O cardeal
Pietro Parolin, secretário
de Estado da Santa Sé, que presidiu à Peregrinação Aniversária Internacional
deste mês de maio, no Santuário de Fátima, frisou, na manhã do dia 13, que a Humanidade
pode aprender, a partir da Cova da Iria, o valor da unidade, da esperança
e da paz, construída a partir da pluralidade, porque Maria nunca está do lado
dos profetas da desgraça.
“A história
dos crentes, de que Fátima é, simultaneamente, sinal e anúncio, mostra-nos
sempre Maria solícita e presente, por graça de Deus, no dia a dia dos fiéis e
no seu tempo, para que a luz da Páscoa ilumine as inteligências, os corações,
as mãos, as obras e os dias, abrindo-os assim ao futuro de Deus, que é sempre
um futuro de paz e esperança” afirmou o número dois do Vaticano aos inúmeros
milhares de peregrinos presentes no Recinto de Oração, entre eles 320 doentes
que marcaram presença, vincando o lugar da fragilidade em Fátima.
Esta primeira
grande peregrinação do ano contou com a presença dos símbolos peregrinos da
Jornada Mundial da Juventude (JMJ), que estarão, durante este mês, a percorrer
a diocese de Leiria-Fátima. Marcada pelo grande número de peregrinos a pé, contou
com a presença de 151 grupos, vindos de Portugal (82) e de outros 26 países. A
13 de maio, concelebraram, em Fátima, 274 padres, 23 bispos e três cardeais.
O presidente
da celebração destacou a “maternidade universal” da Virgem Maria, que “não
conhece os muros das diversidades culturais, sociais, políticas”. “Pelo
contrário, ensina a dilatar os espaços da Igreja, para que seja a comunidade
onde a harmonia das diferenças inutiliza a vontade de domínio e emulação, ao
serviço da qual tantas vezes estão injustamente as leis humanas, seja por
cumplicidade, seja por cobardia.”
O cardeal afirmou
que a fé cristã rejeita as visões catastrofistas da História, aportando
esperança: “A História não é um afastamento progressivo e inexorável de Deus,
como poderia levar-nos a crer aquilo que geralmente consideramos sinais da sua
ausência: as lágrimas sem resposta, o luto contínuo, os lamentos causados pela
infidelidade, a traição e a violência, a fadiga que se sente em viver numa
cidade baseada na opressão, a morte que apaga e silencia tudo e todos.”
A reflexão do
purpurado destacou a transformação que a Páscoa de Cristo representou, vincando
que a fé cristã é mais do que “meras fantasias consoladoras, sem frutos reais”:
“O ressuscitado é precisamente aquele Jesus que foi crucificado; aquele Jesus
que sentiu no próprio corpo os efeitos da ausência de Deus, aceite e procurada;
aquele Jesus que suspendeu o afastamento de Deus, preenchendo-o com a sua
presença e o seu amor levado ‘escandalosamente’ até ao perdão; aquele Jesus que
tornou possível buscar e encontrar Deus onde habitualmente não se
procura, ou seja, nos pobres, nos últimos, naqueles que o mundo esquece e
descarta. O ressuscitado é aquele Jesus que faz novos o viver e o morrer.”
Depois
convidou os peregrinos a superar a lógica da “lei do mais forte” e a defender
um “planeta saqueado”, para “abrir espaço à lei do amor”. “Que a luz e os
valores da Páscoa de Cristo não nos faltem jamais a nós, a este lugar santo, à
Igreja universal e particular, para que a alegria do Evangelho continue a ser
anunciada, com zelo e humildade, ao Mundo inteiro, a todos os homens e a todas
as mulheres que Deus ama”, concluiu.
***
Os
peregrinos, na oração dos fiéis foram convidados a rezar pela paz em todas as
partes do mundo, a começar na Ucrânia, particularmente neste dia em que o
presidente Vlodymir Zelenski esteve em Roma, e por todas as pessoas “vítimas de
qualquer espécie de abusos no seio da Igreja”.
A Palavra ao
Doente, dirigida aos doentes que acompanharam a celebração na Colunata ou
através da transmissão televisiva, foi proferida pela irmã Ana Luísa Castro, da
Aliança de Santa Maria, que, evocando as palavras do Papa Francisco, apresentou
a fé como “chave para descobrir o sentido mais profundo” do sofrimento humano.
“Contemplar
Jesus na cruz e na Eucaristia, […]a partir da dor física e psicológica, da
solidão, do sentimento de abandono, do medo, da impotência, da fragilidade ou
da morte, […] talvez traga uma perspetiva diferente ao que aconteceu quando Ele
se ofereceu por nós na cruz, ou se oferece em cada Eucaristia. Estás lado a
lado, com Ele, na Sua Paixão, e o teu sofrimento, aquele que os medicamentos
para a dor não conseguem tirar, não será jamais invisível aos olhos de Deus ou
inútil nesta História de Salvação”, assegurou a religiosa, ao apresentar Nossa
Senhora como intercessora dos que sofrem junto de Deus e a fraternidade da
comunidade que se reúne em assembleia Eucarística como guia.
Ana Luísa
Castro destacou a “consciência profunda de que o tempo de escuridão é sempre
passageiro” e apontou como exemplo a fé na “glória da
ressurreição” expressada pelos santos Pastorinhos, atitude que apontou
como caminho ideal perante o sofrimento e a finitude da vida terrena,
para se poder “escrever a História” no “tempo precioso e único” que é dado
a viver.
“Os
Pastorinhos escreveram uma história de graça e misericórdia com o pouco ou
muito tempo que tiveram. Mantiveram o olhar fixo em Jesus presente em todos os
sacrários da terra, guiados por Nossa Senhora que na Cova da Iria lhes mostrou
o Seu Coração como refúgio e caminho. O que era provisório, o sofrimento, os
sacrifícios, os cansaços e as angústias passaram, mas o amor com que amaram
tanto Jesus e Maria, ou com que se entregaram pelos pobres pecadores e pela Igreja,
isso permanece e continua atuante hoje na sua presença e intercessão”,
concluiu.
Nas palavras
finais, após o momento de Adoração Eucarística, D. José Ornelas, bispo de
Leiria-Fátima, agradeceu a presença do cardeal Pietro Parolin, que
presidiu à peregrinação, aos bispos e, por último, aos peregrinos,
especialmente aos que chegaram a pé na Cova da Iria.
“No seu
caminhar, os peregrinos a pé dizem-nos o que deve ser a Igreja: que percorre os
caminhos do mundo e das culturas. Maria vos guie sempre nesta vossa
peregrinação.”
A última
palavra foi para as crianças, a quem apontou a fé na “alegria da certeza” da
presença de Deus e de Nossa Senhora na vida de cada um.
***
Já na noite do dia 12, perante, cerca de 230 mil peregrinos, Pietro
Parolin afirmou que a Igreja é chamada a ser um instrumento vivo da esperança.
Presidindo à Procissão das Velas, na Cova da Iria, e com a entrada dos
símbolos da JMJ, o secretário de Estado da Santa Sé sustentou que a Igreja tem de ser o “instrumento vivo
da esperança” que não se deixa vencer pelo ódio e pela violência do Mundo
atual, prisioneiro do “sem sentido e do desespero”. “Ela é chamada a ser o instrumento vivo desta esperança,
impedindo que o esquecimento a vença e definhe a sua memória. Os cristãos não
devem deixar que a esperança lhes seja roubada pela morte, pelos soberbos e os
violentos”, porfiou o presidente da Celebração da Palavra, num verdadeiro mar
de luz, como há muito não se via na Cova da Iria.
O cardeal sublinhou
a importância da oração do Terço na construção duma alternativa “à
violência, à guerra, ao ódio fratricida, à exclusão, à marginalização”: Sem
esta alternativa, “a esperança duma mudança radical e dum futuro diverso e bom
é simplesmente impossível.”
“A recitação
do terço com os mistérios dolorosos e a escuta da Palavra divina, sob o olhar
materno de Nossa Senhora de Fátima, levam-nos ao coração da Páscoa: Cristo
morto e ressuscitado, aqui representado pelo Círio Pascal, continua a caminhar
pelo campo imenso das dores humanas, procurando construir a nova Jerusalém, a
cidade do Céu, a cidade da vida, do amor e da paz”, disse ainda, salientando
que só Cristo “é a alternativa”.
O prelado,
que, na tarde daquele dia, reafirmou a importância de Fátima no contexto da
Igreja, frisou que, em Maria, a Igreja “encontra uma Mãe e uma Irmã
que não só aponta, mas também partilha o que é necessário para sustentar este
serviço à vida e à paz”.
“Como Maria
e com Maria, a Igreja aprende a dedicar-se dia a dia, total e apressadamente, à
pessoa e à obra do Filho de Deus e Filho d’Ela!”, disse.
“Como Maria
e com Maria, a Igreja aprende a permanecer junto dos crucificados da História.
Como Maria e com Maria, a Igreja constrói pacientemente a cultura do encontro,
do diálogo, da reconciliação e da fraternidade sem muros”, disse ainda,
invocando o lema da JMJ e a pressa com que Maria anunciou a boa nova. “Peçamos
à Mãe do Senhor que nos alcance, com a sua oração materna, que «a Igreja se
torne uma casa para muitos, uma mãe para todos os povos e torne possível o
nascimento dum mundo novo.”
***
Por volta
das 22h30, devido à concentração de pessoas, o Santuário encerrou quatro dos
seus acessos: os dois túneis e as duas entradas junto às escadarias, em ambos
os lados do recinto de Oração.
Participaram
na celebração da noite, transmitida pelos meios de comunicação social e digital
do Santuário, seguidos em direto por mais de 20 mil pessoas entre o
youtube e o facebook do Santuário, 163 padres, 23 bispos e 3
cardeais.
Na recitação
do terço, os peregrinos rezaram pelas vítimas de abusos e pela “falta de
verdade”, evocando um “momento duro da História”, pedindo que a Igreja “se
converta, sinceramente peça perdão e procure a justiça, cuide de todas as
vítimas e dos agressores e repare todo o mal cometido”.
Já nas
preces da Celebração da Palavra, os participantes foram convidados a rezar pela
Igreja, “para que se ofereça a Deus e, na hora difícil que atravessa, ouça o
apelo à conversão que a verdade e a justiça lhe exigem”. Os peregrinos evocaram
ainda as vítimas e os “causadores das muitas guerras que afligem tantas nações
em todo o mundo, lembrando especialmente a Ucrânia invadida”. A oração
estendeu-se a “todos aqueles que, nesta hora dura e difícil da história, temem
o presente e têm medo do futuro”, bem como às “vítimas da pobreza, da doença e
da violência que assolam tantos povos”.
Durante a
noite e madrugada do dia 13, a Cruz da JMJ e o ícone mariano estiveram na
Vigília Jovem, na Basílica de Nossa Senhora do Rosário e, às 02h00,
acompanharam a Via-sacra no caminho dos Pastorinhos até ao Calvário
Húngaro.
***
Fátima
continua como sempre, desde o início das grandes peregrinações: uma luz forte,
um ponto de abrigo e, para muitos, uma rampa de conversão!
2023.05.13 –
Louro de Carvalho
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