O
governo do reconduzido primeiro-ministro francês, Sébastien Lecornu, sobreviveu,
no dia 16 de outubro, às moções de censura da extrema-esquerda e da
extrema-direita.
Inicialmente, foi rejeitada a proposta da França Insubmissa (LFI), por só 271 deputados terem votado a favor, quando eram necessários 289 votos para o governo cair. E a segunda moção, proposta pelo Reagrupamento Nacional (RN), também foi rejeitada, pois obteve 144 votos, um valor abaixo da anterior, já que não contou com o apoio da extrema-esquerda.
Inicialmente, foi rejeitada a proposta da França Insubmissa (LFI), por só 271 deputados terem votado a favor, quando eram necessários 289 votos para o governo cair. E a segunda moção, proposta pelo Reagrupamento Nacional (RN), também foi rejeitada, pois obteve 144 votos, um valor abaixo da anterior, já que não contou com o apoio da extrema-esquerda.
Estes
resultados foram possíveis depois de Lecornu ter conseguido apoio crucial do
Partido Socialista (com 86 deputados), graças à sua proposta de adiar a
polémica reforma das pensões do presidente Emmanuel Macron, até depois das
presidenciais de 2027 – uma sugestão também de um dos laureados com o Prémio Nobel
de Economia, o economista Philippe Aghion.
A
este respeito, o presidente do RN, Jordan Bardella, escreveu, no X: “Uma
maioria formada através de negociações conseguiu, hoje, salvar as suas
posições, à custa do interesse nacional.”
Contudo,
apesar de ter logrado temporária tábua de salvação, esta votação mostrou a
fragilidade do governo de França, que tem pela frente difíceis semanas de
negociações para fazer aprovar o Orçamento do Estado para 2026, durante as
quais poderá ser afastado do cargo por novas moções de censura, caso o Partido
Socialista ou os Republicanos mudem o seu sentido de voto, se não conseguirem o
que pretendem, nas negociações.
Na
verdade, foi deste modo que, em menos de um ano, os primeiros-ministros Michel
Barnier e François Bayrou foram afastados. “Os franceses precisam de saber que
estamos a fazer todo este trabalho, para lhes darmos um orçamento, porque é
fundamental para o futuro do nosso país”, declarou Yael Braun-Pivet, presidente
da Assembleia Nacional (AN) e aliada de Emmanuel Macron, mostrando-se “satisfeita”,
por ver uma maioria na AN que “opera com o espírito de trabalho, [de] procura
de compromisso, [do] melhor esforço possível”.
Era
o resultado antecipado, depois de o novo Executivo de Lecornu ter cedido,
no dia 14, aos socialistas, ao suspender a reforma das pensões, até
janeiro de 2028. Aprovada em 2023, a reforma prevê o aumento da idade da
reforma de 62 para 64 anos, mas a sua suspensão era apontada como condição
inegociável para os socialistas não apresentarem, também eles, uma moção de
censura. Apesar da cedência, houve sete deputados da bancada socialista que
votaram a favor da moção apresentada pela LFI.
Lecornu
deixou a promessa de não recorrer ao artigo 49.3 – um poder constitucional
especial que permite fazer passar uma proposta de lei sem votação, na AN, no
orçamento de 2026.
No
entanto, sobre a suspensão da reforma, o chefe do governo advertiu, “muito
claramente”, que “suspender por suspender não faz sentido” e frisou que não se
trata de fazer “qualquer coisa”, pelo que esta suspensão terá de “ser
compensada”, pois “custará 400 milhões de euros, em 2026, e 1,8 mil milhões, em
2027”.
Como
explicou o primeiro-ministro, “esta suspensão beneficiará, em última instância,
3,5 milhões de franceses”, mas deverá ser compensada, financeiramente,
inclusive através de medidas de redução de despesas”. Isto, para evitar “um
défice maior” e para não “colocar em risco a credibilidade do país e, mais
ainda, de todo o nosso sistema de pensões”.
O
chefe do governo propôs organizar, nas próximas semanas, uma conferência sobre
pensões e sobre trabalho, em acordo com os parceiros sociais, “antes das
eleições presidenciais”. Se a conferência chegar a conclusões, o governo
transporá o acordo para a legislação e o parlamento decidirá. Caso contrário,
caberá aos candidatos presidenciais apresentar propostas.
O
primeiro-ministro assegurou que, “em todos os casos”, o défice público do país
ficará abaixo de 5% do produto interno bruto (PIB), em 2026, “uma vez concluída
a discussão parlamentar” do orçamento, e que, para este ano, o objetivo é um
défice de 5,4% do PIB.
“É
urgente cumprir o calendário de adoção do orçamento e votar o melhor orçamento
possível”, enfatizou Lecornu, sendo relativamente aplaudido, ao fim de 30
minutos, na tribuna.
A
seguir, propôs aos deputados avançar para “cumprir a missão” do executivo que “representa
a renovação”, apesar de ser constituído por figuras do governo anterior de
François Bayrou, como Aurore Bergé, Gérald Darmanin ou Maud Bregeon. Além
disso, defendeu que “não há desculpas” para derrubar, “a priori”, com uma moção
de censura, “um governo que deixará de governar por decreto” e que está a
preparar um orçamento de 2026 “sério e fiável”, para a França.
“Alguns
querem que a situação se transforme numa crise de regime, mas isso não
acontecerá”, assegurou o chefe do governo, enquanto prometeu “partilhar o
poder com os deputados”.
Com
a continuidade de Lecornu enquanto chefe de governo assegurada, para já,
segue-se novo teste ao presidente francês. A presidente do LFI, na Assembleia
Nacional, Mathilde Panot, afirmou que o partido apresentará nova moção de
destituição de Emmanuel Macron. “Lançamos um apelo solene à resistência popular
e parlamentar para que continuem a lutar contra estes orçamentos cruéis”, declarou.
***
Sébastien
Lecornu é o sexto primeiro-ministro do presidente francês, Emmanuel Macron, em
dois anos, e o terceiro (ou o quarto, se se contar a sua binação), num ano.
A 16 de setembro, enquanto trabalhava na elaboração do orçamento e na formação do governo, Sébastien Lecornu anunciava a intenção de acabar com os privilégios de antigos primeiros-ministros e de ministros considerados sensíveis, como os do Interior. “Não podemos pedir aos franceses que façam esforços, se aqueles que estão à frente do Estado não os fizerem. A reforma não é sempre para os outros, pois isso cria desconfiança”, declarou, numa entrevista à imprensa regional. Tal declaração foi reforçada, num tweet, a 15 de setembro.
A 16 de setembro, enquanto trabalhava na elaboração do orçamento e na formação do governo, Sébastien Lecornu anunciava a intenção de acabar com os privilégios de antigos primeiros-ministros e de ministros considerados sensíveis, como os do Interior. “Não podemos pedir aos franceses que façam esforços, se aqueles que estão à frente do Estado não os fizerem. A reforma não é sempre para os outros, pois isso cria desconfiança”, declarou, numa entrevista à imprensa regional. Tal declaração foi reforçada, num tweet, a 15 de setembro.
Segundo
fontes do Ministério do Interior citadas pela France Info, o ministério
defende a revisão, caso a caso, da proteção policial concedida aos antigos
ministros. Até agora, os antigos primeiros-ministros beneficiavam de vários
privilégio, como a proteção policial, conforme os riscos enfrentados, assegurada
pelo SDLP (Service de la protection); um secretário particular, durante 10 anos
e até aos 67 anos; um carro com motorista disponível para toda a vida, a
qualquer momento, financiado pelo Estado; e a indemnização de 15 mil euros brutos,
durante três meses, após deixarem o cargo.
A
proteção policial será limitada a três anos e renovada, em caso de ameaça; o
privilégio do carro com motorista será reduzido para apenas 10 anos; e os outros
privilégios ficam inalterados.
Este
regime não se aplica aos antigos primeiros-ministros que dispõem de tais
recursos, em virtude de mandato parlamentar, de mandato local ou de função
pública. Era o caso, em 2024, de Laurent Fabius, presidente do Conselho
Constitucional, de Edouard Philippe, presidente da Câmara de Havre, e de Jean
Castex, presidente da Régie Autonome des Transports Parisiens (RATP), entre
outros. Em todo o caso, em 2024, o custo anual, para o Estado, dos privilégios dos
antigos primeiros-ministros e ministros foi estimado em cerca de 4,4 milhões de
euros, dos quais quase metade para os custos de proteção policial.
Quanto
aos ministros do Interior, a proteção policial será efetiva durante dois anos e
mantida, em caso de ameaça particular.
De
acordo com a Jornal Oficial da AN, de maio de 2025, Dominique de Villepin custou
ao Estado 207072 euros; Bernard Cazeneuve, 198290 euros; Jean-Pierre
Raffarin, 158208 euros; Lionel Jospin, 157657 euros; Édith Cresson,
157223 euros; e François Fillon, 149089 euros.
No
campo presidencial, a decisão foi saudada. O deputado Laurent Saint-Martin
(Renaissance) elogiou a medida, considerando-a a concretização de promessa há
muito mencionada, mas raramente implementada. Já à esquerda, a secretária-geral
da Confederação Geral do Trabalho (CGT), Sophie Binet, expressou reservas, frisando
que a medida não será suficiente para compensar outras decisões orçamentais
consideradas injustas, no futuro orçamento. Por fim, do lado do RN, o deputado
do Norte, Sébastien Chenu, considera a medida “muito boa”, mas sustenta que
Lecornu está a fazer “publicidade”.
***
Antes
de perfazer uma mês da sua nomeação, Sébastien Lecornu, após ter anunciado o
seu elenco governativo, prevendo que o programa não passaria na AN, apresentou ao
presidente o pedido de demissão do cargo de primeiro-ministro, a 6 de outubro. Emmanuel
Macron, embora tenha aceitado o pedido de demissão, encarregou-o de diligenciar
no sentido de promover a constituição do novo governo, o que ele aceitou, mas garantindo
que não voltaria ao cargo, quaisquer que fossem os resultados.
Contudo, a 10 de outubro, o presidente reconduziu o primeiro-ministro cessante, numa decisão chocante que pôs fim a dias de especulação e a intensas negociações com o objetivo de resolver o impasse político que se agravava no país. O anúncio seguiu-se a consultas finais com representantes dos principais partidos políticos. Com efeito, o chefe de Estado reuniu os líderes partidários no Palácio do Eliseu, no início do dia, com exceção dos da extrema-esquerda (LFI), e da extrema-direita (RN).
Contudo, a 10 de outubro, o presidente reconduziu o primeiro-ministro cessante, numa decisão chocante que pôs fim a dias de especulação e a intensas negociações com o objetivo de resolver o impasse político que se agravava no país. O anúncio seguiu-se a consultas finais com representantes dos principais partidos políticos. Com efeito, o chefe de Estado reuniu os líderes partidários no Palácio do Eliseu, no início do dia, com exceção dos da extrema-esquerda (LFI), e da extrema-direita (RN).
A
reunião, dissera o Eliseu, no início do dia, “deve ser um momento de
responsabilidade coletiva”.
A
nomeação marca um momento crucial na presidência de Macron, que se estende até
2027. Sem maioria na AN e com críticas crescentes, tanto da oposição como
dentro das suas próprias fileiras, o chefe de Estado tem pouca margem de
manobra política. A crise agravara-se no início daquela semana, quando Lecornu
se demitiu abruptamente, poucas horas depois de ter anunciado o seu novo
governo. A sua chocante saída levou a novos apelos de figuras da oposição para
que Emmanuel Macron se demitisse ou convocasse eleições antecipadas.
Porém,
na noite do dia 10, em mensagem divulgada nas redes sociais, Lecornu escreveu
que aceitava, “por dever”, a missão que lhe fora confiada pelo presidente de “tudo
fazer para dar à França um orçamento até ao fim do ano e [para] responder aos
problemas da vida quotidiana dos nossos patriotas”. E vincou: “É preciso pôr um
fim a esta crise política que exaspera os franceses e a esta instabilidade
nociva para a imagem de França e [para] os seus interesses.”
A
turbulência remonta à decisão surpreendente de Emmanuel Macron, em junho de
2024, de dissolver a AN. As eleições antecipadas subsequentes deram origem a um
parlamento à mercê da negociação, não deixando nenhum bloco político com
maioria.
O
primeiro-ministro enfrenta, agora, a difícil tarefa de navegar nessa paisagem
fraturada e de fazer aprovar o plano orçamental altamente controverso de 2026,
o qual é questão urgente para a França e cujo que o prazo de apresentação
terminava a 13 de outubro.
Reconduzido
pelo presidente, depois de uma semana de caos político, Sébastien Lecornu
apelou à calma e ao apoio dos partidos políticos, para que seja elaborado um
orçamento para a segunda maior economia da União Europeia (UE), antes do fim do
prazo.
O
recém-reconduzido primeiro-ministro disse, no dia 11, durante uma visita a uma
esquadra de polícia, no subúrbio parisiense de L’ Hay-les-Roses, que não havia “muitos
candidatos” para o seu cargo e apelou a um governo livre de políticas
partidárias. “Não creio que houvesse muitos candidatos. […] Cumprirei o meu
dever e não serei um problema”, declarou, avisando que o seu gabinete “não deve
ser refém de interesses partidários”.
Por
outro lado, admitiu que poderia não durar muito no cargo, dadas as profundas
divisões políticas do país. Todavia, a nomeação de Sébastien Lecornu, de 39
anos, é vista como a última oportunidade de Emmanuel Macron para revigorar o
seu segundo mandato, que vai até 2027. O campo centrista carece de maioria, na
AN, e o presidente enfrenta críticas crescentes, mesmo dentro das suas
fileiras.
Entretanto,
os rivais da extrema-direita e da extrema-esquerda criticaram a decisão de
Macron de renomear Lecornu, o quarto primeiro-ministro, em apenas um ano. O
líder do RN, Jordan Bardella, classificou tal recondução como “piada de
mau gosto” e prometeu que tentaria, imediatamente, remover o novo gabinete, o que
não conseguiu. Os Republicanos (centro-direita) decidiram, no dia 11, não
participar no novo governo de Sébastien Lecornu, comprometendo-se, durante uma
reunião do gabinete político, órgão que reúne as principais figuras do partido apenas
a dar “apoio texto a texto” ao executivo.
“O
gabinete político afirma o seu apoio ao governo, texto a texto”, acentuando que,
“nesta fase, não estão reunidas a confiança e as condições, para que Les
Républicains participem no governo”, declarou o partido, em comunicado.
O
Partido Socialista, que pode fazer de fiel da balança no parlamento, disse não
haver acordo com Lecornu e ameaçou derrubar o governo, se este não concordasse
em suspender a reforma das pensões de 2023, que aumenta a idade da reforma de
62 para 64 anos, tendo conseguido tal suspensão – razão por que votou contra as
duas censuras apresentadas na AN.
***
A
crise política surge num tempo em que a França se debate com desafios
económicos e com uma dívida crescentes. A crise política está a agravar os
problemas e a fazer soar o alarme em toda a UE, cujos líderes, dizem, hipocritamente,
que ainda não é alarmante.
Lecornu, que se demitiu, após apenas cerca de um mês no cargo, concordou em regressar, devido à “necessidade urgente de encontrar soluções financeiras para a França”, mas garantiu que só ficaria, enquanto as condições estivessem reunidas, e pareceu reconhecer o risco de ser derrubado numa moção de censura pelo parlamento fraturado. “Ou as forças políticas me ajudam e nos acompanhamos mutuamente... ou não”, afirmou.
Lecornu, que se demitiu, após apenas cerca de um mês no cargo, concordou em regressar, devido à “necessidade urgente de encontrar soluções financeiras para a França”, mas garantiu que só ficaria, enquanto as condições estivessem reunidas, e pareceu reconhecer o risco de ser derrubado numa moção de censura pelo parlamento fraturado. “Ou as forças políticas me ajudam e nos acompanhamos mutuamente... ou não”, afirmou.
Não
dizia quando esperava formar novo governo nem quem o integraria, mas dizia que
não incluiria ninguém que esteja a concorrer às eleições presidenciais de 2027.
Não abordava as exigências da oposição da eliminação a lei que aumenta a idade
da reforma.
Os
governos minoritários de Emmanuel Macron caíram, uns atrás dos outros, ao longo
do último ano, pondo França em estado de paralisia política e a lidar com taxa
de pobreza crescente, com défice excessivo e com uma dívida que alarmou os
mercados e os aliados da UE.
Por
fim, nem os partidos garantem, a necessidade longevidade do governo até 2028,
nem o primeiro-ministro, que avança, recua e avança, admitindo que pode cair a
qualquer momento, dá garantias de estabilidade ao país que, juntamente com a
Alemanha, é considerado um dos motores do projeto europeu. E a suspensão da lei
que aumenta a idade da reforma não resolve o problema de fundo, apenas garante
o cumprimento do mandato de Emmanuel Macron.
Assim
vai a França!
2025.10.19 – Louro de Carvalho
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