quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Acordado um cessar-fogo de 60 dias entre Israel e o Líbano

 

No decurso da cimeira, de 25 e 26 de novembro, dos Ministros dos Negócios Estrangeiros do G7 (grupo que inclui as sete nações mais industrializadas do Mundo), em Fiuggi, a cerca de 80 quilómetros a Sudeste de Roma, na Itália, rodeada de apertada segurança, pairou no ar a possibilidade de, em breve, se alcançar um cessar-fogo entre Israel e o Hezbollah. “Talvez estejamos perto de um cessar-fogo no Líbano. […] Esperemos que seja verdade e que não haja recuos à última da hora, disse Antonio Tajani, ministro italiano dos Negócios Estrangeiros e anfitrião do encontro, vincando a disponibilidade de a Itália assumir papel mais interventivo nos esforços de manutenção de paz e na supervisão de qualquer acordo de cessar-fogo.

Também o embaixador de Israel nos Estados Unidos da América (EUA), Mike Herzog, disse à Rádio do Exército de Israel, no dia 25, que poderia ser alcançado, dentro de dias, um acordo de cessar-fogo para acabar com os combates entre Israel e o Hezbollah, com sede no Líbano.

O Médio Oriente, a par da situação na Ucrânia, foi um dos temas prioritários da cimeira, estando os líderes a enfrentar uma pressão crescente para o fim do conflito, quer no Líbano, quer na Faixa de Gaza. Tão premente é esta temática que foi a primeira vez que aos ministros do G7 se juntaram os seus homólogos da Arábia Saudita, do Egito, da Jordânia, dos Emirados Árabes Unidos e do Catar – o “Quinteto Árabe” –, bem como o secretário-geral da Liga Árabe.

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Na verdade, foi com grado que se ouviu, no dia 26, o presidente norte-americano, Joe Biden, a anunciar que, nos próximos 60 dias, Israel irá retirar, gradualmente, as suas forças do Sul do Líbano. Porém, frisava que Israel tem direito à autodefesa se o Hezbollah violar o acordo, em conformidade com o direito internacional.

O acordo de cessar-fogo entre Israel o grupo xiita Hezbollah, sediado no Líbano, entrou em vigor no dia 27, às 4h00 locais (duas horas em Lisboa).

A trégua, aprovada pelo governo israelita, durará 60 dias, segundo o presidente do país (os EUA) que mediou as conversações, foi desenhada para ser permanente.

Num discurso a partir do no Jardim das Rosas, da Casa Branca, em Washington D.C., Joe Biden afirmou que os governos de Israel e do Líbano aceitaram a proposta dos EUA para pôr fim a um conflito “devastador”. Por conseguinte, os civis de ambos os lados poderão, em breve, regressar em segurança às suas comunidades e começar a reconstruir as suas vidas.

Horas antes, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, já tinha anunciado o acordo de cessar-fogo, que abre espaço para pôr termo a quase 14 meses de combates, iniciados após a resposta israelita ao ataque do Hamas, a 7 de outubro de 2023.

Numa comunicação ao país, Benjamin Netanyahu começou por se dirigir aos residentes do Norte de Israel, dizendo-se orgulhoso da sua perseverança e resistência e vincando que a guerra não terminará, enquanto os habitantes do Norte de Israel não puderem regressar a casa em segurança. Depois, afirmando que o Hezbollah sofreu forte revés na sequência da campanha militar israelita, disse que “já não é o mesmo Hezbollah” e que Israel fez o grupo recuar “décadas”. Com efeito, Hassan Nasrallah, qualificado como “a cabeça da serpente”, foi morto, assim como “todos os líderes” do Hezbollah. “Destruímos a maior parte dos rockets e mísseis. Matámos milhares de terroristas e destruímos as infraestruturas subterrâneas perto das nossas fronteiras”, adiantou Netanyahu, garantindo que, se o Hezbollah violar o acordo de cessar-fogo, rearmando-se e atacando, Israel, que se manterá unidos até à vitória, reagirá de forma “enérgica”.

Todavia, Israel não desiste das hostilidades. Ao invés, o fim do conflito com o Hezbollah, na ótica de Netanyahu, permite a Israel “atualizar” e “rearmar” as suas tropas, sublinha, tendo as forças israelitas, em breve, à disposição mais armamento, armamento sofisticado.

Outro dos objetivos do acordo de cessar-fogo, como refere Netanyahu, é isolar o Hamas. “O Hamas estava a contar com o Hezbollah a lutar em conjunto e, uma vez eliminado o Hezbollah, o Hamas fica sozinho”, sustenta, garantindo: “A nossa pressão sobre o Hamas será cada vez mais forte e isso vai ajudar-nos a recuperar os nossos reféns.”

Do lado libanês, o primeiro-ministro interino, Najib Mikati, afirma que a comunidade internacional deve “atuar rapidamente”, para travar a ofensiva israelita e para “aplicar um cessar-fogo imediato”. E sublinha que o povo de Beirute “suportou muito hoje, como sempre suportou o maior fardo para todo o Líbano.

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No dia 26, o Gabinete de Segurança de Israel aprovou o acordo de cessar-fogo no Líbano numa votação de 10-1, logo após a recomendação do primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu.

O acordo pretende uma pausa de 60 dias no conflito, mas Joe Biden, para quem a decisão de Israel é uma boa notícia, assegura que a perspetiva é a da “cessação permanente das hostilidades”.

Nos próximos 60 dias, o exército libanês e as forças de segurança do Estado serão mobilizados e assumirão o controlo do seu território. As infraestruturas do Hezbollah no Sul do Líbano não podem ser reconstruídas. Israel retirará, gradualmente, as forças que lhe restam, nos próximos 60 dias. E os civis de ambos os lados poderão regressar em segurança às suas comunidades.

Os EUA têm dado firme apoio a Israel, apoio que Joe Biden reiterou, desta vez, afirmando que, se “o Hezbollah ou qualquer outra pessoa quebrar o acordo e representar uma ameaça direta a Israel, então o país mantém o direito à autodefesa”. Neste ponto, alinha com a declaração de Benjamin Netanyahu, após a sua recomendação ao Conselho de Ministros, onde avisou que “a duração do cessar-fogo depende do que vai acontecer no Líbano”.

O primeiro-ministro israelita frisou que, no entendimento com os EUA, Israel ficou a manter total liberdade de ação militar, de modo que, se o Hezbollah violar o acordo e tentar armar-se ou se tentar renovar as infraestruturas terroristas perto da fronteira, Israel atacará.

Biden agradeceu ao presidente francês, Emmanuel Macron, pela sua parceria na obtenção do acordo e disse que os EUA trabalhariam em conjunto com França e com outros países para fornecer a assistência necessária a uma bem-sucedida implementação do acordo.

Numa videomensagem de vídeo, o presidente francês saudou o acordo de cessar-fogo e afirmou que este marcava uma “nova página” para o Líbano. “É importante que este cessar-fogo seja respeitado, que dure para restaurar a segurança dos Libaneses, a segurança dos Israelitas, para permitir o regresso dos deslocados de ambos os países às suas casas e para permitir a restauração da soberania do Líbano”, disse Macron, sublinhando que a restauração da soberania do Líbano exige a eleição de um novo presidente “capaz de unir o povo libanês através da formação, também, de um governo forte e representativo e da adoção das reformas necessárias para a recuperação económica e financeira do país”.

Outros líderes mundiais também manifestaram o seu apoio ao acordo, na plataforma das redes sociais X. Isaac Herzog, presidente de Israel, julga a decisão “correta e importante” e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, considera-a “notícia muito encorajadora”. Ao invés, o líder da oposição israelita, Yair Lapid, criticou o acordo, dizendo que “Netanyahu não sabe como trazer segurança a Israel”, e apontou a urgência de acordo sobre os reféns.

O acordo não é um dado adquirido, mantém-se frágil e reversível. O anúncio de Joe Biden foi feito momentos antes de um ataque aéreo israelita ter abalado a capital libanesa. Nas horas que antecederam a reunião do Conselho de Ministros, Israel emitiu um número recorde de avisos de evacuação, e as autoridades locais afirmam que os ataques em todo o Líbano mataram, pelo menos, 24 pessoas, no dia 26. Na verdade, Israel tinha assinalado que continuaria os ataques até à aplicação do acordo de cessar-fogo às 4h00 da manhã, hora local. Por sua vez, o Hezbollah também disparou rockets, fazendo disparar as sirenes dos ataques aéreos no Norte de Israel.

Outra fragilidade do acordo é que a pausa nos combates entre Israel e o Hezbollah não abrange a guerra de Israel em Gaza. Mesmo assim, Joe Biden espera que o acordo de cessar-fogo seja um catalisador para se chegar a um acordo entre Israel e o Hamas. Por isso, os EUA irão trabalhar em conjunto com a Turquia, com o Egito, com o Qatar e com Israel, nos próximos dias, com vista a um acordo entre Israel e o grupo militante Hamas, pois, “tal como o povo libanês merece um futuro de segurança e de prosperidade, também o povo de Gaza merece”, na ótica de Biden.

O ainda ocupante da Casa Branca referiu que os EUA “continuam preparados para concluir um conjunto de acordos históricos com a Arábia Saudita, incluindo um pacto de segurança e de garantias económicas, juntamente com uma via credível para o estabelecimento de um Estado palestiniano e a normalização total das relações entre a Arábia Saudita e Israel”. E mostrou-se convicto de que a única via para um acordo inclui a libertação dos reféns. Porém, ainda recentemente, os EUA vetaram (pela quarta vez, neste ano) uma resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) a apelar a um cessar-fogo em Gaza, aduzindo que não colocava como condição a libertação dos reféns.

O presidente eleito Donald Trump, que tomará posse a 20 de janeiro, já disse que iria trazer a paz ao Médio Oriente, mas não explicitou como.

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Este acordo de cessar-fogo, frágil à nascença, como dissemos, mantém a geopolítica mundial numa espécie de limbo, à espera da chegada de Donald Trump à Casa Branca, a 20 de janeiro. A duração acordada é de 60 dias e pode haver interesses táticos, não saudáveis, de ambas as partes.

Mesmo assim, é a vitória diplomática que Biden que procurava para amenizar a saída penosa da presidência dos EUA – contraditória com a autorização de armas norte-americanas, em solo russo, pela Ucrânia. O grande objetivo será um cessar-fogo em Gaza, ansiado e não concretizado, mas já é alguma coisa. Dificilmente o presente acordo será um passo para um plano abrangente de paz no Médio Oriente.

“As pessoas de Gaza passaram por um inferno, o seu mundo está absolutamente destruído”, lamentou Joe Biden, considerando que a “única saída” para o Hamas é libertar os restantes reféns e pôr fim aos combates. Ao mesmo tempo, o presidente norte-americano falou de “acordos históricos”, a curto prazo, o que poderá incluir a normalização de relações entre Israel e a Arábia Saudita e o caminho para a criação de um Estado Palestiniano – ambição excessiva para o tempo de presidência que lhe resta (menos de dois meses).  

No entanto, este cessar-fogo, se for concretizado, dará vantagem a ambos os lados: o Hezbollah, reconstruindo-se, pode fazer regressar parte dos 1,3 milhões de pessoas deslocadas, especialmente no Sul (região, há muito dominada, pelo grupo xiita); e Israel pode rearmar-se e dar descanso às suas Forças Armadas, além de fazer regressar 60 mil deslocados ao Norte do país.

Além disso – e mais importante para Israel – é o governo de Telavive poder voltar a focar-se no Irão (que julga ser “a maior ameaça na região”), batalha para a qual Israel precisa de apoio internacional. Ora, Benjamin Netanyahu assumiu a diminuição no fornecimento de armas por parte dos EUA, pelo que estará à espera de um acordo com Donald Trump, que redunde no aumento dos fornecimentos.

O acordo de cessar-fogo prevê a retirada das forças israelitas do Líbano e das forças do Hezbollah da região a Sul do rio Litani, a 30 quilómetros da fronteira israelita. As Forças Armadas Libanesas e um comité de supervisão liderado pelos EUA monitorizarão o acordo, que alguns especialistas acreditam que será cumprido, o que não dou por garantido, em virtude das declarações no sentido da legítima defesa de Israel (por Biden e por Netanyahu). É fácil haver um incidente!

Esta pausa pode não passar de uma ocorrência e a tensão continuar no Médio Oriente. Porém, é melhor do que nada.

2024.11.27 – Louro de Carvalho

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