quinta-feira, 18 de setembro de 2025

Falhas informáticas paralisam sistemas e prejudicam os clientes

 

Antigamente, a cada passo, chegávamos a um serviço de atendimento ao público e a informação que pretendíamos obter demorava, porque era preciso consultar os arquivos, porque o/a funcionário/a estava ocupado/a, porque não estava dentro do assunto (pois tinha vindo de férias ou tido alta médica, havia pouco tempo) ou, simplesmente, porque o assunto não era com ele/a.
Agora, apesar de tudo ser mais rápido – e ainda continuarem, em parte, os motivos apontados –, a demora pode acontecer, porque o sistema não abre, não responde, precisa de reiniciar ou, simplesmente, porque falhou. E, como habitualmente não há um Plano B, os utentes ou clientes têm de esperar, voltar no dia seguinte ou, se o caso é urgente, tem de se atamancar uma solução de última hora, geralmente, incómoda.  
É raro depararmos com um sistema que não esteja devidamente informatizado: serviços de finanças, registos e notariado, arquivos, bibliotecas, escolas, estabelecimentos de saúde, banca, segurança social, serviços de polícia e de justiça, serviços de comunicação, publicações legislativas e regulamentares, serviços imobiliários, empresas, funcionamento de maquinaria e de equipamentos, serviços autárquicos e assim por diante.  
Ora, as falhas informáticas podem ter significativo e generalizado impacto, causando interrupções nos serviços essenciais, como aeroportos, bancos e serviços de saúde, levando a cancelamentos de voos, a constrangimentos no acesso a fundos e a insatisfação de clientes e funcionários. Podem também resultar em prejuízos financeiros, em perda de dados, em riscos de segurança cibernética e no aumento do stresse e do esgotamento profissional (burnout). 
Há impactos económicos e operacionais, em que se destacam as interrupções de serviços. Assim, as falhas informáticas podem paralisar setores inteiros, como demonstram as longas filas nos aeroportos e os problemas em bancos, resultando em cancelamentos de voos, em dificuldades no check-in, no acesso a fundos. 
Das falhas informáticas podem resultar prejuízos financeiros. Por exemplo, a perda de tempo e a ineficiência de operações digitais podem gerar custos significativos para as empresas e instituições. 
A inoperância de sistemas informáticos pode levar ao atraso de operações, à interrupção de serviços, incluindo o cancelamento de voos.
Pode haver também impactos nos utilizadores e nos profissionais, sobretudo, quando fica prejudicada a realização de objetivos de empresa ou de serviço e quando há prazos a cumprir. A falha de sistemas pode gerar frustração e stresse nos utilizadores e, em casos, como o da saúde, levar ao esgotamento profissional dos trabalhadores.
Em serviços, como os hospitais, as falhas podem atrasar o atendimento e impactar a qualidade dos cuidados prestados. Até se sente o incómodo quando um médico, perante a falência do sistema informático, se obriga a prescrever medicamentos manualmente.  
Há também impactos na segurança, que as falhas informáticas tornam vulnerável. Isso verifica-se, especialmente, em programas conectados com a Internet, que podem criar brechas exploradas por hackers, para aceder a dados e a informações confidenciais, incluindo temas que são segredo do Estado ou temas reservados.
Por exemplo, as interferências informáticas criminosas podem colocar em risco a vida das pessoas, a sua privacidade, os seus capitais, os seus interesses profissionais, etc.
Os exemplos mais badalados são: a falha global de 2024 e os sistemas de Saúde. Em julho de 2024, uma falha informática global causou problemas em aeroportos, em bancos e em serviços de comunicação, afetando o funcionamento normal de diversos setores em Portugal e não só. Em Portugal, hospitais e centros de saúde têm sofrido um número elevado de falhas informáticas, que originam lentidão, desperdício de tempo e ineficiência no acesso a dados de pacientes. 
E quantas pessoas não viram as suas contas bancárias varridas por ataques informáticos, os seus segredos desvendados! E quantas pessoas não caíam no conto vigário, através de falsas solicitações de dados por e-mail, por telefone e pela Internet!  
Quem não se lembra dos problemas havidos com o famoso portal Citius – ponto único de acesso para os profissionais da Justiça, cidadãos e empresas?
Particularmente graves são as falhas informáticas na banca e em instituições similares, as quais consistem em interrupções ou em mau funcionamento de sistemas e de aplicações bancárias, causadas por problemas técnicos, como avarias em software, falhas em infraestruturas de comunicação ou, mesmo, ataques cibernéticos, redundando em indisponibilidade de serviços, como aplicações móveis, caixas automáticas ou outras plataformas digitais. Assim, em julho de 2024, foi uma falha global afetou apps de bancos e de sistemas de companhias aéreas, mercê de uma atualização de software antivírus. 
As causas comuns de falhas informáticas na banca e em instituições similares são: problemas em software, nomeadamente, falhas em atualizações, como um antivírus que não foi devidamente testado, podendo causar a indisponibilidade de múltiplos serviços; problemas na infraestrutura de rede ou em servidores, que levam à queda de sistemas bancários; e ataques cibernéticos, como ataques de negação de serviço (DDoS) ou outras formas de ataques cibernéticos, que podem causar interrupções nos serviços bancários.
Os impactos destas falhas são, basicamente: a indisponibilidade de serviços, pois os clientes podem ficar sem acesso a aplicações móveis, a sites ou a outros canais digitais, ficando impedidos de realizar transações; e a perda de confiança, pois falhas recorrentes prejudicam a relação dos clientes com as instituições bancárias.
No evento de 2024, um banco, no Brasil, informou que os seus canais digitais estavam indisponíveis, mas as caixas eletrónicas continuaram a funcionar.

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É neste panorama de falhas informáticas que se enquadra o episódio informático do dia 18 de setembro, em Portugal, na Saúde, e a notícia do que se passou, em Espanha, na Justiça.
Vários hospitais e centros de saúde portugueses tiveram, desde a madrugada até ao fim da manhã deste dia, o sistema informático em baixo. E o apagão afetou o trabalho dos médicos, visto que não conseguiam aceder aos dados dos doentes para as consultas e para as cirurgias e nem mesmo para executar exames ou fazer prescrições.
Os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS) disseram à Lusa que os constrangimentos resultaram de uma atualização realizada pela operadora de telecomunicações NOS, no software da Rede Informática da Saúde (RIS), que provocou a instabilidade na rede. “As equipas técnicas dos SPMS estão, juntamente com o operador externo, a tentar resolver a situação”, acrescentou o organismo, a meio da manhã. Pelas 12h15, o sistema ficou totalmente restabelecido.
A falha, inicialmente divulgada pela SIC Notícias, foi confirmada pela presidente da Federação Nacional dos Médicos (FNAM), a oncologista Joana Bordalo de Sá, à Euronews.
A dirigente sindical disse ter conhecimento de falhas em várias unidades do Norte, como as Unidades Locais de Saúde (ULS) de Gaia-Espinho, do Tâmega-Sousa, do Hospital de Santo António e o Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto, mas acreditava que se tratava de uma falha generalizada.
“Estamos completamente dependentes do sistema informático para aceder à informação clínica do doente. É lá que está tudo: exames, prescrições”, explicou, sustentando que isso “coloca em risco o trabalho dos médicos e a segurança dos doentes”, o que “é inaceitável” e a levou a aconselhar os médicos a pedirem escusa de responsabilidade.
A dirigente sindical diz que o apagão informático mostra a ausência de investimento nos sistemas informáticos do Sistema Nacional de Saúde (SNS), responsabilizando, diretamente, a ministra da Saúde, Ana Paula Martins, e o primeiro-ministro, Luís Montenegro.
Joana Bordalo e Sá insiste em dizer que a “falha de investimento generalizada” é uma das causas da falha no sistema informático interno do SNS, uma vez que as falhas são diárias, embora em menor escala, dificultando o trabalho médico, e levam a assacar “responsabilidade política”.
A presidente da FNAM deu indicação aos médicos para avançarem com escusas de responsabilidade, pois, tratando-se de “responsabilidades políticas” decorrentes do problema de fragilidade tecnológica que põe consultas e cirurgias em risco, não pode haver lugar a responsabilidades técnico-profissionais. De facto, ao tempo das suas declarações, “em alguns sítios”, os sistemas ainda estavam “totalmente em baixo”.
A também oncologista acusa o executivo de “falta de investimento sério em sistemas digitais que coloca em risco, não só o trabalho de médicos e de todos os profissionais de saúde, mas, acima de tudo, a segurança dos doentes”, pelo que os médicos não podem ser responsabilizados por “falhas que resultam por inoperância governativa”.
A presidente da FNAM indicou à SIC Notícias que o problema começou ainda durante a tarde do dia 17 e “esteve completamente inoperacional durante a madrugada”. Perto das 10h00 da manhã, indicava que o sistema no IPO do Porto estava “a voltar lentamente” ao início da manhã, mas ainda com “muitos soluções”. Por exemplo, ainda não era possível fazer prescrição eletrónica e havia muitos constrangimentos.
É de recordar que no início do mês de setembro, os sistemas informáticos do Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, também sofreram uma falha informática que afetou as cirurgias e as consultas programadas.
A falha num equipamento informático obrigou o Hospital Beatriz Ângelo a ativar o plano de contingência, que, além das consultas, levou ao reencaminhamento dos doentes não críticos para os serviços de urgência de outras unidades hospitalares, tendo dificultado a consulta dos processos clínicos dos utentes.
No dia seguinte, foi iniciado o processo de reposição dos sistemas e começaram a ser recuperadas algumas funcionalidades, o que permitiu a suspensão do desvio para outros hospitais dos doentes não críticos e “retomar, gradualmente, o normal funcionamento” da urgência geral, de acordo com o hospital.

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Soube-se a 18 de setembro, que um erro no sistema que controla as pulseiras, durante a mudança da empresa gestora, em Espanha, impediu o acesso a dados anteriores a março de 2024, o que levou a absolvições e a arquivamentos, por falta de provas de violações de ordens de afastamento.
Por exemplo, o sistema informático Cometa, responsável pelo controlo das pulseiras eletrónicas dos agressores condenados por violência doméstica, sofreu grave erro técnico de consequências diretas na administração da Justiça.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) do país informou, no seu relatório anual, que esta falha conduziu a grande número de absolvições e de arquivamentos de casos de infratores, por os tribunais não terem podido aceder a informações cruciais sobre os movimentos dos investigados.
A origem do problema esteve no processo de transição entre prestadores de serviços. Até 2023, a empresa Telefónica detinha o contrato, subcontratando a Securitas Diret, mas o governo espanhol atribuiu a gestão à união temporária da Vodafone e da Securitas.
Nesta migração de dados entre sistemas, perdeu-se o acesso a todas as informações anteriores a março de 2024, o que deixou os juízes sem provas essenciais para demonstrar a violação das ordens de restrição. E tal perda de dados históricos teve impacto direto nos processos judiciais. O sistema Cometa deveria permitir identificar, a todo o momento, a localização dos arguidos ou condenados, em relação às vítimas, através de comunicação de curto alcance com o telemóvel que informa, em tempo real, por GPS – Global Positioning System (Sistema de Posicionamento Global), a distância entre o agressor e a vítima.  
Segundo o Ministério Público (MP), a anomalia tem consequências tanto na fase de inquérito nos Tribunais de Violência contra as Mulheres como na fase de julgamento. Nos tribunais criminais, o representante legal do centro de controlo não pode responder a perguntas sobre incidentes anteriores a 20 de março de 2024, o que leva, em muitos casos, à absolvição.
Embora o Ministério da Igualdade tenha garantido que o problema “já foi resolvido” e que, no final de 2024, todas as informações tinham sido recuperadas, o MP salienta que isso significou uma “potencial falta de proteção das vítimas”, durante vários meses.
O centro de controlo da Cometa informou, repetidamente, os tribunais de que não podiam fornecer informações de antes de 20 de março de 2024, data em que a migração para os novos dispositivos estava concluída.
Esta lacuna de informação realça a importância crucial de manter a continuidade dos sistemas de proteção das vítimas de violência de género, em que qualquer falha técnica pode ter consequências diretas na segurança das pessoas protegidas e na eficácia do sistema judicial.

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Não há dúvida: os sistemas falham, as irregularidades afetam pessoas e serviços, mas quase nunca ninguém é responsabilizado ou não se assumem as responsabilidades. Aliás, responsabilizar alguém criminal ou civilmente dará resultado só a muito longo prazo. A culpa não morre solteira, mas fica nas máquinas e no sistema.

2025.09.18 – Louro de Carvalho

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