Após reunir
com o ME, o secretário-geral da Federação Nacional de Professores (FENPROF), criticou
o modelo apresentado, dizendo ser o “início de um processo de municipalização
das colocações de professores”, que pretende “acabar com a mobilidade interna”,
mecanismo que permite que se possa aproximar de casa quem trabalha a centenas
de quilómetros.
Entretanto, como
o primeiro-Ministro
afirmou confiar num acordo com os sindicatos para acabar com os professores de
casa às costas, a FENPROF, tendo em conta os últimos desenvolvimentos, diz não
ter a confiança que o primeiro-ministro afirma ter.
A FENPROF discorda
da substituição dos quadros por mapas de pessoal em clara violação do
disposto no ECD; discorda de
serem os diretores a decidir a alocação de professores às
escolas; considera negativa a eliminação da mobilidade interna;
discorda da
criação de zonas coincidentes com as das entidades intermunicipais
(comunidades e áreas metropolitanas); diverge do ME em relação à
relevância da graduação profissional, vincando que, não sendo critério
perfeito, é, de todos, o menos imperfeito para a colocação em todas as fases e
modalidades do concurso; e não concorda com mecanismos que impedem
os professores dos quadros de se aproximarem da área de
residência, impondo-lhes “a casa às costas” a dezenas ou centenas de
quilómetros, por não lhes serem facultados os lugares disponíveis.
O ME quer
substituir o direito de os professores aproximarem a colocação, por concurso,
da área da residência pelo dever de adquirirem residência no local onde são
colocados, o que é inaceitável até porque aos docentes colocados longe da
residência familiar, não é atribuído suplemento para se fixarem, deslocarem a
família e iniciarem nova vida, tendo maior parte deles mais de 40 anos.
A vingar a proposta de acabar
com os professores de “casa às costas”, milhares de
professores ficariam em eterno desterro e estaria dado o primeiro
passo na sujeição das colocações aos critérios de diretores e
ao curso da municipalização.
***
Por mim, professor aposentado,
reitero a minha discordância da municipalização da educação, que não passa de
mais um setor em que o município exercerá o seu poder, sendo legítimos todos os
meios, ou será forma de privatização do ensino pela via da concessão a
privados. E devo frisar que a colocação dos professores, que sempre foi dada
como não sendo competência do poder local, a sê-lo-á, não da câmara, mas dos
diretores, cuja designação reflete, quase sempre, a vontade da câmara. Era de
esperar: quem manda controla os principais atores da atividade em causa.
2022.11.29 – Louro de Carvalho
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