Em sintonia ou em protesto, no decurso da 27.ª
Cimeira das Nações Unidas pelo Clima (COP27), houve manifestações de
ambientalistas e de estudantes um pouco por todo o mundo. Portugal não foi
exceção e o que saltou para a ribalta pública foi a ocupação, não só das ruas, mas
também de algumas escolas secundárias, de uma escola artística, de algumas faculdades
e da sede da Ordem dos Contabilistas Certificados, tendo alguns ativistas sido
detidos pela polícia, que poderão estar a contas com a Justiça, por alegados excessos,
nomeadamente na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e no edifício do Ministério
da Economia.
Os protestos e as exigências aos governos – para que
façam tudo para travar o aquecimento global, a emissão de CO2 (dióxido
de carbono), os ataques à biodiversidade e à diminuição drástica dos
combustíveis fósseis – são legítimos e mais do que justos. E é bom que sirvam
de alerta para a responsabilidade de todos na educação ambiental e no cultivo
das práticas amigas do ambiente, o que passa pelos decisores políticos, pelos
agentes económicos, pelas escolas e outros espaços de formação, bem como por
todos os cidadãos, considerados individualmente ou em grupo.
Não obstante, não é positivo atirar a toalha ao
chão por não termos à espera um futuro risonho. Não devem os adultos e os
jovens deixar de apostar na educação e na formação, que são, além da construção
harmónica da personalidade, ferramentas necessárias para a intervenção social e
para a capacitação no mundo académico e cultural e no mundo do trabalho.
Também não parece adequado ter como alvo um determinado
membro do governo, que nem é o responsável pela pasta do Ambiente. Teve, no
passado, relevante papel nos negócios do petróleo, mas hoje está alinhado com
todo o Programa do Governo. Quanto ao passado, é de lembrar que o petróleo e produtos
afins foram notáveis fatores do progresso, tal como o carvão e o aço, cuja promoção
e preservação negocial foram objeto do agrupamento de Estados de que veio a
resultar a União Europeia (UE).
O problema não se resolve de repente, nem com a
abolição total de nenhum dos produtos em equação negativa, no horizonte
temporal de 10 a 15 anos, mas com a sua redução drástica e a busca de alternativas,
muitas e diversificadas. E não vá o diabo tecê-las, pondo-nos a protestar e, ao
memso tempo, a usar os meios que vamos condenando, tal como sucedia com muitos manifestantes
por Timor- Leste e contra a Indonésia, envergando a T-shirt “Made in Indonesia”.
***
Todavia, nem
só o ambiente é fonte de preocupação planetária. Se apenas por volta do ano 1800
se chegou aos primeiros mil milhões de pessoas, a partir daí o crescimento
populacional foi cada vez mais célere. Hoje o planeta atinge o marco dos oito
mil milhões de habitantes. Perante uma Europa cansada e velha, sobressaem a Ásia
e a África como os continentes que mais contribuem.
Prevê-se, que
o mundo se abeire dos dez mil milhões até 2050 e que atinja, em 2080, o pico de
dez mil e quatrocentos milhões de pessoas, número que se estima que se mantenha
até 2100. Segundo as Nações Unidas, a população mais do que triplicou entre
1950 e 2020. No entanto, já não está a crescer ao mesmo ritmo. Aumenta a ritmo
mais lento desde os anos 1950, tendo descido para menos de 1% por ano em 2020.
O contributo
para os atuais oito mil milhões resulta do aumento da esperança média de vida, quando
é cada vez maior o número de pessoas que chega aos cem anos. Para tal convergem
as melhorias na medicina, na higiene ou no progresso socioeconómico, que levaram
a população a crescer num processo a que os demógrafos chamam de transição
demográfica. Na verdade, a determinada altura da história mundial, com as
melhorias que se verificaram, o número de óbitos baixou francamente e o número
de nascimentos não baixou assim tão rapidamente.
O problema
com que o mundo se depara é a concentração da maior parte da população junto às
orlas marítimas (em tempos recolhiam-se nos montes e à beira dos rios) e as
consequências que as alterações climáticas podem trazer como a deslocalização
de tantos milhões de pessoas.
No atinente à
alimentação, é verdade que a situação alimentar melhorou a nível mundial (embora
se use e abuse da comida de plástico e não se escolham os produtos alimentares
mais saudáveis), mas nunca se conseguiu alimentar, de forma plena, a população
em todos os lugares do planeta. E percebemos, com a guerra na Ucrânia, que a
segurança alimentar está muito dependente do fenómeno da globalização e que é
possível interrompê-lo. Com efeito, o mundo só consegue produzir e distribuir
alimentos em condições de normalidade política. Assim, para evitar decisões
unilaterais dos países mais poderosos do mundo, nesta matéria, é necessária uma
regulação das Nações Unidas ou de outra instância da governação desses países.
Sente-se
cada vez mais a pressão humana sobre os recursos naturais do planeta. Com
efeito, estão a ficar comprometidos muitos recursos do ecossistema, como a água
potável e o ar que se respira. Tal pressão é superior à capacidade regenerativa
dos ecossistemas em cada ano. O dia de sobrecarga da Terra está a ocorrer cada
vez mais cedo. No final dos anos 70, por exemplo, este dia era praticamente no
final do ano e, neste ano foi a 28 de julho, como refere Marta Leandro,
vice-presidente da direção nacional da Quercus. Os oceanos, florestas e solos,
responsáveis pela absorção de muito do dióxido de carbono libertado a mais para
a atmosfera, estão perto da saturação. E a forma como as populações se
alimentam começa a ter consequências para o planeta.
No mundo
desenvolvido come-se três vezes mais carne do que o considerado saudável. Ora,
tornar o sistema alimentar mais saudável e reduzir consideravelmente o consumo
de proteína animal pode ser uma forma de melhorar a capacidade do planeta para
alimentar a humanidade.
E as
alterações climáticas são grande pressão nos fluxos migratórios. São impactados
pelo clima países e cidades, o que obriga as pessoas a migrar para lugares mais
seguros e postula mecanismos de solidariedade com os países de mais pobreza,
desigualdade e falta de comida e água.
É na Ásia
que vive mais de metade da população mundial. A China deu grande contributo ao
mundo no crescimento populacional. No final da década de 1970, implementou a política
do filho único para reduzir o crescimento populacional e facilitar o acesso a
sistema de saúde e educação de qualidade. Tal política tem graves consequências
como o aumento do envelhecimento, pelo que o país recuou nesta medida, mas a
população continua a abster-se de ter filhos. E a China é o país mais populoso
do mundo mas pode ser ultrapassada no próximo ano pela Índia, de acordo com o
relatório World Population Prospects 2022 divulgado pelas Nações Unidas.
Em 2021, o
estado mais populoso da Índia, Uttar Pradesh, gizou uma política semelhante à
chinesa, em que os casais apenas poderiam ter dois filhos. Para atrair adeptos,
oferecer-se-iam benefícios como redução de impostos, empréstimos para
construção ou para compra de casa. As consequências desta política na China
complicam a passagem da decisão a lei.
***
Tiago Pitta
e Cunha lembra que a preocupação já não são os oito mil milhões, sem surpresa, mas
os dez mil milhões expectáveis até 2050. E sublinha a importância que Portugal
pode ter na produção de energia e de alimentação verdes, tendo o mal papel
decisivo.
O problema é
como continuar a permitir o nível de vida cada vez mais elevado à população
humana no planeta, sobretudo combatendo problemas que persistem, como a fome,
mas, ao mesmo tempo, sem acabar de destruir o planeta. Porque chegamos aqui por
via da exaustão dos recursos naturais do planeta.
Estamos em
crises planetárias comprovadas pela ciência, desde logo na crise climática,
passando pela das espécies (reduzindo aceleradamente a biodiversidade do
planeta) e pela crise dos oceanos – o que é comprovado pelos relatórios do IPCC
(painel intergovernamental dos cientistas da convenção das alterações
climáticas), pelos da IPBES (Plataforma Intergovernamental Ciência-Política
sobre Biodiversidade e Serviços de Ecossistemas) e pelos da UN
Biodiversity Lab (plataforma
da biodiversidade das Nações Unidas). E o único plano que
temos para travar o que está a acontecer é o Acordo de Paris, que não está a
ser cumprido, o que é deveras preocupante.
Depois,
temos a questão da guerra, que até pode acelerar a transição para as energias
renováveis, levando as pessoas à sustentabilidade energética, que anda de mãos
dadas com a segurança de fornecimento energético. Assim, devemos depender cada
vez menos dos países que controlam os recursos naturais (neste caso,
combustíveis fósseis) e devemos começar a produzi-los mais, de forma endógena,
através das renováveis. Mas se não cumprimos o Acordo de Paris, com oito mil
milhões, como é que o cumpriremos, em 2050, com dez mil milhões? Efetivamente,
será preciso alimentar, climatizar e transportar muito mais pessoas
Por isso, temos que repensar rapidamente os grandes setores carbonizadores: a energia, os transportes e a alimentação.
E aqui o mar será cada vez mais importante.
No século
XXI, o que podemos é descarbonizar, o que exigirá muito dos oceanos. Podem
superar o que a carbonização das indústrias terrestres implica na energia, na
alimentação e nos transportes.
Quanto à
energia, a UE é clara, ao dizer que o energy mix deve ter, a
partir de 2030, uma importante componente de energia eólica offshore.
Isso é bom para Portugal, já que o país conta com cinco mil horas de
vento offshore, comparado com as três mil horas onshore.
Poderíamos ter mais recurso a energia renovável a explorar no mar mais do que
em terra.
Diga-se, no âmbito
dos transportes, que o transporte marítimo é o mais energeticamente eficiente.
Porém, é necessária uma nova indústria de transportes marítimos, investindo nos
navios verdes, com novas propulsões, que deixem de poluir como os atuais navios
poluem.
A nível da alimentação,
alimentar 10 mil milhões até 2050 significa a necessidade de, pelo menos, mais
30% de proteínas alimentares. Se as produzirmos a partir do território
terrestre, que é reduzido (já o mar representa 71% da superfície do planeta),
teremos muito mais carbonização, pois a agricultura é altamente carbonizante,
pelo que libertaremos mais gases de efeitos de estufa.
Assim, teremos de adotar um novo paradigma na alimentação. Há que partir para as novas dietas, de que o IPCC fala, como
a dieta verde, o que leva a produzir muito mais algas e bivalves (espécies que
se alimentam de nutrientes marinhos, inclusive de carbono depositado no mar). E,
para Portugal, isso é importante, por termos condições ótimas no nosso mar para
bivalves e algas.
O mar pode, assim, ter um papel muito mais
relevante na energia, no transporte e na alimentação das pessoas, tornando-se o
grande amigo do ambiente e das populações, sem azo a protestos.
2022.11.15 – Louro de Carvalho
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