Jair
Isaías Bolsonaro, ex-presidente do Brasil, enfrenta um julgamento
histórico, por alegada tentativa de golpe de Estado, no assalto às sedes
dos Três Poderes, aquando da tomada de posse de Lula da Silva. É o escrutínio
público de um processo polémico e mediático, mas a decisão condenatória é de
cinco pessoas específicas da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Federal (STF): Cristiano
Zanin, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Flávio Dino e Cármen Lúcia.
O conhecido e polémico juiz, Alexandre de Moraes é relator de um dos casos mais mediáticos da sua carreira, enquanto magistrado, que já lhe valeu sanções políticas e económicas vindas dos Estados Unidos da América (EUA) uma crise diplomática a envolver taxas aduaneiras no Brasil.
O conhecido e polémico juiz, Alexandre de Moraes é relator de um dos casos mais mediáticos da sua carreira, enquanto magistrado, que já lhe valeu sanções políticas e económicas vindas dos Estados Unidos da América (EUA) uma crise diplomática a envolver taxas aduaneiras no Brasil.
Além
de Bolsonaro são arguidos e foram acusados, no processo: Walter Braga Netto:
general na reserva, ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro e candidato a vice-presidente
na lista do ex-presidente; Mauro Cid, tenente-coronel, ex-ajudante de ordens de
Bolsonaro e delator; Almir Garnier, almirante e ex-comandante da Marinha; Alexandre
Ramagem, ex-diretor da ABIN (serviços de informação) e deputado federal; Augusto
Heleno, general e ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional da
Presidência da República; Paulo Sérgio Nogueira, general e ex-ministro da
Defesa; Anderson Torres, ex-ministro da Justiça.
Os
crimes pelos quais houve maioria pela condenação de Bolsonaro e de mais sete
réus são: golpe de Estado; abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
organização criminosa; dano qualificado contra património da União; e deterioração
de património tombado.
Alexandre
Ramagem é o único que os ministros (juízes) excluem de dois crimes: dano
qualificado contra o património da União e deterioração do património tombado.
O
ex-presidente de 70 anos está em prisão domiciliária. Os advogados prometeram
recorrer de qualquer decisão de condenação para o painel na íntegra do STF, que
conta com onze membros.
O
julgamento – acompanhado por uma sociedade dividida, com pessoas a apoiar o
processo contra o ex-presidente, enquanto outras saíram à rua a manifestarem-lhe
apoio – ganhou nova atenção, após Donald Trump ter relacionado a imposição da
tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros importados com a situação jurídica
do seu aliado, considerando o julgamento uma “caça às bruxas”. E os observadores
dizem que os Estados Unidos da América (EUA) podem anunciar novas sanções
contra o Brasil, após o julgamento, enfraquecendo ainda mais as frágeis
relações diplomáticas bilaterais. Com efeito, apesar dos seus problemas legais,
Bolsonaro continua a ser um poderoso protagonista político no Brasil.
O
político de extrema-direita já tinha sido proibido de concorrer a cargos
públicos, até 2030, em virtude de um outro caso judicial. Espera-se que escolha
um sucessor que desafie o presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, nas eleições
do próximo ano. Por isso, agora, a decisão condenatória pode levar os parlamentares
aliados de Bolsonaro a procurarem uma amnistia para o antigo presidente no
Congresso e ex-presidente da República.
***
O
ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, votou pela condenação dos
oito arguidos, no que foi acompanhado por Flávio Dino, o segundo o juiz a
votar.
Alexandre de Moraes utilizou cinco horas para justificar a sua decisão. Para o ministro do STF, ficou provado que Jair Bolsonaro liderou a organização criminosa, com a finalidade de realizar um golpe de Estado. “A organização criminosa narrada na denúncia, realmente, iniciou a prática das condutas criminosas, com atos executórios concretos e narrados, em meados de 2021, e permaneceu atuante, até janeiro de 2023, tendo sido composta por integrantes do governo federal à época e por militares das Forças Armadas”, disse o relator do processo.
Alexandre de Moraes utilizou cinco horas para justificar a sua decisão. Para o ministro do STF, ficou provado que Jair Bolsonaro liderou a organização criminosa, com a finalidade de realizar um golpe de Estado. “A organização criminosa narrada na denúncia, realmente, iniciou a prática das condutas criminosas, com atos executórios concretos e narrados, em meados de 2021, e permaneceu atuante, até janeiro de 2023, tendo sido composta por integrantes do governo federal à época e por militares das Forças Armadas”, disse o relator do processo.
Moraes
votou para condenar Bolsonaro e outros sete arguidos por tentativa de golpe
Estado, afirmando que o ex-presidente do Brasil “teve o claro objetivo de
impedir e de restringir o pleno exercício dos poderes constituídos, em especial,
o poder judiciário, bem como tentar impedir a posse do governo democraticamente
eleito”. E refutou a alegação de Bolsonaro de que, quando discutiu as “possibilidades”
de permanecer no poder, o fez dentro dos limites da lei. “Chame o que quiser:
isso foi um projeto de decreto para um golpe de Estado”, afirmou o juiz, frisando:
“Uma série de atos executivos foram realizados com o objetivo de quebrar o
Estado de Direito democrático e [de] perpetuar o poder por meio de um golpe de
Estado.”
Ao
voto de Alexandre de Moraes seguiu-se o do juiz Flávio Dino, que acompanhou o
relator no voto de condenação. “Em relação aos réus Jair Bolsonaro e Braga
Netto, não há dúvida de que a culpabilidade é bastante alta e, portanto, a
dosimetria [cálculo do tamanho e da extensão das penas] deve ser congruente com
o papel dominante que eles exerciam”, afirmou, sustentando que as penas dos
arguidos Alexandre Ramagem, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira devem ser
menores, devido ao seu papel de menor relevância no crime.
O
voto de Luiz Fux foi o primeiro (e único) em sentido contrário. Nesse sentido, pediu
a “anulação do processo, por incompetência absoluta” do STF para julgar o caso,
pelo facto de os denunciados terem perdido os seus cargos e por não ter dado como
provados crimes de organização criminosa e de dano qualificado, pelo que votou
contra a condenação de Bolsonaro, que já não é presidente e é julgado como se o
fosse. E, se o entendimento fosse que o julgamento poderia ser feito no STF, deveria
ser realizado no plenário e não só no coletivo com cinco juízes.
Além
da alegada “incompetência absoluta” do tribunal, o juiz salientou a dimensão do
processo. “O eminente relator trouxe-nos um trabalho de grande densidade, algo
que ninguém conhecia antes. Confesso que, para mim, elaborar este voto foi
de extrema dificuldade, e explico porquê: não se trata de um processo simples,
não apenas pelo número de denunciados e de crimes imputados, mas também pela
quantidade de material probatório reunido”, observou.
O
juiz, tendo feito uma análise detalhada de todos os crimes de que Jair
Bolsonaro e os restantes arguidos são acusados, descartou a imputação do crime
de organização criminosa, por esta exigir “mais do que a reunião de vários
agentes para a prática de delitos, a pluralidade de agentes”, já que “a
existência de um plano delitivo não tipifica o crime de organização criminosa”.
Além disso, a acusação fala de uma organização criminosa armada, o que não
ficou provado, já que a denúncia deveria narrar e comprovar o “efetivo emprego
de arma de fogo por algum membro do grupo, durante as atividades da organização
criminosa”.
Sobre
as acusações de dano qualificado e de dano ao património, Luiz Fux indicou que não
podem ser aplicadas, já que “o desconhecimento sobre o que cada réu danificou,
ainda que indiretamente, inviabiliza a aferição das causas de qualificação do
crime”. Por outro lado, o juiz considera não existir prova da intenção de
impedir os crimes de vandalismo, havendo, ao invés, “evidências de que, assim
que a destruição começou, tomaram medidas para evitar que o edifício do Supremo
fosse invadido pelos vândalos”. Porém, votou pela condenação de Mauro Cid e de
Braga Netto, pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático
de Direito.
Depois
de Luiz Fux, seguiram-se Cármen Lúcia e Cristiano Zanin.
***
Por
seu turno, Cármen Lúcia sublinhou a liderança de Jair Messias Bolsonaro,
visível nas minutas e nos documentos apresentados pelo Ministério Público (MP) e
considera que ficou provada a sua ligação ao plano de matar Alexandre de Moraes
e Lula da Silva. “Dei por comprovado pela PGR [Procuradoria-Geral da República]
que Jair Messias Bolsonaro que são imputados a ele, na condição de líder da
organização criminosa”, declarou, vincando. “O que se alega para tentar
desfazer o que foi acusado é que não há formalmente assinatura. Passar um
recibo no cartório não é bem o que acontece nestes casos. Ele é o causador, o
líder de uma organização.”
Depois, Cármen Lúcia abordou, de forma breve, a participação de cada um dos réus na “trama golpista”, considerando que ficou provada, na acusação da PGR, a sua “participação efetiva” e não como “mero espectador”.
Depois, Cármen Lúcia abordou, de forma breve, a participação de cada um dos réus na “trama golpista”, considerando que ficou provada, na acusação da PGR, a sua “participação efetiva” e não como “mero espectador”.
Cármen
Lúcia começara por dizer que este é um julgamento do passado, do presente e do
futuro do Brasil, em razão dos episódios de rutura democrática ao longo da História
do país. “Toda a ação penal, especialmente, a ação penal, impõe um julgamento
justo e aqui não é diferente. O que há de inédito talvez, nessa ação penal, é
que nela pulsa o Brasil que me dói [citando Victor Hugo, poeta, romancista e
homem público francês do século XIX]. A presente ação penal é quase um encontro
do Brasil com o seu passado, com o seu presente e com o seu futuro, na área
específica das políticas públicas dos órgãos de Estado”, observou, vincando que
“o mal, mesmo cometido para um pretenso bem, ainda é o mal, principalmente, em
casos de golpe de Estado bem-sucedido, porque então ele torna-se um exemplo e
torna um exemplo e vai-se repetir”.
Cármen
Lúcia afirmou que os ataques às sedes dos Três Poderes, a 8 de janeiro de 2023,
não foi um evento “banal”, nem um passeio de domingo, após o almoço, mas que,
ao invés, houve método e organização nas ações golpistas, ao longo dos anos do
governo Bolsonaro, desde os ataques deliberados e sabidamente mentirosos às
urnas eletrónicas e ao Judiciário, até às conspirações do fim do mandato,
quando o grupo se associou para impedir a posse do presidente Lula da Silva.
Por
fim, a ministra afirmou que Bolsonaro era o líder da organização criminosa.
Ao
fim do voto de Cármen, o placar registava: três votos, para condenar todos os
réus, por todos os cinco crimes, exceto os crimes de danos, para Ramagem; e quatro
votos para condenar Cid e Braga Netto, por tentativa de abolição violenta do
Estado Democrático de Direito.
A
seguir a Cármen Lúcia, foi a vez de Cristiano Zanin votar a condenação ou
absolvição dos réus.
Com
a condenação já garantida, o presidente da 1.ª Secção foi o último a votar.
O
juiz começou por apreciar as preliminares, recusando todas as questões técnicas
apresentadas pela defesa: a competência do STF (e da secção, em particular), o
cerceamento da defesa, a exclusão do crime de organização criminosa imputado a
Alexandre Ramagem, antigo diretor dos ABIN ou a anulação do testemunho de Mauro
Cid. Depois, enunciou o seu voto pela condenação.
***
Jair
Bolsonaro, que não tem comparecido às sessões no julgamento, alegadamente, por
motivos de saúde, enfrenta cinco acusações no julgamento por, supostamente,
conspirar para encenar um golpe, após a sua estreita derrota para o atual
presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Todavia, tem negado, repetidamente,
qualquer irregularidade, alegando que o caso tem motivações políticas, ou que é
um movimento politicamente motivado.
A PGR alegara que Bolsonaro teria estruturado a propagação de desinformação sobre o sistema eleitoral e ataques aos poderes constituídos e aos seus representantes, a instrumentalização de instituições de Estado, a cooptação de comandos militares, para a instituição das providências antidemocráticas de intervenção, o planeamento de atos de neutralização violenta de agentes públicos e a instigação das manifestações. A denúncia da PGR apontou que o núcleo crucial da trama – formado por Bolsonaro e por sete ex-ministros e militares – organizou e executou uma série de ações para tentar impedir a posse do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, entre 2021 e 2023. Para os ministros que votaram pela condenação, as provas apresentadas, como lives (áudios ou vídeos transmitidos em tempo real), reuniões, documentos, planos golpistas e atos violentos, configuram uma tentativa concreta de rutura da ordem democrática.
A PGR alegara que Bolsonaro teria estruturado a propagação de desinformação sobre o sistema eleitoral e ataques aos poderes constituídos e aos seus representantes, a instrumentalização de instituições de Estado, a cooptação de comandos militares, para a instituição das providências antidemocráticas de intervenção, o planeamento de atos de neutralização violenta de agentes públicos e a instigação das manifestações. A denúncia da PGR apontou que o núcleo crucial da trama – formado por Bolsonaro e por sete ex-ministros e militares – organizou e executou uma série de ações para tentar impedir a posse do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, entre 2021 e 2023. Para os ministros que votaram pela condenação, as provas apresentadas, como lives (áudios ou vídeos transmitidos em tempo real), reuniões, documentos, planos golpistas e atos violentos, configuram uma tentativa concreta de rutura da ordem democrática.
A
maioria de três contra um, para condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro e
outros sete réus por todos os crimes dos quais foram acusados pela PGR na Trama
Golpista, surgiu após voto da ministra Cármen Lúcia, a que se adicionou o voto favorável
do juiz presidente da 1.ª Secção.
Depois
de os cinco juízes o terem votado, o coletivo decidiu sobre a sentença de
Bolsonaro, que chegou a décadas de prisão, tendo sido aventada a hipótese de e
43 anos para Bolsonaro. Contudo, o coletivo da 1.ª Secção, após o necessário
exercício de dosimetria das penas, decretou uma pena de 27 anos e três meses para
o ex-presidente.
Mesmo
depois disto, os advogados podem apresentar embargos, que precisam de ser
analisados pelo STF, antes do cumprimento das penas. E, apesar da condenação, a
prisão não é imediata. Só valerá, quando o processo estiver concluído e não
houver mais possibilidade de recurso, ou seja, quando o acórdão tiver
transitado em julgado.
***
Em
suma, Jair Bolsonaro foi condenado, a 11 de setembro, a 27 anos e três meses de
prisão, depois de o STF o ter considerado culpado de vários crimes, entre os
quais o de golpe de Estado. A longa sessão de votação das penas foi feita
aos olhos de todos, com os cinco juízes a debaterem o cálculo das sentenças.
Mesmo Luiz Fux, o magistrado divergente, colaborou na discussão, embora
tenha pedido escusa de calcular as penas dos condenados. Foi a hora da dosimetria,
que, explicada, seria pedagógica para evitar novas tentativas de rutura
institucional.
Conhecida a avaliação dos juízes, Donald Trump mostrou insatisfação, a partir de Washington, e os filhos do ex-presidente condenado reagiram, ameaçando mesmo com uma eventual ofensiva norte-americana ao Brasil.
Conhecida a avaliação dos juízes, Donald Trump mostrou insatisfação, a partir de Washington, e os filhos do ex-presidente condenado reagiram, ameaçando mesmo com uma eventual ofensiva norte-americana ao Brasil.
O
encerramento do histórico julgamento coube ao mediático Alexandre de Moraes,
que sublinhou a normalidade e independência do STF e do MP.
A
pena, por maioria dos juízes, do ex-presidente é de 27 anos e três meses, dos
quais 24 anos e nove meses de reclusão, devido à idade (70 anos) e a outras
atenuantes que foram tidas em conta. Mauro Cid recebeu, por unanimidade, a pena
de privação de liberdade, em regime aberto, não superior a dois anos, por ter atuado
como delator e por ter fornecido informações úteis ao processo, mas não pode
ser indultado, amnistiado ou ser perdoado judicialmente. Walter Braga Netto foi
condenado a 26 anos. Anderson Torres foi condenado a 24 anos em regime fechado
como pena total. Almir Garnier Santos recebeu a pena de 24 anos, dos quais 21 e
seis meses de reclusão. Augusto Heleno, com 77 anos, foi condenado a 21 anos,
sendo 18 anos e 11 meses de reclusão. E os dois últimos acusados, Paulo Sérgio Nogueira
de Oliveira e Alexandre Ramagem, foram condenados a 19 anos e a 16 anos e um
mês de reclusão, respetivamente.
Moraes
recordou que mais de 600 acusados foram condenados, no âmbito dos ataques de 8
de janeiro de 2023, e mais de 500 confessaram os crimes e fizeram acordos com a
Justiça, em troca de reduções das penas. “Somente a justiça aplicada,
igualmente, a todos pode, realmente, ser chamada de justiça” e o STF pode orgulhar-se,
afirmou, do exemplo que está a dar aos demais tribunais brasileiros de que não
se devem vergar a sanções “nacionais ou estrangeiras”.
Estas
declarações foram proferidas ante o presidente do STF, Luís Roberto Barroso,
que se deslocou ao tribunal, em Brasília, para assistir à conclusão do
julgamento, em sinal de apoio e de solidariedade para com decisões da maioria
de juízes.
2025.09.12
– Louro de Carvalho
Sem comentários:
Enviar um comentário