Decorreu, em 12 e 13, no Santuário de Fátima, sob a presidência de Dom
Manuel Pelino Domingues, Bispo emérito de Santarém, a Peregrinação
Internacional Aniversária de setembro, que evoca a 5.ª aparição de Nossa
Senhora em 1917, a 4.ª que no contexto da pandemia se realizou com a participação
física de peregrinos, a 2.ª que contou com grupos
estrangeiros inscritos, a 1.ª que
integrou no programa oficial a peregrinação da comunidade surda e a 1.ª em que,
depois de iniciada a celebração eucarística, o Recinto de Oração foi encerrado
a mais público por motivos de segurança sanitária.
Nesta aparição,
de novo na Cova da Iria, a 13 de setembro de 1917 (a de agosto
fora a 19 e nos Valinhos), além de
reforçar o pedido de oração do Terço, a Senhora anunciou que em outubro viriam
Nosso Senhor, Nossa Senhora das Dores e do Carmo e São José com o Menino Jesus,
para abençoarem o Mundo.
O programa
desta Peregrinação manteve-se idêntico ao das anteriores: começou às 21,30
horas do dia 12, com a recitação do Rosário na Capelinha das Aparições;
seguiu-se a Procissão das Velas; e, depois, a Celebração da Palavra no Altar do
Recinto de Oração. No domingo, dia 13, às 9 horas, recitou-se o Rosário
Internacional, celebrou-se a Missa com a Bênção do Santíssimo e fez-se a
Procissão do Adeus.
De referir
que, no ano passado, no mês de setembro, fizeram-se anunciar no Santuário de
Fátima 570 grupos, 407 dos quais estrangeiros. Este ano participaram 18 grupos inscritos,
sendo 8 estrangeiros (4 de Espanha, 2 de Itália, um de França e um da
Polónia) e 10 de Portugal, um dos quais é a
Comunidade Surda, a cumprir a sua VI Peregrinação Nacional ao
Santuário de Fátima.
Pela
primeira vez, os peregrinos surdos participaram integrados no programa oficial
da peregrinação aniversária. Na oração do Rosário, que decorreu na Capelinha
das Aparições, um dos mistérios do terço, o terceiro, foi recitado em Língua
Gestual Portuguesa (LGP).
***
Na homilia da Celebração da Palavra da noite de sábado, o presidente da Peregrinação
afirmou que a pandemia veio “pôr a nu a nossa fragilidade e as falsas
seguranças em que assentamos as nossas vidas” e só será vencida se o homem ultrapassar o individualismo e a
indiferença, pelo que o mundo precisa
de “uma cura espiritual”, que postula a conversão “da indiferença à
solidariedade, da autossuficiência à humildade e ao serviço fraterno”.
Na verdade, como
verificou o prelado emérito de Santarém, “julgávamo-nos donos do mundo,
autossuficientes, capazes de tudo e, afinal, a pandemia veio pôr a nu a nossa
fragilidade e as falsas seguranças em que assentamos as nossas vidas”, mas, nos
“muitos momentos de escuridão, de sofrimento, de desânimo, de medo”, Nossa
Senhora nunca nos abandona.
Dom Manuel
Pelino, lembrando a oração do Papa a invocar a ajuda divina para “vencer o
terrível flagelo do coronavírus”, perante o Cristo de São Marcelo e o ícone
mariano conhecido por ‘Salus Populi
Romani’, isto é, “ícone de Nossa Senhora da Saúde, ou da Salvação, ou seja,
da saúde global, do corpo e da alma”, vincou:
“É a salvação que Jesus comunicou no seu
tempo e nos concede hoje, por intercessão de sua Mãe santíssima, a salvação da
pessoa na sua vida, no seu mundo e com o seu mundo e na eternidade”.
Para o
presidente da celebração, está em causa a “saúde global para a humanidade
ferida” e uma “cura espiritual, a mudança de atitude perante a vida, perante a
natureza e perante os outros”. Por isso, instou os presentes a aprenderem com a
Virgem Maria “a seguir a voz do Espírito no silêncio, na atenção aos sinais dos
tempos e na meditação da Palavra de Deus”. Com efeito, “recorremos ao amparo da
nossa Mãe do Céu para que Ela nos envolva com o seu manto de luz”, visto que “Ela
é para nós a aurora que anuncia a luz do Sol Nascente, que vem iluminar os que
vivem nas trevas”. E, porque, “na Mãe de Deus, encontramos sempre uma fonte de
salvação, uma nascente de graça para a saúde do corpo e da alma”, é forçoso que
“aprendamos com Ela a escutar e a seguir a voz do Espírito no silêncio, na
atenção aos sinais dos tempos e na meditação da Palavra de Deus que ressoa nas
Sagradas Escrituras” – disse o Bispo.
***
Já na homilia da Missa do dia 13, o presidente da Peregrinação deixou o apelo
insistente à reconciliação com vista à fraternidade e, perspetivando a vocação
cristã à santidade, exortou os peregrinos a alicerçarem “a convivência fraterna
nas comunidades” pelo perdão.
A
reconciliação foi, pois, o tema central da reflexão que o Bispo emérito de Santarém
apresentou aos peregrinos naquela homilia. A partir da Palavra proclamada neste
XXIV domingo do Tempo Comum no Ano A, que apresenta o perdão constante como
atitude essencial do cristão, o prelado emérito começou por assumir a
dificuldade deste gesto e as cisões que a sua falta pode criar no seio das
comunidades. E fez uma proclamação que Dom Sebastião Soares de Resende, que foi
Bispo da Beira (Moçambique), queria ver
explicitada nos documentos do Concílio Vaticano II e que prenuncia a doutrina
da fraternidade humana da futura encíclica que o Papa Francisco vai assinar em
Assis a 3 de outubro:
“Toda a pessoa é minha irmã ou meu irmão:
o cônjuge, os familiares, os amigos, os mais frágeis e desvalidos. (…) Para
formar comunidade precisam de se perdoar mutuamente e constantemente. (…) O
perdão tem de estar sempre presente porque as ofensas, as palavras e atitudes
que magoam, as vaidades e invejas que dividem, o azedume das más disposições
estão enraizados no coração humano e residem permanentemente na comunidade,
como residem na família, nos grupos e na sociedade em geral.”.
Ao
apresentar as crianças como exemplo de simplicidade e humildade na via da
reconciliação, Dom Manuel Pelino perspetivou o acolhimento, a reintegração e a
“pedagogia da correção fraterna” como ações fundamentais para o perdão. E, evocando
o apelo à oração e penitência pela concórdia e pela paz que Nossa Senhora
deixou aos Pastorinhos, em Fátima, concluiu:
“Somos, verdadeiramente, um povo de
pecadores, mas não esquecemos a nossa vocação à santidade. (…) O perdão
alicerça a convivência fraterna na comunidade e aproxima-nos de Deus,
levando-nos a amar como Ele nos ama. Orienta-nos, assim, para uma existência
reconciliada e faz resplandecer mais claramente, na nossa vida e na da Igreja,
a misericórdia e a graça de Deus.”.
***
Por sua vez,
o concelebrante Bispo de Leiria-Fátima, cardeal Dom António Marto, vincou, em mensagem
no final da celebração, o apelo à prática de “fraternidade, reconciliação e a
paz” deixado pelo bispo emérito de Santarém, advertindo:
“Um mundo onde não há o perdão é um mundo
perdido… Uma família onde não se cultiva o perdão é uma família perdida… Uma
comunidade cristã onde não há perdão é uma sociedade perdida.”.
Deixou uma
mensagem particular aos mais novos para que, neste regresso às aulas, cumpram
as regras de segurança que lhes forem indicadas, no âmbito da pandemia do novo
coronavírus, aludiu às vítimas da covid-19, dirigiu uma palavra de conforto aos
idosos e aos que vivem sós e, mencionando o povo martirizado do Líbano e os
refugiados do campo de refugiados de Moria, na ilha grega de Lesbos, onde um
incêndio agudizou as condições de vida, pediu à assembleia uma oração em silêncio
por estes dois sofredores coletivos
***
Esta foi a
grande peregrinação deste ano mais participada por peregrinos na Cova da Iria.
Pela primeira vez, o Santuário de Fátima viu-se obrigado a encerrar as
entradas, a meio da celebração, pondo em prática o plano criado no âmbito da
pandemia da covid-19, que prevê uma ocupação segura para o Recinto de Oração.
Durante a celebração, foram deixados apelos constantes ao cumprimento das
regras de distanciamento social, chamadas de atenção que foram bem recebidas
pela multidão, que se dispersou pelo extenso Recinto de Oração. Porém, assim que sentiram que havia
risco de segurança, os responsáveis pela segurança do Recinto procederam ao seu
encerramento, garantindo que, tal como testemunham as imagens aéreas, se
cumpriram as regras de distanciamento físico.
Por seu
turno, os peregrinos surdos que estiveram em Fátima na noite do dia 12, no âmbito
da sua Peregrinação Nacional, puderam participar de forma plena na recitação do
Rosário (especialmente
o 3.º mistério), às 21,30 horas
e na Procissão das Velas; e a Missa do sai 13 foi monitorada em LGP. Efetivamente,
a VI Peregrinação Nacional da comunidade surda coincidiu pela 1.ª vez com a
Peregrinação Internacional Aniversária de setembro. E o Padre Francisco
Pereira, capelão do Santuário e membro da equipa da Pastoral da Mensagem de
Fátima, referiu:
“Esta peregrinação é uma forma de alargarmos a participação da
comunidade surda. Se é certo que terão um momento particular para eles, hoje
têm esta possibilidade de se integrarem na celebração internacional”.
E desenvolveu
o seu esclarecimento na linha da alegre abertura das portas a todos:
“Ter esta possibilidade é extraordinário. É muito consolador para nós
ver numa assembleia os surdos a participarem ativamente, respondendo e cantando
e, assim, participando plenamente na celebração da fé. (…). Hoje, como em todos
os domingos, já não são um grupo à parte a quem oferecemos um conjunto de
serviços; eles fazem connosco comunidade e isso é muito importante: somos uma
mesma comunidade cristã que se sente acolhida no colo da mãe”.
A
Peregrinação Nacional da Comunidade surda é uma iniciativa da equipa de
intérpretes de LGP que colabora com o santuário de Fátima desde 2013, altura em
que aos domingos começou a ser celebrada uma Missa semanal com interpretação em
LGP – serviço que o Santuário presta semanalmente e com caráter regular aos 35
mil portugueses, surdos gestuantes – esclareceu Joana Sousa, ex-coordenadora da
equipa, que adiantou:
“Temos a Missa em português e temos a Missa interpretada por dois
intérpretes, em que um interpreta o que diz o presidente e o outro a
assembleia. Isto é muito importante porque é a forma de todos conseguirem
acompanhar a celebração.”.
Este ano,
pela coincidência de datas entre a Peregrinação Nacional da Comunidade Surda e
a Peregrinação Internacional Aniversária de setembro, houve também a
interpretação em Língua Gestual Internacional para melhor acolher os peregrinos
surdos internacionais que possam estar no Santuário, interpretação que esteve a
cargo de Amílcar Furtado, peregrino residente em Lisboa, que disse:
“Sinto que a peregrinação é algo que é muito íntimo. Sempre vim a Fátima
com a minha família, mas tinha muita dificuldade em compreender o significado
das coisas. Ter esta possibilidade de aprofundar a minha fé é algo muito importante,
pois a minha acessibilidade é muito maior.”.
Acresce dizer
que o Santuário de Fátima foi a primeira instituição da Igreja em Portugal
a oferecer, com caráter regular e permanente, uma missa semanal para a
comunidade surda portuguesa, aos domingos, às 15 horas, na Basílica da
Santíssima Trindade.
***
Por fim, é
de reter um pequeno recado evangélico de Dom António Marto, na sua mensagem
final: “Um mundo onde não há o perdão é um mundo perdido…”.
Fátima
sempre em boa forma!
2020.09.13 – Louro
de Carvalho
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