O setor automóvel está em forte
resistência às metas de redução de emissões de dióxido de carbono (CO2)
impostas pela União Europeia (UE), tentando o adiamento dos prazos. E os
eurodeputados dividem-se sobre o tema, enquanto a presidente da Comissão,
Ursula von der Leyen, prepara novo diálogo com os fabricantes de automóveis, a
12 de setembro.
A Euronews publicou, a 9 de setembro, um artigo de Vincenzo Genovese intitulado “Parlamento Europeu dividido sobre pedidos de metas de CO2 para o setor automóvel”, que nos dá conta do problema, mercê da preponderância da China, no fabrico e na exportação de veículos elétricos, agravado pela crise desencadeada pelos Estados Unidos da América (EUA), em torno das tarifas, em que fica evidenciada a fragilidade da indústria automóvel da Europa.
A Euronews publicou, a 9 de setembro, um artigo de Vincenzo Genovese intitulado “Parlamento Europeu dividido sobre pedidos de metas de CO2 para o setor automóvel”, que nos dá conta do problema, mercê da preponderância da China, no fabrico e na exportação de veículos elétricos, agravado pela crise desencadeada pelos Estados Unidos da América (EUA), em torno das tarifas, em que fica evidenciada a fragilidade da indústria automóvel da Europa.
No final de agosto, uma carta
conjunta da Associação dos Construtores Europeus de Automóveis (ACEA) e da
Associação Europeia de Fornecedores da Indústria Automóvel (CLEPA) alertou que são
“simplesmente inviáveis” as metas de CO2, para carros e carrinhas fixada em 2030 e em 2035,
respetivamente.
Representando o transporte 25% do
total das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) na UE, a Comissão Europeia
visa a redução de 90%, até 2050, para alcançar a neutralidade climática, que é
a base do Acordo Verde, o grande plano da UE. Ora, como sustenta Vincenzo Genovese, isso “traduz-se em regras rigorosas para os novos
carros colocados no mercado da UE”, sendo que “um regulamento aprovado em 2019
estabeleceu limites de emissões progressivos que cada fabricante deve cumprir
para a sua frota inteira, ou seja, [para] todos os veículos vendidos nos países
do bloco comunitário”. Assim, os fabricantes são incentivados a produzir
modelos menos poluentes. E, embora sejam permitidos “ajustes”, com base no
número de carros de zero emissões vendidos, os fabricantes que excedam as
regras de CO2 devem pagar multas, por cada grama extra de emissões
de carbono.
A Comissão Europeia concedeu mais
tempo aos fabricantes para cumprirem as metas de redução de emissões de CO2
estabelecidas para 2025, mas manteve o objetivo para 2035, quando apenas
modelos de zero emissões devem ser vendidos no mercado da UE. Porém, o setor
está a pressionar o Parlamento Europeu (PE) e o executivo, no sentido de obter
mais concessões para veículos híbridos e para veículos com motores de combustão
interna altamente eficientes, que ainda produzem uma certa quantidade de
emissões de CO2.
***
A 5 de
março deste ano, a Comissão Europeia comprometeu-se a apoiar o fabrico de
baterias para veículos elétricos, uma das cinco iniciativas emblemáticas, e deu
mais flexibilidade para o cumprimento dos objetivos deste ano, no atinente às
emissões de CO2. Nestes termos, anunciou um plano de ação para apoiar o acesso da indústria automóvel
europeia a tecnologias estratégicas fundamentais, incluindo baterias, software e condução autónoma, bem como
para reduzir os encargos regulamentares.
O plano, apresentado pelo Comissário para os Transportes Sustentáveis e o Turismo, Apostolos Tzitzikostas, enumera cinco iniciativas emblemáticas para apoiar a indústria automóvel em dificuldades, a qual representa 7% do produto interno bruto (PIB) da UE e emprega cerca de 14 milhões de pessoas em todo o bloco. Porém, o setor debate-se com riscos na cadeia de abastecimento, como elevados custos energéticos e com excessiva dependência de fornecimentos essenciais. A obviar a este último problema, a Comissão anunciou um fundo de 1,8 mil milhões de euros, para criar uma cadeia de abastecimento segura e competitiva para as matérias-primas das baterias, pois garantir um abastecimento seguro de baterias e das suas matérias-primas é um dos principais problemas que a indústria enfrenta, na transição para veículos com emissões zero.
O plano, apresentado pelo Comissário para os Transportes Sustentáveis e o Turismo, Apostolos Tzitzikostas, enumera cinco iniciativas emblemáticas para apoiar a indústria automóvel em dificuldades, a qual representa 7% do produto interno bruto (PIB) da UE e emprega cerca de 14 milhões de pessoas em todo o bloco. Porém, o setor debate-se com riscos na cadeia de abastecimento, como elevados custos energéticos e com excessiva dependência de fornecimentos essenciais. A obviar a este último problema, a Comissão anunciou um fundo de 1,8 mil milhões de euros, para criar uma cadeia de abastecimento segura e competitiva para as matérias-primas das baterias, pois garantir um abastecimento seguro de baterias e das suas matérias-primas é um dos principais problemas que a indústria enfrenta, na transição para veículos com emissões zero.
Por isso, a presidente da Comissão
Europeia prometeu: “Vamos promover a produção nacional para evitar dependências
estratégicas, especialmente, no que respeita à produção de baterias.”
Além disso, a Comissão Europeia
vincou a necessidade de os fabricantes de automóveis europeus se tornarem
líderes de mercado no fabrico de veículos alimentados por inteligência artificial
(IA), conectados e automatizados. Para o efeito, foi anunciado um financiamento
de mil milhões de euros, para o período de 2025-2027. E, adicionalmente, foi
destinado um montante de 570 milhões de euros para financiar a criação de
pontos de carregamento.
O plano de ação prevê mais apoio à
melhoria das competências e à requalificação dos trabalhadores do setor, assim como
promete mais apoio às pequenas e médias empresas (PME).
***
As metas de emissões de CO2
dividem o PE entre grupos de direita e de esquerda, num debate crucial que
envolve o futuro de mais de 13 milhões de trabalhadores do setor automóvel.
“Concordamos com a indústria automóvel, porque esta meta é cada vez mais inalcançável a médio e longo prazo”, disse o eurodeputado italiano Salvatore De Meo, do Partido Popular Europeu (PPE), frisando que, “desde o primeiro momento, o PPE tem pressionado para que os objetivos de sustentabilidade respeitem também os aspetos sociais e económicos”.
“Concordamos com a indústria automóvel, porque esta meta é cada vez mais inalcançável a médio e longo prazo”, disse o eurodeputado italiano Salvatore De Meo, do Partido Popular Europeu (PPE), frisando que, “desde o primeiro momento, o PPE tem pressionado para que os objetivos de sustentabilidade respeitem também os aspetos sociais e económicos”.
De Meo classifica de “ideológica” a
política de emissões da UE e pede mais “pragmatismo” nas escolhas da Comissão.
“Acredito que [mudar as metas] significa dar a possibilidade às empresas que
talvez tenham mais dificuldades na adaptação de o fazerem num prazo diferente”,
afirmou.
O seu grupo político, o maior no PPE,
apresentou um plano de cinco pontos para aumentar a competitividade
no setor automóvel, em dezembro de 2024, pedindo, entre outras coisas, um
quadro regulamentar simplificado.
Esta posição do PPE é partilhada
pelos Conservadores e Reformistas Europeus (ECR) e pelos Patriotas pela Europa
(PfE), que são críticos, em relação a todas as medidas do Acordo Verde.
Estes grupos têm rejeitado a
regulamentação excessiva da UE e o foco da Europa nos carros elétricos. “Não
podemos imaginar um futuro exclusivamente elétrico para a indústria automóvel.
Devemos considerar soluções alternativas, como os biocombustíveis”, disse De
Meo, desafiando o regulamento da UE que proibirá, a partir de 2035a venda de
qualquer veículo que produza emissões de CO2, incluindo
biocombustíveis.
E, sobre o Diálogo Estratégico, diz
esperar que “as instituições reconheçam a preocupação levantada pelo setor
automóvel”, enquanto se aguarda pelas conclusões das reuniões regulares, desta estrutura
com representantes dos fabricantes automóveis, dos fornecedores, dos parceiros
sociais e de outras partes interessadas, para desenvolver propostas detalhadas,
a fim de garantir a “competitividade, sustentabilidade e resiliência a longo
prazo” da indústria automóvel europeia.
Do outro lado do hemiciclo,
Socialistas e Democratas (S&D), Verdes/Aliança Livre Europeia e A Esquerda
rejeitam os apelos dos fabricantes para alterar as metas. “Discordo
completamente”, disse a eurodeputada belga Sara Matthieu, aduzindo que fazer
isso significaria “recompensar os retardatários e punir aqueles que realmente
investiram no futuro”, além de ser “um sinal muito negativo” para todo o Acordo
Verde.
Os defensores do pacto vincam a
importância de manter limites estritos nas emissões dos carros, em conformidade
com a trajetória global de descarbonização. Para a belga Sara Matthieu, isto é
crucial, também à luz dos dados alarmantes sobre o aquecimento
global: 2024 foi o primeiro ano em que a temperatura média excedeu os níveis
pré-industriais em mais de 1,5 graus Celsius (1,5º), o limite estabelecido no
Acordo de Paris sobre o clima.
Estes grupos de eurodeputados
reconhecem os desafios colocados à indústria automóvel, mas indicam soluções
diferentes para salvar o setor, sem enfraquecerem as metas climáticas. Com
efeito, mudar as metas não salva a indústria automóvel; antes, para ela se
manter viva, é preciso investir nelas. “A descarbonização das frotas
corporativas, por exemplo, está a ajudar a criar a procura necessária e também
um mercado de segunda mão”, enfatiza Sara Matthieu, pedindo mais investimento
em infraestruturas de carregamento para carros elétricos, para garantir que
estão disponíveis em toda a Europa e que são fáceis e acessíveis para o
consumidor.
Transferir a cadeia de produção de
baterias para a Europa e monitorizar os investimentos estrangeiros (chineses)
nos países da UE ajudaria a “proteger os nossos mercados da inundação de carros
chineses”, segundo a eurodeputada belga, que anota o facto de certas marcas
europeias terem sido mais orientadas para o futuro e inovado e (a escolha certa).
Efetivamente, adiar o prazo para o fim das vendas de carros com motor de
combustão, entregaria, de bandeja, o mercado europeu aos chineses, o que nenhum
eurodeputado deseja.
***
A crise que afeta a
indústria automóvel europeia constitui uma ameaça grave para o futuro económico
da Europa. E Stéphane Séjourné, responsável pela indústria na UE, há alguns meses, clamou que ela
está “em perigo de vida”. De facto, as vendas fracas, os elevados preços
da energia, a crescente concorrência global e um ambiente regulamentar e
comercial incerto mergulharam o setor numa crise em espiral, existindo “o risco
de o futuro mapa da indústria automóvel mundial ser desenhado sem a Europa”. E
a questão que se levanta é se a cimeira entre o setor automóvel e Ursula
von der Leyen, a 12 de setembro, será uma tábua de salvação, frente aos desafios mais prementes do setor.
Trata-se da terceira e
última reunião de crise do género este ano, no âmbito do que a Comissão
designou por “Diálogo Estratégico
sobre o Futuro da Indústria Automóvel”.
Na primavera, a UE lançou um Plano
de Ação Industrial que inclui fundos para os produtores de baterias,
nomeadamente, através do programa Battery Booster, no valor de 1,8 mil milhões
de euros, e de mil milhões de euros adicionais destinados à investigação e ao desenvolvimento
de baterias, no âmbito do programa Horizonte Europa. Contudo, estas iniciativas
não alteraram as perspetivas gerais sombrias, pois, na ótica Sigrid de Vries,
diretora-geral da ACEA, “o sentido de urgência não desapareceu” e “precisamos
de mais ação”.
Os fabricantes estão frustrados com
a falta de um plano político pragmático para a transformação da indústria, como
ficou expresso na carta aberta presidentes da ACEA e da CLEPA, Ola Källenius e
Matthias Zinkl, respetivamente, segundo os quais o plano de transformação da
Europa “deve ir além do idealismo e reconhecer as atuais realidades industriais
e geopolíticas”.
Para os representantes desta
indústria, são necessários custos de energia mais baixos para o carregamento,
mais subsídios à compra e reduções fiscais e distribuição mais equilibrada das
infraestruturas de carregamento para tornar a mudança para veículos elétricos
uma escolha óbvia para uma massa crítica de consumidores e empresas europeias.
Atualmente, a quota de mercado dos
veículos elétricos a bateria na Europa estagna em cerca de 15%, o que não é
suficiente para o avanço de uma tecnologia decisiva para o futuro. Muitos
consumidores hesitam em comprar um veículo elétrico por não haver estações de
carregamento suficientes na Europa, 75% das quais estão localizadas em apenas
três países: os Países Baixos, a França e a Alemanha.
Na UE, estão atualmente disponíveis
apenas cerca de 880 mil pontos de carregamento públicos. De acordo com as
estimativas da ACEA, até 2030, serão necessários 8,8 milhões de pontos de
carregamento, ou seja, dez vezes mais. Para tal, teriam de ser instalados 1,5
milhões de pontos de carregamento, por ano, quase dez vezes mais do que a taxa
de crescimento atual. E, prevendo mais problemas económicos e jurídicos, no
horizonte, a indústria automóvel quer uma revisão dos atuais regulamentos sobre
CO2.
Os presidentes da ACEA e da CLEPA
sustentam que atingir os objetivos rígidos de CO2 dos automóveis e
das carrinhas para 2030 e 2035 já não é viável. Portanto, em vez disso, exigem
flexibilidade e pragmatismo, em relação às tecnologias de transmissão (ou seja,
pedem que seja revista a intenção de proibir os motores de combustão), como corda
de salvamento crucial para a indústria em apuros, pois, segundo Sigrid de Vries
“não se pode forçar as pessoas a optarem por um determinado tipo de automóvel”.
Durante anos, a eletrificação foi a
principal estratégia utilizada, a nível mundial, para produzir veículos com
emissões zero, respondendo à exigência dos decisores políticos. Estes veículos
estão a ser cada vez mais conectados e capazes de trocar informações com outros
automóveis e com as infraestruturas rodoviárias, tendendo a tornar-se “computadores
sobre rodas”, de alto desempenho, dependentes de chips e de software.
Consequentemente, novas empresas dos setores das baterias e da tecnologia
entraram no mercado automóvel e ultrapassaram os fabricantes de automóveis
tradicionais. E é aqui que a maioria das empresas europeias está atrasada, face
aos seus rivais asiáticos na inovação dos automóveis elétricos.
Neste contexto, devido ao seu quase
controlo da produção mundial de baterias e aos baixos custos da mão de obra, a
China tornou-se o principal centro de fabrico de veículos elétricos, com os seus
automóveis a tornarem-se cada vez mais competitivos. Além disso a China
continua a ser, de longe, o maior mercado mundial.
O crescente domínio chinês,
juntamente com as tarifas de Donald Trump aos automóveis europeus, colocam a
indústria automóvel europeia sob forte pressão, para se adaptar, rapidamente,
ao novo ambiente e para desenvolver a resiliência industrial necessária para
contrariar a China, como salientou o relatório de Mario Draghi. Contudo, outros peritos defendem maior cooperação
com os chineses, visto que têm todas as cartas na mão”, de acordo Ferdinand
Dudenhöffer, economista e diretor do Centro para a Pesquisa Automóvel da Alemanha,
em cuja ótica, “precisamos de apoio político”, não de “ataques à China”.
Está em causa a sobrevivência da
indústria automóvel europeia, a espinha dorsal da economia do continente,
apoiando mais de 13 milhões de empregos diretos e indiretos (mais de 6% do
emprego da UE) e contribuindo com cerca de um bilião de euros para o produto
interno bruto da UE. Na Alemanha, na Suécia e em alguns países da Europa de
Leste, a indústria automóvel representa mais de 10% da mão de obra da indústria
transformadora. E, quando a Alemanha, a maior economia da Europa, perdeu 50 mil
postos de trabalho no setor automóvel, em 2024, as ondas de choque fizeram-se
sentir em toda a parte. O país é o lar de alguns dos mais famosos fabricantes
de automóveis da História, mas a sua sobrevivência não está garantida.
Basta olhar para o Reino Unido, cuja
indústria automóvel foi dominante, mas de que só resta uma marca 100%
britânica, a Morgan, empresa familiar de fabrico de carros desportivos à mão. “Nenhum
dos postos de trabalho perdidos será reposto e nenhuma fábrica encerrada
voltará a existir”, sustenta Ferdinand Dudenhöffer, segundo o qual, se a
indústria automóvel, pelas dificuldades, entrar em declínio, as perspetivas
económicas gerais na Europa serão devastadoras.
***
É, pois, necessário proceder, com sustentabilidade,
à transição energética, mas salvar a indústria automóvel europeia e, mesmo,
apostar na (re)industrialização europeia.
2025.09.09 –
Louro de Carvalho
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