sábado, 23 de agosto de 2025

No Dia da Bandeira Nacional da Ucrânia, a Rússia ataca-lhe cidades

 
O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskyy, participou, em Kiev, a 23 de agosto, numa cerimónia que assinalou o Dia da Bandeira Nacional da Ucrânia, instituído, em 2004, por decreto do então presidente, Leonid Kuchma, para comemorar a independência, face à União Soviética, em 1991.
A capital foi palco de uma celebração sombria, onde a bandeira foi hasteada perto da Câmara Municipal, com a presença de militares, de deputados, de membros do Conselho Municipal de Kiev e de representantes da comunidade da capital.
As bandeiras ucranianas foram hasteadas nos edifícios governamentais de todo o país, para assinalar a efeméride nacional. Com efeito, o Dia da Bandeira Nacional comemora o dia em que os deputados ucranianos trouxeram a bandeira azul e amarela para a Verkhovna Rada (parlamento ucraniano), quando se preparavam para a independência, após o fracasso do golpe soviético de 23 de agosto de 1991. Kiev declarou a independência, face à União Soviética no dia 24.
O feriado ocorre numa altura em que a Rússia continua a atacar cidades ucranianas, no âmbito do seu ataque aéreo intensificado, apesar dos esforços internacionais em curso, defendidos pelo presidente dos Estados Unidos da América (EUA), Donald Trump, para pôr fim à guerra total de Moscovo contra Kiev, que já vai no seu quarto ano.
Todos os anos, na véspera do Dia da Independência, a bandeira ucraniana é hasteada nos edifícios governamentais e nas janelas de todo o país, para celebrar a efeméride, pois a bandeira é um símbolo do Estado, bem como da dignidade nacional e da identidade dos Ucranianos.
“Esta bandeira simboliza o que é mais precioso para centenas de milhares dos nossos soldados, homens e mulheres de toda a Ucrânia, que defendem não apenas uma direção específica, não apenas Vovchansk ou Dobropillia, mas toda a Ucrânia”, disse Volodymyr Zelenskyy, vincando: “Esta bandeira é um objetivo, um propósito e um sonho para muitos dos nossos cidadãos, nos territórios temporariamente ocupados da Ucrânia. Apreciam esta bandeira, apreciam-na, porque sabem que não entregaremos a nossa terra aos ocupantes.”
Por sua vez, Vitali Klitschko, presidente da Câmara de Kiev, afirmou: “A Ucrânia continua a lutar pela sua independência. A nossa bandeira é um símbolo do Estado, da nossa força. É um talismã com o qual os soldados ucranianos vão para a batalha.” E sublinhou: “Levantamos solenemente a bandeira nacional, em honra dos nossos defensores, em honra da firmeza dos Ucranianos. Com ela, prestamos homenagem aos heróis caídos. A Ucrânia demonstrou que não vai recuar na luta sangrenta pela sua vontade, pela sua terra e pelo seu futuro europeu.”
A Comissão Europeia lembrou o dia, ao hastear a bandeira da Ucrânia na sede da União Europeia (UE) em Bruxelas. “Coragem. Resiliência. Liberdade. A bandeira da Ucrânia suporta tudo isso. No dia da Bandeira da Ucrânia, a sua bandeira ergue-se orgulhosamente no nosso quartel-general em Bruxelas. Um sinal de que a Europa está unida no apoio para uma paz justa e duradoura para a Ucrânia. Hoje e sempre. Estamos convosco”, garante a presidente da Comissão Europeia.
Entretanto, três pessoas ficaram feridas, na sequência de um bombardeamento russo na cidade de Kramatorsk, em Donetsk, na região oriental do Donbass. Dois dos feridos foram transferidos para o hospital para receberem tratamento por ferimentos moderados.
De acordo com a administração militar regional de Donetsk, as tropas russas atingiram habitações privadas, causando, pelo menos, 10 explosões. Foi iniciada uma investigação para determinar a extensão total dos danos. O Ministério da Defesa russo afirma ter assumido o controlo das povoações de Seredne e Kleban-Byk, em Donetsk. Porém, o presidente ucraniano acusou, novamente, a Rússia de insinceridade no desejo de paz, ao criticar o Kremlin por evitar conversações com a Ucrânia, para pôr fim à sua invasão, lançada em fevereiro de 2022.
Em reunião com Mark Rutte, secretário-geral da Organização do Tratado do Atlântico Norte NATO, na capital ucraniana, Zelenskyy vincou a necessidade de garantias de segurança semelhantes ao artigo 5.º da NATO, para assegurar a continuação da liberdade do país. Acusou o homólogo russo, Vladimir Putin, de bloquear as negociações, invocando o desejo de continuar a ocupar o território ucraniano. Apelou aos aliados da Europa e dos EUA para que exerçam pressão sobre a Rússia para a forçar a sentar-se à mesa das negociações e pôr fim à guerra.
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Quando a Rússia lançou a invasão em grande escala, em fevereiro de 2022, muitos disseram não se tratar de uma questão de “se”, mas de “quando” a Ucrânia cairia. Porém, mais de três anos após o início da guerra, o Dia da Independência da Ucrânia – celebrado a 24 de agosto – é, mais uma vez, um marco notável para o país e uma demonstração da sua vontade e disponibilidade para lutar pela sua independência.
Com o processo diplomático que visa pôr fim à guerra da Rússia, a Europa apoiou Volodymyr Zelenskyy no encontro com Donald Trump, a 19 de agosto, num “formato excecional”, disse, em entrevista à Euronews, o chefe da missão da Ucrânia junto da UE, Vsevolod Chentsov.
De facto, como acentuou o embaixador, a visita e a composição da delegação europeia foi um formato excecional de como a UE mostrou a sua unidade e o apoio à Ucrânia, neste momento crítico, pois todos interromperam as suas férias para se deslocarem a Washington e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, fez “um esforço para coordenar esta visita”.
Ora, se os ataques russos persistem, é óbvio que a Ucrânia responde, embora nem sempre de forma adequada. Por outro lado, tem de se intensificar a diplomacia. Assim, o próximo passo do processo diplomático com o objetivo de pôr fim à guerra deverá ser um encontro entre Volodymyr Zelenskyy e Vladimir Putin. Não se sabe se Donald Trump estará presente na primeira reunião ou se preferirá juntar-se aos dois presidentes, após as conversações bilaterais.
E, após a visita do dia 19 à Casa Branca, não é claro se os líderes europeus poderão estar presentes na mesa de negociações, em algum momento.
Vsevolod Chentsov diz que o processo está a tornar-se “bastante dinâmico” e espera que não demore muito tempo, até que seja organizada a próxima reunião. “Não devemos omitir quaisquer outros cenários, incluindo a participação do lado europeu, mas o que é importante é que a UE e a Europa, em geral, porque estamos a falar também da Grã-Bretanha, estejam presentes. […] A posição da UE é tida em conta pela Ucrânia e também pelos EUA. É isso que é mais importante”, declarou o embaixador ucraniano junto da UE.
Ao dar as boas-vindas a Volodymyr Zelenskyy, em Bruxelas, antes da partida para Washington, a presidente da Comissão Europeia afirmou que a UE continua a “apoiar a Ucrânia na sua via de adesão à UE”, o que é também “uma garantia de segurança para a Ucrânia”.
“O SAFE (Ação de Segurança para a Europa) está aberto à Ucrânia, o que significa que ajudar a Ucrânia a defender-se, ajudar a Ucrânia a utilizar o seu potencial, o seu complexo militar-industrial, a sua tecnologia militar moderna, ajudará definitivamente a Ucrânia, mas também, no futuro, ajudará a Europa a defender-se”, diz Vsevolod Chentsov, sustentando que “a Ucrânia tem de avançar com o processo de adesão, fazer tudo o que for possível, para ultrapassar este impasse e resolver todas as questões bilaterais que surjam com os estados-membros”.
É natural que os estados-membros tentem resolver questões bilaterais e utilizem o processo de alargamento, como uma alavanca. E a Ucrânia diz-se preparada para falar e para trabalhar, sem perda de tempo. “Se houver questões pendentes conexas com as minorias nacionais, o comércio ou a cooperação setorial, vamos resolvê-las, no âmbito dos grupos relevantes”, diz o embaixador.
A Hungria tem-se oposto à adesão da Ucrânia à UE, com o veto do primeiro-ministro, Viktor Orbán, à adesão a remontar a julho de 2024, quando a Hungria assumiu a presidência semestral do Conselho da UE. E, mesmo depois do fim da presidência húngara, Budapeste tem vetado qualquer passo no caminho de Kiev para a plena adesão à UE.
Porém, a Bloomberg noticiou, recentemente, que poderá vir de Washington um impulso inesperado para quebrar o impasse. Donald Trump terá telefonado ao primeiro-ministro húngaro, no dia 19, para obter apoio à adesão da Ucrânia ao bloco. E Vsevolod Chentsov assegura que Kiev está pronta para as próximas etapas do processo de adesão à UE e congratula-se com qualquer ajuda ao longo do caminho, incluindo de fora da UE. “Se os EUA ou outros países não pertencentes à UE estiverem dispostos a ajudar, a utilizar a sua influência política e os seus contactos pessoais, esse apoio será bem-vindo”, declarou, considerando que é importante ter esta questão como um elemento do processo de paz, sendo lógico que “Donald Trump, que está a liderar este processo de paz, esteja envolvido na resolução deste problema”.
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A próxima etapa do processo que visa pôr fim a esta guerra será uma reunião entre Volodymyr Zelenskyy e Vladimir Putin, mas falta definir o lugar onde dessa reunião.
O presidente da Ucrânia tem procurado manter conversações diretas com o seu homólogo russo, ainda antes do início da invasão total da Ucrânia pela Rússia. O Kremlin sempre recusou. Porém, com o recente impulso do presidente dos EUA, a possibilidade de realização de uma reunião está mais próxima do que nunca, mas há um escolho a contornar. É o mandado de captura do Tribunal Penal Internacional (TPI) contra Vladimir Putin, pelo rapto de crianças ucranianas, o que limita a escolha do local, visto que o presidente russo se arrisca a ser detido em qualquer um dos 125 estados-membros do tribunal, se pisar o seu território. Contudo, alguns estão dispostos a abrir uma exceção e prometeram não prender o líder do Kremlin, se este se deslocar para uma reunião que poderia pôr fim à guerra contra a Ucrânia.
A Suíça é opção possível. O seu ministro dos Negócios Estrangeiros disse que o país estaria pronto a receber Putin, para eventuais conversações de paz, apesar do mandado de captura do TPI e de a Suíça ser signatária do Estatuto de Roma, que fundou o tribunal. Porém, mantém o estatuto de neutralidade. Por isso, Ignazio Cassis declarou que, desde que Vladimir Putin viesse com objetivos de paz, o país poderia recebê-lo. “Isto tem a ver com o nosso papel diplomático, com a Genebra internacional como sede [europeia] das Nações Unidas”, explicitou Cassis.
O presidente francês, Emmanuel Macron, terá apoiado a ideia de ter Genebra como potencial local para as conversações, após a reunião na Casa Branca com os líderes europeus.
O chanceler austríaco, Christian Stocker, ofereceu o seu país – também signatário do TPI – como local potencial, dizendo que Viena apoia qualquer iniciativa que leve a uma paz justa e duradoura que proteja os interesses de segurança ucranianos e europeus. “Como anfitrião orgulhoso da OSCE [Organização para a Segurança e Cooperação na Europa] e de muitas outras organizações internacionais, estamos prontos a oferecer os nossos bons serviços”, afirmou numa publicação, no X.
Em março, a Arábia Saudita acolheu uma delegação dos EUA para as conversações, primeiro, com funcionários ucranianos e, depois, com funcionários russos.
O correspondente da Euronews em Doha, Aadel Hallem, afirma que, apesar de ser um Estado do Golfo relativamente pequeno, o Qatar tem lugar à mesa no cenário internacional e é chamado, frequentemente, a ser mediador em vários conflitos internacionais. Esses esforços de mediação incluem a Rússia e a Ucrânia, especificamente, quando se trata do regresso de crianças ucranianas, deportadas, à força, para a Rússia.
Quando, em junho, foi apanhado no fogo cruzado entre os EUA, o Irão e Israel, onde foram intercetados mísseis no seu espaço aéreo, o Qatar foi considerado um mediador de paz e de desanuviamento das tensões. Em 2020, acolheu conversações históricas entre funcionários dos EUA e os talibãs, que conduziram ao Acordo de Doha e abriram caminho à retirada das tropas norte-americanas do Afeganistão. E continua a mediar as conversações entre Israel e o Hamas, o que conduziu a vários cessar-fogos temporários e à entrega de ajuda humanitária a Gaza. O Qatar considera que os esforços de mediação são um princípio fundamental da sua política externa e um indicador claro do seu soft power.
Também os Emirados Árabes Unidos (EAU) moldaram o seu papel de mediador diplomático, num Estado capaz de se mover entre potências rivais, mantendo a credibilidade com ambas, indicou Toby Gregory, correspondente da Euronews no Dubai, frisando que esta estratégia se estendeu, diretamente, à guerra da Rússia na Ucrânia. Assim, no início do ano, os funcionários dos EAU ajudaram a organizar trocas que trouxeram para casa prisioneiros de guerra ucranianos, bem como crianças levadas para a Rússia. 
Ao mesmo tempo, Abu Dhabi tem mantido o diálogo com Moscovo. Assim, no início de agosto, o presidente, Mohamed bin Zayed Al Nahyan, deslocou-se à Rússia, para conversar com Vladimir Putin – um encontro que evidenciou a confiança que ambas as partes depositam na relação.
Portanto, um país africano poderá ser um excelente anfitrião para as negociações de paz.
Desde que Zelenskyy se tornou presidente da Ucrânia, em 2019, as comunicações diretas com Putin foram limitadas, porque a Rússia já ocupava território ucraniano no Leste e na Crimeia. Os dois presidentes tiveram apenas duas chamadas telefónicas e uma só reunião presencial, todas em 2019. Encontraram-se, pela primeira e única vez, em Paris, durante a Cimeira do Formato da Normandia, sob a égide dos líderes da Alemanha e de França. À porta fechada, terão discutido questões que continuam a ser relevantes, mas numa escala ainda maior: a troca de prisioneiros e o cessar-fogo no Leste da Ucrânia.
Houve diversas tentativas de Zelenskyy para um encontro com Putin, antes da guerra e depois da guerra, mas todas foram rejeitadas por este.
Agora, estão em mente os encontros, mas o formato ainda não é claro. Uma possibilidade é que sejam, inicialmente, bilaterais, entre Zelenskyy e Putin, e incluam Trump mais tarde. De acordo com os meios de comunicação social norte-americanos, o líder da Casa Branca tenciona deixar a Rússia e a Ucrânia organizarem a reunião entre os seus líderes, sem desempenhar, por enquanto, papel direto, dando um passo atrás nas negociações para pôr fim à invasão russa da Ucrânia. Porém, Donald Trump terá dito a conselheiros que tenciona organizar uma reunião trilateral com os dois líderes, mas só depois de estes se terem encontrado primeiro. E, entrando, mais tarde, nas conversações, líderes europeus, teremos negociações quadrilaterais.
Seja como for, o importante, como dizia o presidente do Conselho Europeu, António Costa, é que se chegue a uma paz justa e duradoura.  

2025.08.23 – Louro de CarvalhoParte superior do formulário


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