O governo considera como prioridades orçamentais a
taxa especial para jovens de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares
(IRS), o designado IRS jovem, e a descida faseada da taxa do imposto sobre o
rendimento das pessoas coletivas (IRC), de 2025 a 2028 (sendo de 19,5%, em 2025,
e ficando em 15%, a partir de 2028), aplicável a todas as empresas.
As receitas
de dois dos principais impostos (IRS e IRC) não devem cair mais, porque o
governo (este e os que lhe sucederem a seguir, no “médio prazo”) precisa de
garantir “uma política fiscal prudente”, de modo a reduzir a reduzir o peso da
dívida pública, que se mantém acima de 90% do produto interno bruto (PIB) e é
suposto que caia “para 60% do PIB, dentro de 15 anos”, avisa a missão do Fundo
Monetário Internacional (FMI), na nova avaliação anual ao País (o chamado
relatório Artigo IV), divulgado a 2 de outubro.
A equipa de
avaliadores, liderada pelo economista Jean-François Dauphin, vai mais
longe, advertindo que “novas reduções de impostos e novos aumentos de salários
e pensões precisam de ser cuidadosamente calibrados”.
Além disso, o
novo estudo da instituição liderada por Kristalina Georgieva deixa avisos sobre
o rumo da despesa. Tomou nota dos anúncios de aumentos salariais atribuídos a
professores e às forças armadas, bem como a outros que estão na calha para
outros grupos profissionais do setor público. E também tomou nota da decisão do
governo de aumentar mais os pensionistas pobres. Tudo isto configura um tipo de
medidas que levanta reservas ao FMI, sobretudo, se não vierem acompanhadas de medidas
de “compensação”.
Para a missão
do FMI, o “forte desempenho das receitas, provavelmente, ajudará a atingir as
metas orçamentais”. Porém, este desempenho é “temporário” e os “pequenos
excedentes”, previstos para este ano e para o próximo, são de natureza
“cíclica”, isto é, sem medidas estruturais, pelo que não deverão repetir-se.
Quando o
governo e o maior partido da oposição, o Partido Socialista (PS) estão a tentar
negociar com pinças as traves mestras do próximo Orçamento do Estado para 2025 (OE
2025), designadamente, o que fazer no âmbito da descida programada da taxa base
do IRC até 15%, em 2027, e no IRS jovem, o FMI pede prudência quanto a grandes
generosidades fiscais, recordando, repetidas vezes, ao longo desta avaliação,
que o país continua muito endividado, o que acarreta riscos.
“A médio
prazo, uma política orçamental prudente, apoiada por compensações das recentes
medidas expansionistas, continua a ser fundamental para a redução da dívida
pública, ao mesmo tempo que a composição orçamental deverá tornar-se mais
favorável ao crescimento”, sustenta avaliação do grupo liderado por Jean-François
Dauphin, considerando ser “apropriada uma orientação orçamental globalmente
neutra, com a continuação de pequenos excedentes orçamentais a médio prazo, tal
como pretende o governo”.
Este plano “garantiria
uma redução sustentada da dívida, com a dívida a atingir 60% do PIB, no prazo
de 15 anos, reconstruindo, assim, as reservas orçamentais, para fazer face a
riscos de contingência e [para] reduzir a vulnerabilidade do País face a mudanças
nos sentimentos do mercado”. Porém, segundo o FMI, “dado o impacto negativo
permanente de algumas das medidas de receitas e despesas decididas em 2024,
serão necessárias medidas de compensação adicionais para atingir as metas e [para]
criar espaço adicional para investimentos que promovam o crescimento em infraestruturas
e capital humano”.
O FMI insiste
que o governo “deveria incluir nestas medidas uma reforma fiscal abrangente que
reduzisse as distorções fiscais e medidas para fazer face às pressões do
envelhecimento e para aumentar a eficiência da despesa”. “Uma composição
orçamental mais favorável ao investimento público resultaria também numa
redução mais rápida da dívida, impulsionando o crescimento”, vinca o FMI.
A missão para
Portugal considera genericamente que “as medidas fiscais devem ser concebidas
no âmbito de uma reforma fiscal abrangente que vise simplificar o sistema e
reduzir significativamente o número de isenções [benefícios fiscais]”.
No caso do
IRS, o FMI, preocupado com o impacto na receita que as medidas tomadas e a
serem tomadas pelo governo e o pelo poder político (Parlamento) possa ter na estabilidade
das contas públicas, adverte que “a receita do IRS e a sua taxa média estão
abaixo da média da Zona Euro”; e, “considerando o investimento e as
necessidades de redução da dívida”, sustenta que “estas receitas de IRS não
deverão diminuir ainda mais”.
“Embora os
ajustamentos na progressividade possam alcançar os objetivos de redistribuição,
uma maior utilização de despesas sociais sujeitas a condições de recursos
poderia ser considerada para reduzir a desigualdade, uma vez que a sua
contribuição para a redistribuição fiscal em Portugal é inferior à dos pares da
Zona Euro”, consideram os avaliadores, que alertam para o facto de as “taxas de
imposto preferenciais baseadas na idade” serem dispendiosas e levantarem questões
de limiar e de equidade, bem como de a sua eficácia na redução da emigração ser
incerta.
Efetivamente,
jovens que tenham um emprego superior a 1500 euros agarram-se a ele com unhas e
dentes e podem suportar a taxa normal de IRS; dificilmente as empresas do setor
privado, exceto a banca e similares, contratarão jovens por salários muito
altos; e havendo, num serviço público ou num escritório privado um jovem de 34
anos com taxa reduzida em IRS e um trabalhador de 36 anos que aufira um salario
bruto igual, este sentir-se-á desmotivado ao ter no fim do mês um salário
líquido muito baixo do que o jovem de 34 anos. Aqui está um povo de falta de
equidade.
Por outro
lado, segundo o FMI, “a reintrodução de taxas fiscais preferenciais para
profissionais estrangeiros poderá atrair mais trabalhadores qualificados, mas
irá distorcer ainda mais o sistema fiscal e poderá agravar os problemas de
acessibilidade à habitação”.
O FMI refere
que, “embora as receitas do IRC se situem, geralmente, em linha com a média da
Zona Euro, a taxa legal de imposto combinada é mais elevada do que nos pares da
Área do Euro”. Por isso, está contra o corte de taxas direto da taxa até 15% em
2027, como quer o governo: “Em vez de reduzir a taxa base, deveria ser dada
prioridade à redução das sobretaxas progressivas e locais, o que ajudaria a
alinhar a taxa média de IRC com a média da Zona Euro, incentivando ao mesmo tempo
o crescimento empresarial”.
***
Todavia, nem só de impostos e de salários fala o
FMI. Também faz previsões sobre o crescimento e sobre matérias a ele atinentes.
Assim, o FMI revê em baixa crescimento do PIB
português para 1,9%, em 2024. Ou seja, segundo os avaliadores, o crescimento do PIB português, em 2024, diminuiu em
0,1%; e os maiores entraves ao crescimento são o envelhecimento da população e a
fraca produtividade o fraco investimento.
Não
obstante, o FMI mantém-se confiante de que Portugal vai registar um excedente,
de 0,2% do PIB, enquanto a dívida pública deverá recuar para 94,4% do PIB.
Assim, o FMI
reviu em baixa as previsões para o crescimento da economia portuguesa este
ano, de 2% para 1,9%, de acordo com o
relatório final ao abrigo do Artigo IV.
Em julho,
nas conclusões preliminares da visita a Portugal no âmbito do Artigo IV, o FMI
previa um crescimento de 2%, que reviu, agora, para 1,9%, número que fica
abaixo do estimado pelo governo (2%), segundo foi transmitido aos partidos nas
reuniões sobre o Orçamento do Estado para 2024.
Para o FMI,
“Portugal recuperou fortemente dos sucessivos choques que atingiram a economia
global desde a pandemia”, como se lê na nota divulgada, a 2 de outubro, sobre a
conclusão da consulta ao abrigo do Artigo IV, sendo que o “crescimento em 2023 continuou a exceder
a média da área do euro, impulsionado pelo forte consumo privado, [pelas] exportações
líquidas e [pelo] investimento apoiado por fundos da União Europeia
(UE)”.
A
instituição liderada
por Kristalina Georgieva prevê que o
crescimento permanecerá robusto, no curto prazo, e que “a inflação deve desacelerar
ainda mais”, mas avisa que “o
baixo crescimento da produtividade, o envelhecimento da população e o
investimento moderado continuam a ser restrições a um maior
crescimento e melhores padrões de vida no médio prazo”.
Quanto aos
preços, o FMI prevê que a inflação, medida pelo índice harmonizado de preços no
consumidor (IHPC), que permite comparações internacionais, será de 2,5% este
ano.
Já para o
saldo orçamental, o FMI mantém que Portugal registará um excedente, de 0,2% do
PIB, enquanto a dívida pública deverá recuar para 94,4% do PIB, como já foi
referido.
Na avaliação
do Conselho Executivo do FMI, é ainda de destacar o alerta de que “Portugal
ainda enfrenta problemas estruturais de longa data de pressões demográficas,
investimento insuficiente e produtividade reduzida que restringem o crescimento
potencial”, pelo que os avaliadores “encorajaram as autoridades a manter uma
política orçamental prudente, seguir de perto os riscos no setor financeiro e
promover maior produtividade e transição verde, inclusivamente através da
alavancagem contínua de fundos da UE”.
***
Entretanto,
o governo faz orelhas moucas, em relação às advertências do FMI no atinente ao
IRS jovem e à redução do IRC.
O plano do governo para reduzir a fundo o IRS aplicado aos
jovens com idade até aos 35 anos e para cortar, de forma faseada, até 2028, a
taxa nominal do IRC a todas as empresas é para seguir em frente, apesar a
missão de avaliação do FMI a Portugal ter avisado que ambas as medidas estão
mal desenhadas, havendo mesmo grandes dúvidas sobre a sua eficácia.
No caso do IRS Jovem, o modelo defendido pelo governo
prejudica a equidade entre jovens e é ineficaz na atração de mais trabalhadores
qualificados, além de poder agravar os problemas de acesso à habitação; e, no
caso do corte transversal da taxa de base do IRC, a prioridade devia ser simplificar
o regime, aliviando esta carga fiscal por via da redução das sobretaxas hoje em
vigor, como as derramas, por exemplo.
Na conferência de imprensa da reunião do Conselho de
Ministros, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, disse que “a conclusão
geral” da missão avaliadora do FMI confirma que “o governo está numa trajetória
de equilíbrio orçamental, e equilíbrio virtuoso”, até porque sinalizou que os
excedentes orçamentais previstos, ainda que pequenos, “são adequados”.
Quanto à descida faseada do IRC e ao IRS jovem, disse que são
prioridades orçamentais do governo, que se mantêm, até porque estão suportadas
em acordo com os parceiros sociais. E o governo respeita a palavra dada. Caramba! Dá para gostar deste governo, não?!
***
Ora, o FMI não é uma organização socialista, muito menos de
extrema-esquerda. Contudo, parece vir no encalço do Partido Socialista (PS) nas
questões do IRS jovem e no IRC. Não sei se o PS manterá as suas linhas
vermelhas viabilizar o OE 2025. A ver vamos.
Parece que o governo da direita, dita moderada, agora não
segue dos ditames do antigo credor. Longe estão, graças a Deus, os tempos da troika (de que o FMI fazia parte) em que
o governo da República ia além da troika. Já parece Pedro Nuno Santos, quando
era jovem. Se o governo for assim até 2028, contra tudo e contra todos, estará
de parabéns; e nós teremos ordem, paz, progresso e riqueza!
Quem não quer a redução de impostos e de contribuições, a par
do aumento substancial de salários, de pensões e de subsídios, dos benefícios
sociais (educação, saúde cultura e transportes, tudo gratuito)? Porém, milagres os homens não os fazem!
2024.10.03
– Louro de Carvalho
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