sábado, 2 de agosto de 2025

Em 2023, emigraram 70 mil Portugueses, na sua maioria, homens

 
De acordo com um relatório elaborado pelo Observatório da Emigração e pela Rede Migra do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES) do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa, e divulgado a 2 de agosto, em 2023, deixaram o país, com destino, sobretudo, à Suíça, cerca de 70 mil Portugueses – um número que se manteve estável, face a 2022.
Trata-se de um estudo que teve o apoio do Ministério dos Negócios Estrangeiros, do Gabinete do Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, do Fundo para as Relações Internacionais (FRI) e da Direção Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas (DGACCP). Está parcialmente integrado no sétimo relatório anual sobre emigração portuguesa da responsabilidade do Gabinete do Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas. O Observatório da Emigração e a Rede Migra foram as entidades responsáveis pela sua elaboração, no quadro do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES-IUL) do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL).
“Estima-se que terão saído 70 mil Portugueses em 2023, o mesmo número de 2022, continuando, assim, a recuperação da emigração portuguesa para valores próximos dos anos anteriores à pandemia de covid-19”, lê-se no relatório da Emigração Portuguesa 2024, com dados referentes ao ano anterior (ver:  Pires, Rui Pena, Inês Vidigal, Cláudia Pereira, Joana Azevedo e Carlota Moura Veiga (2024), Emigração Portuguesa 2023: Relatório Estatístico, Lisboa, Observatório da Emigração e Rede Migra, CIES-IUL, ISCTE-IUL. DOI: 10.15847/CIESOEMRE102024). 
Segundo o documento de 312 páginas, apenas não se verificou uma recuperação total, porque a emigração para o Reino Unido caiu mais de 40%, mantendo a trajetória descendente iniciada com o ‘Brexit’ – saída do Reino Unido da União Europeia (UE) – e com a diminuição das saídas pra a França, com uma queda de 25%
Em todo o caso, a emigração portuguesa é superior aos níveis pré-covid, na maioria dos seus principais destinos. Em 2023, a Suíça voltou a ser o principal país de destino para os Portugueses, contabilizando-se 12652 entradas, seguida por Espanha, com 11554
Segundo a leitura que o Diário de Notícias (DN) faz do relatório, destacam-se ainda países como a França, com 7426, a Alemanha, com 6375, os Países Baixos, com 4892, o Reino Unido, com 4414, a Bélgica, com 3857, o Luxemburgo, com 3638, a Dinamarca, com 1818, Moçambique, com 1439 e o Canadá com 1005. 
Com menos de mil entradas, de acordo com o DN, aparecem destinos, como os Estados Unidos da América (EUA), com 890, a Áustria, com 778, a Noruega, com 709, a Itália, com 702, a Suécia, com 688, o Brasil, com 547, a Venezuela, com 532, a Irlanda, com 426, e Angola, com 381. E, no fundo da tabela, situam-se a Austrália, com 91 e Macau, com 53. 
“Embora a imigração portuguesa tenha perdido relativa importância, ao longo dos anos, o impacto desses fluxos nos países de destino continua a ser expressivo. Por exemplo, no Luxemburgo, os Portugueses representaram cerca de 13,5% do total de entradas de imigrantes, enquanto, em Macau, o número foi de 6%, e na Suíça, 5,2%”, como pormenorizou o relatório. 
Em 2023, os emigrantes portugueses continuaram a ser, maioritariamente, homens em idade ativa. Porém, alguns países têm uma maior taxa de feminização, como o Reino Unido (50,5%), a França (50,4%) ou a Austrália (46,2%). E Os EUA foram o país onde se verificou um maior aumento no número de emigrantes que adquiriram a nacionalidade, contabilizando-se 11896 processos, mais 21,9%, face a 2022.
Dizem os autores que os dados sumarizados no quadro de síntese “apresentam alguns dados novos e relevam determinados fenómenos já salientados nas últimas seis edições”, nomeadamente:
* A permanência de elevada concentração de fluxos da emigração portuguesa no espaço europeu, entre os quais se destacam os fluxos para a Espanha, para a Suíça, para o Reino Unido, para a França e para a Alemanha;
* A menor distância entre o Reino Unido e os restantes destinos mais importantes da emigração portuguesa;
* O crescimento da importância relativa da Escandinávia e do Benelux (a Bélgica, os Países Baixos e o Luxemburgo), enquanto regiões de destino da emigração portuguesa;
* A existência de populações emigradas (stocks) de grande dimensão, quer na Europa, em consequência da acumulação de fluxos recentes com os iniciados nos anos 60, quer no continente americano, estas constituídas, no essencial, durante o terceiro quartel do século XX, com destaque para as residentes nos EUA, no Brasil e no Canadá;
* O predomínio da Suíça e do Reino Unido – no segundo dos dois casos, em consequência das incertezas sobre o estatuto dos imigrantes portugueses no pós-Brexit – e dos EUA, enquanto países com um maior volume de processos de naturalização;
* O predomínio masculino da emigração portuguesa, tanto no que respeita aos fluxos, como ao stock da emigração portuguesa; e
* O envelhecimento acentuado dos destinos mais antigos da emigração portuguesa.
Segundo os dados do relatório, a maior recuperação emigratória portuguesa, após a pandemia ocorreu apesar da forte diminuição da emigração para o Reino Unido, que era, antes do Brexit, o principal destino da emigração portuguesa. Entre 2021 e 2022, a emigração para o Reino Unido caiu mais de 40%, passando a Espanha, a França e a Suíça a serem “os principais destinos da emigração portuguesa, pela ordem indicada”. O crescimento da emigração, entre 2021 e 2022, da ordem dos 8%, deve-se, sobretudo, ao aumento da emigração para França, para a Suíça e para os Países Baixos, e, em menor grau, para Alemanha e para a Escandinávia.
Em regra, a emigração portuguesa subiu ou estabilizou em quase todos os países de destino, exceto no Reino Unido e, numa proporção muito menor, mas ainda assim significativa, no Luxemburgo.
Em termos de stock, não houve grandes mudanças. “A França continua a ser o país do Mundo onde vive maior número de emigrantes nascidos em Portugal, pouco menos de 600 mil, em 2022”. Com mais de 100 mil emigrantes portugueses residentes encontramos, por ordem decrescente, “a Suíça (204 mil, em 2022), os EUA (183 mil, em 2022), o Reino Unido (156 mil, em 2021), o Brasil (138 mil, em 2010), o Canadá (133 mil, em 2021) e a Alemanha (115 mil, em 2021)”. Em Espanha, “registou-se um decréscimo do número de emigrantes portugueses residentes (-0.3% em 2022), mantendo-se o stock próximo dos 90 mil indivíduos (93 mil, em 2022)”. Na Suíça, “o valor do stock de Portugueses diminuiu pelo sexto ano consecutivo (-1.6%, em 2022)”. Assim, é concluir que, como sucede em Espanha, “as novas entradas não compensam os valores dos regressos e da mortalidade entre os portugueses residentes”.
No atinente às remessas dos emigrantes, também um dos itens do relatório, é referido que, “entre 2021 e 2022, o valor nominal das remessas recebidas em Portugal cresceu cerca de 6%, sendo superior a 3,8 mil milhões de euros”. Todavia, graças ao crescimento económico verificado em Portugal nesse período, o valor das remessas em percentagem do produto interno bruto (PIB) “desceu para 1,6%”. Por países de origem, o maior crescimento absoluto e relativo foi o das remessas recebidas de Angola (cerca de +56 milhões de euros, em 2022, mais 23% do que em 2021). O maior decréscimo, em termos absolutos, foi o das remessas recebidas de França (-1,9 milhões de euros) e, em termos relativos, o da Espanha e o dos EUA, com uma redução de 2%, em relação a 2021. E, em termos comparativos, “o peso das remessas no PIB continua a ter, em Portugal, e como referido em anos anteriores, um valor situado num patamar comum ao das economias mais desenvolvidas, ou de maior porte, num indicador que variava, em 2021, entre os 25%, no caso de El Salvador, e menos de 0.1%, no caso dos EUA”.
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Depois deste panorama estatístico, parece-me oportuno comentar as declarações de João Pereira, conselheiro e coordenador da Comissão da Juventude do Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP), proferidas a 19 de julho e que podem ser lidas no DN online, apontando “incoerência” ao facto de os emigrantes portugueses recusarem assimilação e o país quer fazer isso aos imigrantes cá. Por outras palavras, aquele dirigente do CCP sustenta que os emigrantes nacionais defendem a cultura portuguesa nos países de destino e critica a “deriva populista” que se vive em Portugal.
Segundo João Pereira, emigrante em França, a nossa sociedade gosta que os seus emigrantes mantenham as tradições nacionais, fora do país, mas contesta as práticas culturais dos imigrantes, em Portugal. E o primeiro ponto da moção aprovada no atual mandato do órgão que representa os portugueses espalhados pelo Mundo, é a “recusa da assimilação” e a defesa da cultura portuguesa nos países de destino.
“O CCP luta contra a assimilação dos Portugueses nos países de acolhimento, que é um problema real”, mas, hoje, o país vive numa “incoerência total”, com dirigentes políticos a criticarem as práticas culturais e religiosas dos imigrantes que residem em Portugal, disse à Lusa ale dirigente, critictando o aperto das regras migratórias aprovadas, recentemente, pelo governo.
Há muitos Portugueses que “pouco falam a língua” dos países de acolhimento, exemplificou o dirigente, salientando que isso é “bem visto” por muitos, tal como, entre as novas gerações nascidas noutros países, há muitos que “quase não falam Português, ou só falam o básico”.
Em todo o Mundo, os emigrantes levam as suas associações, a sua cultura e até a sua prática religiosa. No caso português, o Santuário de Fátima regista dezenas de locais de culto, há prática tauromáquica portuguesa, na Califórnia, e romarias tradicionais portuguesas, um pouco por todo o Mundo onde há forte emigração nacional. 
“Acho que estamos numa deriva populista que não corresponde a uma emergência tão grave que justifique as medidas tão radicais ou restritivas”, disse o conselheiro do CCP, segundo o qual a nova lei exige que todos os imigrantes tenham visto de trabalho emitido pelo consulado português no país de origem, para conseguirem, depois, regularizar-se em Portugal, com autorização de residência, exceto quem invista (vistos ‘gold’) e os imigrantes altamente qualificados, que podem obter um visto de procura de emprego.
Além disso, segundo João Pereira, a nova lei impõe novas regras para o reagrupamento, impondo o prazo de dois anos, após a autorização de residência aprovada para pedidos para familiares maiores de idade. “Quando estou a dizer isto, não estou a dizer que não há problemas” e houve uma “via fácil para resolver alguns problemas que não se resolvem assim”, mas os “imigrantes, em Portugal, como nós, nos países onde vivemos, não são culpados dos problemas dos países”, frisou o dirigente, apontando a tendência natural de integração dos imigrantes nos destinos, particularmente, entre os mais novos, que não têm memória do país de origem.
Para João Pereira, que elogiou a proposta de alterações à Lei da Nacionalidade, hoje, a identidade dos Portugueses lá fora tem de ser defendida, porque há o risco de as gerações mais jovens “romperem as ligações entre Portugal”. Com a nova lei, será permitida a naturalização por ascendência portuguesa, até aos bisnetos, ao passo que, atualmente, a legislação permite a concessão da naturalização aos indivíduos nascidos no estrangeiro com, pelo menos, um ascendente de segundo grau (até ao neto) da linha direta de nacionalidade portuguesa.
Porém, estão afastados deste regime “os netos dos Portugueses que perderam a nacionalidade, no âmbito dos processos de descolonização, bem como os netos dos que se tenham naturalizado estrangeiros”, como refere o documento em discussão. Esta alteração terá impacto em países com comunidades mais antigas, disse João Pereira, dando o exemplo da França. “Há muitos Portugueses que não registaram os filhos nos consulados e essa ligação perdeu-se e existem muitos casos de pessoas que querem reencontrar-se com a sua história”, disse, salientado que “ter mais uma nacionalidade é sempre bom, porque nos dá mais horizontes”.
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Não vejo tantas vantagens nas alterações à Lei da Nacionalidade, como João Pereira. Com ele critico as pretensas alterações à Lei de Estrangeiros, mormente, no respeitante às normas relativas à autorização de residência, ao reagrupamento familiar, à imputação sistemática de crimes aos imigrantes e ao privilégio aos investidores de vistos gold e aos imigrantes qualificados.
Contudo, não vejo, nas pretensões da nova lei, tentativa de assimilação ou a proibição da vivência da cultura e das tradições dos estrangeiros que vivem em Portugal. Não creio que se proíba a construção e a manutenção de mesquitas, de sinagogas ou de outros templos e o exercício dos respetivos cultos e ensinos religiosos. Também não vejo qualquer tentativa de assimilação na atitude de bom acolhimento a imigrantes, na sua integração (contra a guetização) na sociedade portuguesa e na sua inclusão na escola, no sistema de saúde, no trabalho e na segurança social.
Considero, no entanto, relevante que se exija um mínimo de conhecimento da Língua Portuguesa, da organização do nosso sistema político e social e da nossa cultura, mas não como condição de entrada e de permanência no país. Diálogo linguístico, político e cultural não implica assimilação, nem destruição de culturas. Respeito não colide com identidade.
Quanto aos emigrantes portugueses, devo dizer que é justo que preservem a identidade cultural portuguesa, mas que não pretendam ser estranhos nos países de acolhimento.
Portanto, não há incoerência, nem deriva populista na sociedade portuguesa, embora ela exista em alguns decisores políticos.  

2025.08.02 – Louro de Carvalho


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