Quem o afirmou foi António Guterres, secretário-geral da Organização das
Nações Unidas (ONU), no que foi acompanhado, em certa medida, pelos governos
português e francês e pelo secretário-geral do Partido Socialista (PS) de
Portugal.
Depois de se ter receado que as conversações sobre o clima, em Baku, no Azerbaijão,
colapsassem, chegou-se a um acordo financeiro nas primeiras horas da manhã de 24 de
novembro.
O Mundo
ocidental concordou em pagar 300 mil milhões de dólares, por ano, para
financiar a redução das emissões e a adaptação às alterações climáticas nos
países em desenvolvimento, de 2035 em diante, acordo que os países
potencialmente beneficiários, de Cuba à Índia, consideraram insuficiente e
tardio, depois de alguns terem abandonado o areópago em que se digladiaram
objetivos climáticos e interesses pelos combustíveis fósseis, em detrimento do
escopo financeiro desta cimeira climática.
A 22 de
novembro, dia previsto, inicialmente, para o termo da cimeira, os países em desenvolvimento
rejeitaram como “piada” a proposta de 250 mil milhões de dólares, por ano, a
partir de 2035, apresentada pelos países industrializados ricos, incluindo a União
Europeia (UE), os Estados Unidos da América (EUA) e o Japão.
De acordo
com observadores da sociedade civil que se encontravam na sala, por volta das
15h00 do dia 23, a proposta revista elevou a oferta para 300 mil milhões de
dólares. Porém, o grupo dos “países menos desenvolvidos” (PMD) declarou que a
proposta era inaceitável, antes de a Aliança dos Pequenos Estados Insulares
(AOSIS) se juntar a eles e abandonar a sala. Mais tarde, esclareceram que não
tinham desistido totalmente das negociações financeiras, mas era evidente que a
sua paciência estava a esgotar-se.
O grupo
G77+China, que engloba a maior parte da América Latina, da África e da Ásia,
tinha dado a entender que aceitaria um valor global de 500 mil milhões de
dólares para o “novo objetivo coletivo quantificado” (NCQG) destinado a
substituir o atual de financiamento anual de 100 mil milhões de dólares. Porém,
este valor foi ultrapassado pelas nações ocidentais mais ricas.
Abra-se um parêntesis para esclarecer que o Grupo dos 77 nas
Nações Unidas é uma coligação de nações em desenvolvimento, que visa promover
os interesses económicos coletivos dos seus membros e criar uma maior capacidade
de negociação conjunta.
John
Podesta, enviado dos EUA para o clima, foi hostilizado, ao abandonar a sala de
reuniões, na sequência da saída, a pé, de grupos que representam os PMD e a AOSIS.
Os ativistas do clima, gritando “vergonha”, acusaram a administração
norte-americana de renegar a retórica sobre o pagamento de uma parte justa.
Depois de John
Podesta haver sido empurrado para fora de uma porta lateral por pessoal de
segurança com equipas de televisão em perseguição, Victor Menotti, diretor do
Fórum Internacional sobre Globalização, considerou que não será melhor com
Donald Trump, mas que “é, realmente vergonhoso, o que estão a fazer com Biden”,
não sendo esta “a agenda de justiça climática e ambiental para a qual ele foi
eleito.
Seguiu-se um
longo período de calma relativa, com as conversações a decorrerem à porta
fechada.
“Todos nós
trabalhámos, arduamente, nas últimas duas semanas, e sei que nenhum de nós quer
sair de Baku sem um bom resultado”, afirmou o presidente da COP29, Mukhtar
Babayev, na sessão plenária que teve início pouco depois das 20h00 locais do
dia 23, sustentando que “os olhos do Mundo estão bastante focados em nós, mas o
tempo não está do nosso lado” e pedindo que intensificassem o compromisso de
“uns com os outros”.
A reunião
plenária foi marcada por uma série de questões processuais e até por novas
regras para os mercados globais de créditos de carbono, um segundo tópico
controverso de debate na que foi apelidada de “COP das finanças”.
A segunda
parte da sessão plenária começou pouco depois da meia-noite, mas foi
rapidamente interrompida, gerando confusão na sala, o que levou Mukhtar Babayev
a voltar ao microfone para dizer aos delegados que precisavam de 20 a 25 minutos
para finalizar os documentos. O acordo financeiro foi, finalmente, aprovado nas primeiras horas da manhã do dia
24, domingo.
***
No dia 22, Ana Toni,
enviada do Brasil para o clima e principal negociadora da COP29, que representa o próximo país anfitrião da
COP – a COP30 –, declarou que a segunda proposta financeira chegou demasiado
tarde à cimeira, deixando dúvidas sobre a possibilidade de acordo.
O Brasil
rejeitou a segunda tentativa da presidência do Azerbaijão de chegar a acordo sobre
o financiamento para as alterações climáticas, enquanto grupos da sociedade
civil organizavam um protesto improvisado em Baku, em solidariedade com os PMD,
no final de um dia em que as negociações se prolongaram.
A negociadora-chefe
brasileira, depois de se ter mostrado muito desapontada por os números terem chegado
tão tarde e por haver a possibilidade de se “não ter tempo suficiente”, relevou
que a posição do seu país era ainda a da esperança de que se pudesse chegar a
acordo.
Ana Toni
aludia à proposta revista de compromisso político apresentada pelo Azerbaijão
às 15h00 locais. Foi o primeiro de uma catadupa de textos de negociação, desde
o início das conversações, a 11 de novembro, que colocam um número no NCQG para
o financiamento climático dos países ricos para os países em desenvolvimento.
Porém, os
250 mil milhões de dólares, por ano, a partir de 2035, foi imediatamente
rejeitado pelos ativistas do clima e por grupos da sociedade civil, que o
julgaram inadequado para ajudar os PMD a evitar a dependência dos combustíveis
fósseis. “Sentimos que, se esses números tivessem sido apresentados no início,
se esse imposto tivesse sido apresentado no início, teríamos a certeza absoluta
de que poderíamos chegar a um acordo e, infelizmente, chegou muito tarde e já
não sabemos”, afirmou Toni, pouco depois de a ministra brasileira do Ambiente,
Marina Silva, ter transmitido uma mensagem semelhante aos jornalistas no
complexo da COP29.
A questão é
premente para o maior país da América Latina que, enquanto anfitrião da COP30,
em 2025, espera avançar para discussões sobre a concretização de promessas de
redução de emissões atualizadas de quase 200 partes do Acordo de Paris, para
limitar o aquecimento global a 1,5°C (graus Celsius) acima dos níveis
pré-industriais. Agora, o país enfrenta o cenário de ter de lidar com a
espinhosa questão do financiamento, enquanto a falta de certeza sobre os
futuros fluxos financeiros tornará mais difícil para os PMD redigirem as suas
contribuições nacionalmente determinadas (NDC) para o esforço global de redução
de emissões, a entregar até fevereiro.
“Não é um
problema só do Brasil. É para todos os países que estão aqui e, obviamente,
para a população que sofre primeiro. É com isso que estamos preocupados”, disse
a negociadora.
Efetivamente,
não adianta serem apenas a Europa ou os EUA a tomar medidas climáticas. Todos
os países devem passar pela mesma transição ou nenhum estará seguro.
A
negociadora brasileira vincou a responsabilidade histórica que as nações ricas
ocidentais têm para com o Mundo em desenvolvimento e reconheceu que haver um
número para negociar foi um passo em frente, embora tenha sobressaído a falta
de clareza sobre a origem do dinheiro, se do setor público se do setor privado.
E, sustentado que “estas melhorias já deviam ter acontecido há dez dias”,
garantiu que se iria fazer tudo o que fosse possível, pois era imperativo
chegar a acordo.
Os
jornalistas começavam a abandonar o complexo pelas 22h00 do dia 22, depois de
terem recebido a notícia de que um terceiro rascunho do acordo da COP29 só
sairia na manhã do dia seguinte, quando um grupo de várias dezenas de
manifestantes iniciou uma marcha silenciosa e sem aviso prévio pelo corredor,
vigiados de perto por pessoal de segurança.
A quantidade
de dinheiro em cima da mesa são “amendoins” e ridiculariza o Acordo de Paris,
disse Kirtana Chandrasekaran, da ONG Friends of the Earth international, quando
o grupo parou. O protesto da sociedade civil foi feito em solidariedade com os
países do G77, que devem “manter-se fortes” e rejeitar o atual texto do NCQG.
“Não se
trata de dinheiro baseado em subsídios, que é algo que os países em
desenvolvimento têm vindo a pedir desde o início”, afirmou Chandrasekaran, aduzindo que a fórmula em cima da
mesa iria sobrecarregar os países em desenvolvimento com mais dívidas. “É
completamente inaceitável e permite que os países desenvolvidos abandonem
completamente as suas obrigações de financiamento para os países em
desenvolvimento”, insistiu.
***
A maioria dos PMD e as organizações ambientalistas veem como
insuficiente o acordo que fechou a cimeira. São muitas as críticas que resultam,
conhecido o documento final. Não obstante,
Maria da Graça Carvalho, ministra do Ambiente e Energia de Portugal, salienta
que “se mantêm vivas as metas alcançadas na COP28, que são uma base para
futuras negociações”. E o governo congratula-se com o acordo, em que é
triplicada a meta de financiamento climático.
O governo
considera que os resultados deveriam ter sido mais ambiciosos e que tal não foi
possível, devido ao “bloqueio” dos países produtores de combustíveis fósseis.
Esta posição foi manifestada, a 24 de novembro, num comunicado em que o executivo
faz um balanço da reunião que teve lugar na capital e centro de
comércio do Azerbaijão.
Na
conferência da ONU sobre o clima, COP29, foi alcançado um acordo segundo o qual
os países desenvolvidos concordaram em apoiar com 300 mil milhões de dólares
anuais (cerca de 287,86 mil milhões de euros, ao câmbio atual), nos próximos 10
anos, os países em desenvolvimento.
“Gostaríamos
de ter visto mais ambição na vertente da mitigação”, lê-se no comunicado do
Ministério do Ambiente e Energia, liderado por Graça Carvalho, que se queixa de
essa ambição ter sido refreada, “face ao bloqueio dos países produtores de
combustíveis fósseis”, mas dizendo que “se mantêm vivas as metas alcançadas na
COP28”, “uma base para futuras negociações”.
***
Por seu turno, o secretário-geral do
PS considerou, no dia 24, que o acordo alcançado na COP29 “ficou aquém do que a
ONU tinha identificado como necessário” e defendeu que é preciso “aumentar a
ambição” até à próxima cimeira do clima, a COP30, no Brasil. É o que se lê numa
publicação de Pedro Nuno Santos, na sua conta oficial na rede social X (antigo Twitter).
Contudo, o líder do PS concede, que
da COP29 “fica a boa notícia dos avanços na regulamentação do artigo 6.º do
Acordo de Paris, que permitirá reforçar a credibilidade dos sistemas dos
créditos de acordo”, sustentando que são essenciais para se alcançar “os
objetivos climáticos e financiar os países do Sul Global”. “A ciência diz-nos
que, se nada ou pouco fizermos, viveremos as consequências das alterações
climáticas associadas ao aumento da temperatura global. O Mundo não pode desacelerar
os seus esforços”, vinca Pedro Nuno Santos.
***
Após duas noites de horas
extraordinárias na conferência, os países pobres e vulneráveis resignaram-se a
aceitar o compromisso financeiro dos países desenvolvidos até 2035, o que aumenta
o compromisso atual que estava fixado nos 100 mil milhões de dólares por ano.
Desde o início, os países em
desenvolvimento queriam muito mais dinheiro, para ajudar na transição
energética e para obviar aos problemas causados pelas alterações climáticas.
A cimeira tinha como ponto principal
da agenda a definição de um novo montante de apoio. O novo objetivo financeiro
adotado na COP29, em Baku, “é uma apólice de seguro para a Humanidade”, face
aos impactos das alterações climáticas, mas “não é altura para voltas de
honra”, como acentuou o diretor da ONU Clima, após a aprovação do acordo. “Nenhum
país conseguiu tudo o que queria e estamos a sair de Baku com uma montanha de
trabalho para fazer. Por isso, não é altura para dar voltas de vitória”, afirmou
Simon Stiell em comunicado.
É muito difícil o rico abrir a bolsa
para o pobre. E a dificuldade do que sucede com pessoas singulares avoluma-se
exponencialmente na relação entre países ricos e países pobres. Estes costumam
ser explorados até ao tutano, a troco de uma dúzia de moedas. Quem paga
coloniza!
2024.11.24 – Louro de Carvalho
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